capítulo 3

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Limestone, Maine
08 de fevereiro de 2017
Melina

- Eu vou me casar com um negão – Hope diz, repentinamente. Franzo o meu cenho e a encaro.

- O quê? – Ela morde um pedaço de sua maçã.

- Eu vou me casar com um negão. Pode anotar o que estou te falando – Ela termina de mastigar e engole. – Quando eu for fazer meu trabalho voluntário na África, vou conhecer meu negão. Ele vai ser lindo, Mel, anota o que eu tô falando. Ele vai ser alto, vai ter cabelo cacheado e vai ser negão. Nossas filhas vão ser lindas. – Eu rio e a encaro.

- Da onde você tirou isso? Não estávamos falando sobre sua tatuagem de abacaxi?

- Não consigo ficar muito tempo falando do mesmo assunto, desculpa – Ela se levanta e deixa sua bandeja em cima da lata do lixo.

- Aposto dez dólares que você vai casar com um branquelo. Um loiro com olhos muito azuis, e os filhos de vocês vão ser iguais ao pai, com o cabelo liso escorrido – Ela me dá um tapa e eu reclamo.

- Cala a boca, sua cretina. Para de jogar praga, meus filhos vão ser negros que nem o pai, e vão ter o cabelo cacheado também – estendo minha mão para ela.

- Vai apostar os dez dólares? – Ela encara minha mão por alguns segundos e a aperta.

- Com certeza. Eu vou fazer questão de ir com ele na porta sua casa entregar o convite e ainda colar a cara dele dentro! – Eu rio e percebo que aos poucos o refeitório vai ficando vazio.

  Temos mais vinte minutos de almoço antes de termos aula com o professor gostosão de biologia. O refeitório era grande o suficiente para abrigar os 105 novos alunos e ainda sobrar espaço, com as paredes totalmente feitas de vidro e funcionárias sorridentes demais para acreditar que de fato ficavam o dia todo limpando a bagunça de adolescentes e vendiam almoços para todo tipo de gente.

  De longe, consigo reconhecer Ava Both com uma bandeja de comida na mão, ao lado de uma menina loira e sardenta que reconheço como Beatrice Rosewood.

- Que tal chamá-las para almoçar com a gente? – Hope sugere e eu assinto. – Ei, vocês, venham se sentar com a gente!

  Beatrice abre um sorriso tímido e caminha até nossa mesa. Ava tem a expressão de quem vai nos dar um soco á qualquer momento, sua altura e óculos a deixava ainda mais séria do que já assemblava.

  Beatrice tinha uma altura normal, usava uma blusa preta com jeans de lavagem clara, olhos escuros e doces, cabelos loiros e lisos, além de várias sardas que salpicavam sobre seu rosto. Ava era mais baixa do que as meninas da nossa idade, com cabelos cacheados e volumosos que batiam no seu ombro, a pele cor de oliva e olhos sérios e escuros.

  Ambas se sentam e Hope sorri para elas.

- Eu já as conheço de Nova Jersey, não conheço? Vocês não eram do mesmo colégio que eu?

- Ah, sim. Eu lembro de você com Agatha, Mimes e outras meninas do nono ano. Não sabia que tinha sido aprovada na MSSM – Beatrice diz. Ava começa a comer seu hambúrguer e mal olha para nós.

- Eu também lembro de você! Sabia que reconhecia seu rosto de algum lugar – Hope se dirige para Ava. – Você também estudou comigo em Nova Jersey, não estudou? – Ava esboça um sorriso simpático e assinte.

- Também já estudei com você em Nova York. Do sexto ao oitavo ano, não é? – Decido socializar e ela termina de mastigar.

- Também me lembro de você. Só vivia com Mary e Julian pra cima e pra baixo – sorrio e ela dá outra mordida em seu hambúrguer.

- Conhece Mary e Julian?

- Mary é minha amiga, bem, pelo menos era. Julian e eu não nos falamos mais com tanta frequência, mas de qualquer forma eu ainda gosto muito dele. Como ele está?

- Ele continuou em Nova York junto com Mary. De lá só vieram Lucas, Miles e Piece – Hope rouba uma batata frita do prato de Ava e ela lança um olhar ameaçador para Hope.

- A gente nem se conhece e você já tá roubando minha comida? Nem me pedir você pede? – Hope sorri desajeitadamente com a batata ainda na boca e Beatrice quase cospe seu refrigerante, rindo da reação de Ava.

- Não sei qual é a graça – Ela diz para Beatrice e então Hope também ri. Ela revira os olhos e continua comendo seu hambúrguer.

- Todo esse enxame por causa de uma batata frita? Deixa eu falar do meu negão pra vocês que a gente ganha mais do que discutir por causa de uma batata. – E então Hope volta à falar sobre sua teoria de como vai conhecer seu negão na África do Sul.

- Acha que essa calça me deixa com bundão? – Hope e sua família haviam se mudado para Limestone depois que souberam da sua aprovação na MSSM, mas durante os dois primeiros dias ela ficou nos próprios dormitórios da escola comigo, mas agora já que havia arrumado todas suas coisas na nova casa, ela apenas me acompanhava durante o dia.

  Encaro sua bunda por alguns segundos e depois olho para ela.

- Seu short de alien te deixa com ela maior – Ava a encara.

- Não vejo diferença nenhuma. Continua sem bunda.

  Hope lhe mostra o dedo do meio e se joga na cama.

- Amanhã vão fazer uma festa de boas-vindas pra minha família e pra família dos Harvey, vocês podem vir comigo? – Beatrice tira os olhos da tela do celular por alguns segundos e a encara.

- Harvey? Quem são?

- Audrey e Anthony Harvey. Eles se mudaram pra cá junto com a minha família, Anthony é muito amigo do meu pai – Ela fica de bruços e começa a mexer em seu cabelo. – O filho deles é bonitinho. Allas Harvey. Talvez eu possa apresenta-lo pra uma de vocês.

- Nem inventa, já tenho meu varão em mente – Ava diz e nos a encaramos, incrédulas.

- Você? Um varão? Quem é? – Hope pergunta.
 
- Para de ser enxerida, garota. Vocês não conhecem, é de Nova York .

- Bem, muito obrigado pela oferta, mas eu estou de olho em outra pessoa – Beatrice diz, voltando á mexer no celular.

- Philip Faccine? – pergunto e ela fica vermelha.

- Como sabe?

- Nós vimos como você o encara. Muita gente já sabe.

- Ah, puxa...

- E você, Melina? – deixo de encarar a TV onde passava um show da Demi Lovato e a encaro.

- O que que tem eu?

- Posso te apresentar pro vizinho gostosão. Na verdade, ele não é tão bonito assim, mas acho que dá pro gasto.

- Tudo bem. Duvido bastante que ele se interesse – Hope revira os olhos e se levanta da cama.

- Deixa de ser boba, nós vamos arrasar amanhã. – Ela corre para fechar a porta do quarto quando um de seus irmãos gêmeos joga uma bombinha de fumaça fedida em seu quarto. – Daniel! Seu filho da puta! – Ela pega uma frigideira que estava encima de sua escrivaninha e corremos para fora do quarto, todas tossindo com o mau odor.

  Hope começa á correr atrás do irmão com uma frigideira e apenas encaramos a cena, sem saber como reagir.

- Por que diabos ela tinha uma frigideira na escrivaninha? – Beatrice pergunta e eu balanço a cabeça.

- Eu não faço a mínima ideia.

Talvez um diaOnde histórias criam vida. Descubra agora