Digna do seu amor?

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Radiante, o sol surgiu entre as montanhas e enfeitou o céu pela bela manhã. Mesmo não podendo vê-lo, Cora lhe sorria, dando-lhe mais valor do que muitos que podiam admira-lo e não o fazia. Caminhou para o jardim e sentiu o aroma das flores. Coisas simples que lhe trazia paz. 

- Por que não vai consola-la, como sempre faz? 

Aquela maldita voz forte,  sussurrada em seu ouvido, lhe enfureceu. Mas aquilo não tornaria cinza o que sentira com tanta cor. O dia ainda sim continuaria sendo bom... pelo menos, era o que mais desejava e não seria uma mulherzinha qualquer que mudaria tal fato.

- O que você fez para ela, Soraia? - Ríspida e direta, Cora respondeu, fazendo a mulher gargalhar e quando a risada ardida sessou, sentiu o hálito quente da outra, perto de sua boca.

Ao perceber que Soraia segurava firme em seu queixo, fechou suas mãos, apertando-as, descontando a sua ira em sua palma, evitando agredi-la como sempre desejara. Não era justo e aquele inferno precisava acabar, mas como? se o medo ainda prevalece.

- Eu? - Gargalhou novamente. - Foi você quem o fez e nós sabemos muito bem que a culpa sempre será sua, por ser uma maldita cega covarde!

Agradeceu mentalmente por estar de óculos, evitando que a outra pudesse ver o seu desespero e o asco que sentia por si mesma. Preferiu acatar o silêncio e quando virou-se para sair, sentiu seu braço ser segurado.

- Eu só lembrei que ela é uma rejeitada mal amada! Por que diabos ela precisa ser tão sensível? - Zombou - Por que ela sempre chora? Eu realmente não acredito que o fato de não ser amada, dói!

- Ela é muito bem amada por mim e sabe disso!

- Cuidado! - Sem falha, pareceu preocupada, preocupando a mais velha - Ela pode confundir e então, eu irei adorar a cena! - Debochou.

- Você é podre! 

Cora, saiu a passos largos e Soraia divertia-se com a cena que acabara de fazer. Esmagar os corações feridos era o seu passatempo preferido.

***

Adentrei o meu apartamento luxuosamente decorado com grandes pinturas coloridas do grande pintor brasileiro: Romero Brito e um vento frio passou por minhas espinhas. É, nem isto me tira deste mundo incolor. Sem pressa, me despi, ali mesmo, na sala. Deixei minhas roupas espalhadas e fui para o banheiro. Abri o chuveiro e deixei a água fria molhar a minha pele. Ao perceber que o branco de meu corpo já estava vermelho, por conta da fervura da água, lembrei-me que o frio está em meu interior e que o choque térmico não é bom. Não, a temperatura não estava no "desligado", mas é que por não sentir nada, pensei que não haveria consequências, mas o meu corpo quente, sentiu.

Aquela estranha invadiu os meus pensamentos. O mistério que o seu olhar carrega me desperta tantas coisas que eu não deveria estar gemendo por isso, mas foi inevitável. Dentre todas as fodas vazias que tive, a única que fora capaz de me preencher foi esta. Eu me fodi pensando nela. Irônico, não? Eu nem a conheço e não pretendo conhecê-la, mas a desejo. 

O que eu estava fazendo? Rir nesta altura não poderia ser permitido. É, talvez não seja, mas foda-se! Fechei a torneira e finalizei o meu banho. Fui para a sala e me joguei no sofá. Não me sequei e nem quis saber sobre roupas, me permitindo fingir que a vida é um mero sonho de algo melhor. Talvez, neste "algo melhor", eu possa ser um anjo, já que neste sonho, eu estou pendendo para o diabo. Procurei o controle da televisão e o encontrei entre as inúmeras peças de roupas, espalhadas pelo ambiente. Gargalhei, ao perceber que a maioria não era minha. 

- Vozes. São apenas vozes nos guiando para o cinza e eu prefiro ser cor! 

Desisti da televisão e fui para o meu estúdio. Vesti o meu avental e peguei o material necessário para criar alguma coisa, mesmo que abstrata. Liguei o rádio e um instrumental qualquer me estourava os tímpanos. 

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