Escuto gritos ao fundo e pulo de minha cama, sem pensar muito vou me direcionando para a origem do barulho tentando identificar de quem era voz que se elevava. Ao passar por uns cômodos vejo minha mãe na porta gritando com alguém do lado de fora, não consigo ver quem era, mas eu já imaginava quem seria, eram os cobradores.
Minha mãe fecha a porta com um baque e se vira para trás tomando um susto com a minha presença ali, ela fica parado um momento me fitando com aqueles profundos olhos negros enquanto seu cabelo preso se soltava naturalmente.
-Filho, eu não imaginava que você fosse estar acordado a esta hora - Ela me disse se virando para a pia da cozinha.
-Eu fiquei sem sono, tive alguns pesadelos - Minto para ela, não queria magoá-la dizendo que fora ela quem me acordou.
-Entendo, em épocas como esta pesadelos são corriqueiros.
-É - Olho para ela manejando a louça em meio ao fluxo de água que cai da torneira, sua mão estava toda machucada devido aos trabalhos que ela fazia o dia todo.
-Você vai ir ao lixão hoje? - Ela pergunta se virando para mim e enxugando suas mãos com um pano - Estamos precisando de algum dinheiro.
-Eu irei sim.
Volto para o meu quarto e dou uma espiada pela janela, o sol ainda não havia chegado ao meio do céu, isso significava que o descarregamento ainda não havia acontecido. Observo os meus irmãos dormindo amontoado no quarto, eu era o filho do meio entre 6 irmãos. Cada um de nós era responsável por algum trabalho que beneficiasse a casa, e eu infelizmente fiquei com o lixão.
Passo em meio aos meus irmãos tentando não chutar nenhum membro, alcanço minhas coisas e pego meu cinto cheio de ferramentas, volto para a cozinha aonde minha mãe estava. Olho ao redor procurando meu saco.
-Procurando isso aqui? - Escuto a voz da minha mãe vido de trás de mim, dou um giro e vejo ela segurando um saco gigantesco quase branco. - Eu dei uma lavada para você, ele estava quase preto, Henry.
-Obrigado. - Pego o saco da mão da minha mãe, dou um beijo em sua bochecha manchada de sujeira e saio pela porta da cozinha.
Ao chegar do lado de fora a luz do sol invadiu o meu olhar deixando me cego por alguns segundos, assim que meus olhos se acostumaram eu pude ver a situação que eu sempre vi desde que eu me entendo por gente. Casas empilhadas uma em cima da outra, pessoas jogadas no chão mais sujo que eu já havia visto em minha vida, mulheres se prostituindo ao meio do dia, vendedores tentando vender qualquer coisa a qualquer custo, pessoas gritando com outras por um simples esbarrão, e se eu continuasse mais um tempo encarando tudo isso certamente iria arrumar confusão com alguém, era assim que era a vida no Dump, o lugar aonde eu vivia.
Meu braço estava doendo por causa do relógio, todo mundo quando chega aos 12 anos de idade ganha um relógio que mostra horas, temperatura, conexão com a internet, GPS, enfim, tudo, basicamente você tem um universo no seu pulso, mas mesmo assim, quatro anos com essa coisa e eu ainda não tinha me acostumado com isso. Eu não reclamo muito disso, eu fui o último dos meus irmãos ao ganhar o relógio, só é permitido que 3 crianças por família da nossa classe tivesse o relógio.
Olhei para o relógio tentando achar algo que pudesse mudar minha vida, mas a única coisa que vi foram os números das horas quase chegando ao meio dia, significando que se eu não corresse eu não conseguiria peças boas para vender. Sai correndo em direção ao lixão.
O lixão era a minha segunda casa, eu passava mais tempo lá do que em minha própria casa, só não era a primeira porque minha família não estava. Não tem muitas maneiras de descrever como o lixão era, ele era um amontoado de coisas que a maioria das pessoas não imaginava para o que servia, elas apenas vendiam tentando achar algum lucro para suas famílias. A medida que adentro o lugar o cheiro de fezes e suor domina meu nariz, mas não era nada que eu não tivesse acostumado.
Sentei-me em cima de algumas peças e fiquei esperando o descarregamento enquanto mexia no meu relógio. A interface do relógio era adaptável a sua mente, ela aparecia diferente para cada pessoa, e cada pessoa apenas podia ver a interface do seu relógio devido ao chip implantado na nuca de cada um. O chip era praticamente a identidade de cada um, sem ele você não era ninguém. O chip também servia para gravar a vida de uma pessoa, mas aqui no Dump era muito marginalizada para usarem isso.
Escuto um silvo enorme no céu e junto a ele uma sombra enorme pairava sobre o lixão, era a nave que trazia o lixo da nobreza, todos os trabalhadores saíram do meio do lixão e ficaram esperando, todos preparados para correr, levantei me e fiquei preparado, até parecia que eu era algum corredor, mas eu era apenas um catador. O compartimento da nave se abre fazendo cair toneladas de materiais quebrados e inutilizáveis, e assim que o descarte acabou todos começaram a correr, inclusive eu.
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Code Zero
Science FictionNo século XXVI. O ser humano já colonizou toda o Sistema Solar. A tecnologia se torna a principal ferramenta da humanidade fazendo com que os princípios humanos como vida, morte, deus e "o que há após a vida?" sejam nada mais do que simples palavras...