E lá estava eu com o punho direito erguido acima do meu ombro, em frente à porta da minha nova sala de aula. Não estaria exagerando ao dizer que até podia sentir uma gota de suor escorrer da minha têmpora até a parte de trás da minha orelha. Naquele momento a unica coisa que se fazia presente era uma mistura de medo, ansiedade e pavor. Três batidas foram o suficiente para chamar a atenção da professora (digo isso porque consegui escutar o barulho de cadeiras arrastando, apesar de diversos cochichos, do outro lado da porta).
- Turma, esse é Elí, o novo aluno da classe. - Disse a professora logo após eu entrar, e me colocar diante de toda a sala. - Espero que todos o respeitem, e que tenhamos uma boa convivência, como falamos a Elí?
E em um desajeitado e horrível coral, todos (ou quase todos) da sala gritaram.
- Seeeeja Bem Viiiiindo ElÍ!!!
Se tinha uma coisa que eu podia reparar ao entrar naquela sala, era o piso mal polido e encardido. Sim, desde o momento da minha entrada não tive a capacidade, ou vontade alguma, de erguer meus olhos para os alunos. Na primeira brecha que tive para me sentar, a agarrei com todas as forças. Era como se instintivamente meu corpo fosse se direcionando à antepenúltima cadeira da primeira fileira. Era perfeita, além de vazia, estava colada na janela.
"De onde é esse cara?", "Ele nem falou com ninguém, já começou bem!". Exemplos de cochichos que consegui ouvir a uma distância de quase um metro entre mim e aonde havia me sentado.
"Certo, só tenho que me sentar, tirar meu material e seguir normalmente a aula. Se Deus quiser, esse sofrimento vai acabar logo!!". Pensei. Mas assim que coloquei minha bolsa sobre a mesa, tive a estranha e verídica sensação de estar sendo observado.
"Devo ter jogado pedra na cruz, não é possível!!". Foi única coisa que veio à minha mente. Enquanto virava meu rosto para junto da janela, na intenção de observar o enorme pátio da escola lá embaixo (bom, aquela sala era no terceiro andar se não estou enganado). Talvez naquele instante, consegui tirar da mente aqueles intensos e julgativos olhares, porém, algo não demorou a acontecer, e afirmo a vocês que este próximo ato será o que trará toda a confusão para este livro.
As mãos dela eram macias como pantufas, e pude ter o prazer de sentir uma delas empurrando meu ombro para me chamar. Claro, o susto foi inevitável, porém a beleza dela cobria qualquer coisa que eu pudesse dizer ofensivamente naquele momento. Enfim, havia erguido os olhos para ver o rosto de alguém naquela sala.
"Per-fei-ção!". Tenho certeza que foi o que meus lábios lutavam para dizer naquele instante. Podia ver todas as minhas imperfeições através daqueles grandes olhos verdes, a pele macia de seu rosto rivalizava com o brilho de luz da lâmpada daquela sala (não estou nem brincando), e seus cabelos? Acho que só os primeiros raios de sol no horizonte seriam uma descrição digna daqueles longos cabelos dourados.
- ... Tá fechado então às 17:00hrs atrás da escola, temos algo para você lá! - Disse aquela linda garota segundos antes do sinal tocar.
Queria poder dizer que esse foi o ponto mais emocionante do meu dia, mas não vou iludir vocês. Acho que devo pontuar o incrível horror que é estudar com seu irmão mais novo. E aqui lhes apresento Eliabe, meu irmão de 8 anos de idade. Juro que não sei o que houve, mas no exato momento em que pisej no último degrau dos longos três jogos de escada, este ser extraordinário aparece aos prantos na minha frente. A única coisa que podia entender de todo aquele show era que ele havia levado uma pancada na testa, pois havia um enorme "galo" deixando tudo autoexplicativo.
- Alí! Foi ele alí! - Disse ele meio engasgado com seus próprios soluços, enquanto apontava para o garoto que havia o agredido.
Quando encontrei a pessoa que havia feito aquilo com o meu irmão, um espírito de lutador caiu sobre meu corpo. Só me vi correndo na direção dele e pegando impulso em uma plataforma quadrada de cimento. Mesmo o garoto sendo o dobro do meu tamanho (certeza que já tinha repetido uns 7 anos), de nada bastou quando eu grudei nas suas costas e soquei sua cabeça até ambos caírem no chão. Como em qualquer outra realidade, foi questão de segundos para que em torno de nós uma multidão se formasse, que gritava:
"Briga, Briga, Briga!!!"
Agora, com certeza, o coral estava uníssono, mas eu não conseguia prestar atenção nesse pequeno detalhe, não estando sobre o peito daquele garoto, socando seu rosto como se fosse uma almofada.
Aquela situação não demorou muito. Dois seguranças enormes vieram me tirar de cima do meliante e nos levaram à diretoria.
- Diretora, por favor, não chame minha mãe aqui não! Eu prometo que vou me comportar o resto do ano... - Dizia aquele garoto que aparentava ter uns 17 anos na cara e estava chorando igual um bebê na frente da diretora.
- "Fessora", ele foi bater no meu irmão mais novo, olha o tamanho desse maluco pra bater num menininho. - Enquanto falava, olhava para seu rosto com o pior desprezo possível.
No fim, tudo se resolveu. A diretora decidiu que não contaria às nossas mães, na condição de nunca mais aparecermos em sua sala. Não discordei, não estava querendo apanhar em plena Sexta-Feira. Se eu já me sentia o centro das atenções no começo do dia, depois deste incidente tudo ficou mais intenso; em contrapartida, não aconteceu nada mais de interessante no restante das aulas.
Quando o horário de aula enfim terminou, segui para o tal "local de encontro" dito anteriormente pela estranha garota de cabelos loiros, esperei no máximo 3 minutos, até ouvir novamente aquela doce voz às minhas costas.
- Está aí a nossa "estrelinha", e pelo que pude ver, conseguiu brilhar hoje! - A linda garota saía de trás de minhas costas, com o tom mais sarcástico possível de se alcançar em sua voz.
- Diga logo o que você quer, não tenho todo o tempo do mundo. - Afirmei grosseiramente, independentemente de sua incrível beleza; reconhecia de longe um sarcasmo, e automaticamente minha vontade de ficar ali havia cessado.
- Ué!? Deixou a mamãe esperando? Ou tá com medo que ela venha buscar? Vou ser curta e direta. Você passou o dia inteiro na escola, e não conversou e nem tentou socializar com ninguém... - A garota com seu dedo indicador direito tirou uma mecha ridiculamente linda de seu rosto e a "guardou" atrás da orelha, em seguida cruzou os braços. - Te proponho um teste para ver se você vai merecer ou não andar com meus amigos e eu. Você pode muito bem aceitar, como pode continuar sozinho e arrumar outro "amiguinho" pra trocar carícias, como mais cedo... - disse a garota ironicamente, fazendo referência à briga mais cedo.
Ela, apesar de estranhamente linda, parecia igualmente chata, mas aquela era minha primeira (e provavelmente única) chance de socializar com alguém. E sem pensar em nenhuma consequência, apenas confirmei que faria esse tal teste.
- Perfeito, passe aqui amanhã neste mesmo horário. Seu teste vai ser logo ali... - Ela simplesmente se virou e foi andando. - Ah, meu nome é Kauane! - e seguiu seu caminho.
Novamente, eu estava prestes a fazer algo que eu sentia que iria me arrepender.
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O sol de um futuro distante
Ficção AdolescenteEm uma jornada marcada por mudanças constantes, Elí, um jovem que enfrenta a solidão devido às frequentes mudanças de sua vida, descobre uma conexão única ao conhecer Kauane. Juntos, eles se veem envolvidos em uma situação desafiadora e, movido por...