Eram muito estranhos, aqueles portugueses. Desde quando é que escudeiros trajam melhor do que os seus senhores? Estavam a espiar-nos, tenho a certeza. Ouvi cavalos não muito longe dali.
- Ai Inês, o que é que andas aí a pensar? - A Constança cruzou os braços, fazendo uma pausa de secar os pés da água fria do rio.
A carruagem tinha recomeçado o caminho, desta vez sem mais nenhuma paragem, e balouçava muito. Foi uma longa, dura e desconfortável viagem até Coimbra e o corpo já cobrava. Nem mesmo esta curta pausa, já tão perto, aliviava as dores.
- Não me digas que foi o moreno com a barba por fazer...- Desdenhou para me provocar.
- Quereis à força que me case com um fidalgo daqui, como vós?
- Fidalgo, não! Príncipe, e futuro rei de Portugal!- Corrigiu firmemente com o dedinho indicador levantado.
- Não tereis muito para reinar...- Olhei pela janela as casas que começavam a surgir à medida que entrávamos na cidade.- Só se veem ovelhas, vacas e erva.
Atirou-me uma almofada, furiosa.
- Eu achei os cavalheiros prestáveis, o conde pareceu-me um bom partido.
- Ele tinha cara de quem não é bom partido para ninguém.- Cruzei os braços e toquei no tecido translucido e suave do véu do meu que colocaria em breve a cobrir o cabelo.
Aquele homem tinha o sorriso de quem levava sempre a melhor, e homens arrogantes demais não fazem falta a ninguém.
- Eu estou nervosa, Inês.- Constança pousou a mão sobre a barriga e pressionou.- Eu quero tanto que Pedro goste de mim.
- Claro que vai gostar.- Apertei-lhe a mão com um sorriso caloroso para a encorajar.- Sois filha de Constança de Aragão.
- A situação está tão tensa, Inês...
Eu entendia os seus nervos e preocupações. Constança casou o ano passado com Pedro, em Évora, por procuração. O rei de Castela não permitiu que Constança estivesse presente e adiou o encontro por meses, até o rei de Portugal exigir o cumprimento do contrato.
Então aqui estamos, enfim. Em Coimbra, para encontrar suas majestades e o infante, embora o casamento esteja marcado para daqui a umas duas semanas, em Lisboa.
- Achas que me vai fazer mal, para vingar a irmã?- Preocupou-se sem necessidade e perdeu até um pouco da cor.
- D. Pedro é sem dúvidas um homem honrado, um príncipe e um cavaleiro. Jamais faria convosco a desonra que o nosso soberano fez com a princesa de Portugal.
Constança procurou a verdade no meu olhar e encontrou-a. Estávamos nisto juntas!
- Agora recompõe-te e levanta a cabeça. Estamos quase no palácio.- Beijei a sua testa e suspirou.
Respirou fundo e esperou que a carruagem parasse finalmente, frente aos sogros. Espreitei pela janela, afastando ligeiramente o véu do vidro e notei um sem-número de cavaleiros, pajens, damas, e cortesãos lá fora, e no topo da escadaria, a família real, vigiada de perto pelos grandes senhores do reino.
- Eu sabia!- Rosnei quando reconheci o suposto escudeiro de hoje mais cedo junto do rei.
- O quê?- Constança afastou-me para também ela admirar todo este aparato em sua honra.
- Olha.- Apontei discretamente lá para cima, para a escadaria.
- Os cavaleiros de há pouco... eles são bem bonitos, vá. Tens de admitir, Inês.
- Não penses em idiotices! Estás aqui para casar com o príncipe... pela segunda vez.- Retifiquei.
Não estava um dia bonito, na verdade. Não se via o sol e passava uma aragem fria, normal de janeiro, só que Constança foi a primeira a senti-la, pois um homem ao lado do rei desceu a escadaria com uma certa impaciência, após uma curta conversa com o soberano.
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Pedro e Inês: O amor que se fez lenda
Historical Fiction«A mísera e mesquinha que, depois de morta, foi rainha». Há amores intemporais, tão fortes que reverberam no tempo pela eternidade e transformam-se em lendas! O amor de D. Pedro e Inês de Castro foi real, ao invés de outros compostos por dramaturgos...