Capítulo 14

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Laysla estava comendo e eu olhava para ela fixamente. Ela não me olhava de um jeito diferente agora, e eu estava aliviada pelo fato dela ter acreditado em mim. Eu realmente estava arrependido pelas coisas que eu fiz, e pelas que eu nem lembrava que tinha feito.

Não imagino o que poderia ter feito mais, pórem, já havia confirmado que eu não era um ser muito bom. Outra coisa era o fato de Tommy ser meu assassino. Não lembro de muito a respeito dele, mas quando paro para pensar eu lembro de coisa pouca, como conversas cortadas e brigas curtas.

— Kenneth? — Laysla atraiu meu olhar e sorriu — Você gostava de algo quando era vivo?

Franzi o cenho.

— Algo que te deixava feliz — ele explicou

Pensei, e pensei. Algo que me deixava feliz...

— Tocar violão — disse

— Você tocava? — ela pareceu surpresa

— E cantava também — sorri um pouco — Eu cantava para minha mãe, e ela sorria para mim.

— E sua mãe é viva? — ela perguntou

— Não. Morreu em um assalto, e os caras não foram presos — franzi o cenho.

— Acho que sei porque você é assim. — ela murmurou

— Nada justifica meus erros, Laysla. Ela morreu, mas eu deveria honrar da memória dela, e não me tornar um idiota filho da puta.

— Algumas mágoas nos modificam. — ela olhou para suas mãos

— Já magoaram você? — Perguntei

— Meus pais — ela sorriu, triste — Eles me largaram aqui e pouco vem me ver. Opção própria, sabe?

— Eles não gostam de você?

— Eles queriam um menino — ela suspirou

— Azar o deles — bufei — não sabem a filha que estão perdendo.

— Não sou lá essas coisas.

— Ah, Laysla é claro que é.

Ela olhou para mim e sorriu. Meu coração espiritual deu um salto dentro do peito e eu tentei lembrar que eu estava morto e ela viva.

— E o que fazemos agora? — perguntou ela

— Bom, se foi Tommy que me matou...nós...— franzi o cenho — não faço ideia. O que faremos agora?

— Vovó! — Laysla gritou

A velha surgiu da cozinha como se tivesse acabo de acordar.

— O que eu perdi? — ela perguntou

— Achamos o assassino de Kenneth — ela disse — o que devemos fazer agora?

— Ele precisa confessar, querida — a velha suspirou — precisa despejar a verdade para que Kenneth ouça.

— Mas isso é ridículo — falei — Ele nunca vai confessar.

— Lasyla não é da polícia. Talvez ele fale — a velha sorriu

— Ou eu posso dizer a verdade — olhamos para Lasyla — Posso explicar e ele talvez fale. Kenneth pode tentar mexer em umas coisas para provar que está lá realmente. Que acha?

— Acha que consigo mexer nas coisas? — olhei para a velha

— Fantasmas puxam o pé. O que acha disso? — a velha bufou

— Mas como? Só consigo tocar em Lasyla — dei de ombros

— Mas vai ter que tocar em outras coisas.  — a velha apontou —  E é bom treinar...se já faz quase um ano de sua morte, não sei quanto tempo falta para você perder completamente a razão.

— Obrigado — bufei

— Vamos...— Lasyla ficou de pé — tenta mexer algo.

— Simples assim? — perguntei

— Se sinta confortável consigo mesmo — disse a velha — não pense na sua vida antiga, pense no agora. Só existe o agora.

Ergui a mão e toquei um quadro passando ele sem nem sequer mover um centímetro.

— Tudo bem — Lasyla suspirou — não esperava sucesso imediato.

— Se concentre, Gasparzinho — a velha zoou e eu me irritei

Tentei mexer um vaso, a TV, qualquer coisa, mas nada deu jeito. Meu corpo passava direto como a Kit de x-men. Sentei em uma poltrona e Laysla franziu o cenho.

— Como você consegue sentar mas, não consegue mexer nada? — ela apontou

— Porque ele está confortável com isso. — a velha sentou na mesa — é um ato comum que não exige um pensamento focado.

— Sua cabeça está aonde? — Laysla me olhou

— Não sei...está aqui...eu estou me concentrando — disse

— Não — a velha atraiu meu olhar — Você está pensando que tem que mexer algo para sua família.

Suspirei e fechei os olhos.

— Kenneth...— a velha falou e eu olhei em seus olhos — você não tem mais família. Sua filha tem um padrasto. Sua esposa um novo marido. E você está em um caixão.

— Acha que eu não sei? — rosnei

— Não! — a velha se levantou — Você não sabe. Acha que desvendar esse mistério vai mudar algo? Me diga, você já aceitou que depois daqui você vai simplesmente desaparecer?

Laysla sentou, sem olhar para nenhum de nós. Eu desviei meu olhar e pensei: Eu estava pronto para largar essa vida?

— Eu quero ir — disse, sem olhar para nenhuma delas.

— Não, senhor Walker. — a velha falou e eu tive que olhar para seu sorriso tranquilo. —Você não quer estar morto.

Incógnita: Deixe-o irOnde histórias criam vida. Descubra agora