Na manhã seguinte, após uma noite de sonhos perturbados, Inês tomou o desjejum com Matilde, que também se tinha demorado a noite passada.
- Estou exausta.- Murmurou a jovem castelhana.
- É bem feito! Onde é que já se viu duas jovens da vossa idade, solteiras ainda para mais, a festejar daquela maneira?!- Maria resmungou enquanto arrumava alguns dos baús de Constança.
- Mas Maria, Constança só chega a Portugal uma vez na vida... não poderíamos rejeitar as boas maneiras do rei.- Matilde defendeu enquanto provava o ovo cozido com sal.
- Por falar nisso, onde está Constança?- Inês notou por fim, a ausência da sua senhora. E se estavam ali as três, então quem estaria com ela?
- O infante pediu para a chamarem. Pelo que sei não sairão do palácio, e garantiram-me que ficariam à vista de todos.- Maria passou as mãos pelo vestido de veludo verde, que tinha borbotos de lã devido às roupas de Constança.- O príncipe pediu privacidade, pelo que me transmitiram.
Inês não pôde deixar de se sentir inquieta. O marido da sua melhor amiga ousou lisonjeá-la a noite passada, longe do olhar de todos, e hoje pedia privacidade. Tinha razão, o príncipe de Portugal era um maldito mulherengo incorrigível, mas pelo menos um mulherengo que tentava as cartas consigo, onde não teria chance de ganhar.
Pior será quando tentar com outras mulheres que cederão com facilidade aos encantos lusitanos.
💕👑💕
- Fale-me sobre si.- Pedi a Constança, sentados os dois na pouca relva do pátio do palácio, perto da vista dos guardas, dos estribeiros e damas da corte, principalmente as da minha mãe.
- O que quer saber ao certo?- Endireitou o vestido, levemente incomodava com a mancha de erva no tecido.
Encolhi os ombros, incentivando-a a falar do que quisesse, sem parecer muito aborrecido. A minha mãe tinha-me forçado a esta fantochada. Estou casado, não preciso de me fazer de interessado para uma estranha.
- Bem, eu pertenci à corte de Castela, até receber vossa proposta de casamento, que o meu pai não hesitou em aceitar.- Admitiu envergonhada, devido aos constrangimentos que o rei impôs ao vassalo.
Era adorável.
- Eu gosto de bordar e caminhar, principalmente na companhia de Inês.- Sorriu e de repente a conversa ficou interessante.- Ela sempre me foi uma aia fiel, é como uma irmã para mim. Além disse é ótima com as piadas, ela é incrível.
- Pa...parecem tão dife...ferentes...- Indaguei e silenciei-me frustrado. Pela admiração chapada no rosto de minha mulher, ninguém lhe disse que eu... isto vai ser ainda mais embaraçoso do que previ.
- Sim. Somos sim. - Constança apertou-me a mão com ternura e pude respirar de alivio.
Constança era a mais contida, a mais formal e gentil, porém Inês foi a alma da festa de ontem, desregrada, feliz e satisfeita.
O seu brilho irradiava por todo o salão de festas, o seu sorriso deslumbrante só incentivou os músicos a tocarem com mais vigor, e cada vez que a ouvia rir só a via a ela e mais ninguém. Era só ela, era com ela que eu queria dançar.
- Verdade. Talvez por isso nos demos tão bem.- Admitiu com um sorriso doce, arrancado umas ervas enquanto as passava pelos dedos.- Inês é uma pessoa com os pés assentes na terra, não se deixa levar por devaneios e é bem mais divertida que eu. É tão dedicada aos outros... põe sempre o meu bem-estar acima do seu. Verá, quando a conhecer melhor.
- Sabe ler? Escrever?- Encostei-me mais descontraído no velho carvalho que deixava uma sombra agradável nas tardes de Primavera e Verão. Hoje ouvíamos o som agradável do vento a passar-lhe pelas folhas robustas, o que talvez mascarasse as palavras que atropelava.
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Pedro e Inês: O amor que se fez lenda
Ficção Histórica«A mísera e mesquinha que, depois de morta, foi rainha». Há amores intemporais, tão fortes que reverberam no tempo pela eternidade e transformam-se em lendas! O amor de D. Pedro e Inês de Castro foi real, ao invés de outros compostos por dramaturgos...