Prólogo

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Não se lembrava de ser tão frio. Viver era frio. A vida em si era calorosa e cheia de alegrias, mas não para ela. Ysmatiz já não era uma pessoa comum. Já nasceu e reviveu, vítima de inimigos e ajudada por "amigos". O salão era escuro, iluminado somente por um único lustre no centro do enorme espaço. As paredes recém construídas eram mais frias que suas mãos. Para qualquer lugar que iria, este também seria amaldiçoado. Sentiu a presença de pessoas próximas. Poucos eram os que estavam em seu novo castelo. Pessoas que eram dignas de sua confiança, mesmo se esquecendo de como era confiar. Se levantando do trono, ela deu um passo para frente, descendo um degrau. Seu sapato fez um barulho no mármore, ecoando por todo o salão. Continuou descendo até chegar ao piso de pedra, um pouco distante de seu trono. Ysmatiz uniu suas mãos e as observou. Os dedos longos e frios, terminados por unhas que mais pareciam garras negras. Seu vestido era algo apertado, que fazia sua cintura parecer presa. Não havia outra cor. Era tudo preto. Somente sua pele pálida não combinava com seu luto eterno. Os cabelos, estavam soltos aos ombros, como um sinal de libertação, retorno.
Começou a andar pelo salão, ouvindo os passos ecoarem por todo local. A solidão e a escuridão do local a vez lembrar dos sete meses atrás, quando tinha retornado. O mundo todo pareceu escurecer. Os dias pareciam noites, devido as nuvens sempre escuras pairando no céu. Um frio de gelar os ossos de qualquer um dominou a terra. Não era de se esperar que bem rápido, retornasse ao poder. Tinhas a maioria dos povos mágicos à seu lado, o que ajudou em muito mais sua conquista. Os solares e as lunares não ousavam entrenta-la. Começaram a viver escondidos como ratos, só saindo para procurar o que comer e voltando às suas tocas quando a encontravam. Após dois meses, começaram os atos de rebeldia. Pequenos grupos, tentando salvar seus companheiros, que eram caçados e eliminados por ela, a dama da morte. Devido a sua influência e poder, os rebeldes sempre eram vencidos com facilidade.
Após quatro meses, Ysmatiz decidiu se estabelecer em algum lugar. O reino de Kéhtra, pareceu ser o lugar perfeito para fundar sua sede. Kéhtra era o maior reino das redondezas, que ficava entre as destruídas fortalezas que antes pertenciam aos solares e às lunares. O rei, era um homem medroso, que se curvou a Ysmatiz antes mesmo dela chegar.
Agora, Kéhtra não tinha mais esse nome. Se tornou Ystiz, o reino das sombras e das trevas, onde quem entrava, jamais saía. Não vivo.
O rei e todos seus súditos foram expulsos, as muralhas e o castelo, reformados. Agora a cidade era o lar de guerreiros e mercenários, e a cor clara da cidade, substituída pelo negro da fumaça que sempre saía das forjas, de onde eram criadas as armas mágicas que bloqueavam a magia dos rebeldes.
Batidas na porta interromperam os pensamentos de Ysmatiz. Voltando a si, ela voltou aos degraus e ficou ali, vendo as portas se abrirem e dois soldados de armaduras negras entrarem com duas pessoas, que pareciam abatidas. Após jogarem as duas no chão, um dos soldados se adiantou, tirando o capacete, revelando um rosto castigado pela idade e guerras travadas.
- Vossa graça. - Ele fez uma reverência, demonstrando o enorme respeito que tinha. - Essas duas mulheres foram encontradas nas proximidades. Pareciam estar querendo espionar. Usaram magia quando as interceptamos.
Ysmatiz se aproximou mais um pouco das duas, com as duas mãos ainda entrelaçadas, curiosa. Uma tinha a pele morena e a outra... ela parecia conhecer a outra. As duas encaravam ela, pareciam sem medo, apenas com ódio.
- Wilgins fez o teste. - O soldado continuou dizendo, apesar de Ysmatiz saber o que ele diria. - Elas são...
- Lunares. - Ysmatiz o interrompeu. Olhando as duas mulheres, ela abriu um sorriso largo. Apontando para a mais velha, tentou reconhece-la. - Você...Seu rosto.
- Não se lembra de mim? - A mulher disse, levantando o rosto para olhar Ysmatiz. - Deve se lembrar de ter matado a pessoa que eu amava.
- Garva! - Ysmatiz disse de repente, assustando os soldados ali. - Não consigo acreditar que seja você!
- Surpresa? - Garva cuspiu próximo a barra do vestido de Ysmatiz, parecia mais uma mancha de sangue.
- Vejo que ainda continua a mesma. - Ysmatiz disse calma, com a voz serena e plena. - Está trabalhando com os rebeldes? Lunares e solares se unindo contra mim, que detenho o poder dos dois.
- Você não é a única. - A garota ao lado de Garva disse. Tinha um rosto juvenil, porém com um grande corte na testa que escorria sangue.
- Ah... Parece que não. - Ysmatiz deu dois passos para o lado. - A reputação de Aubrey Moon já chegou em meus ouvidos. Apesar de tamanhos feitos, não parece corajosa o bastante para me enfrentar. Quantos lunares e solares terão que morrer para eu provar que sou a única que posso salvar a todos?
- Salvar? - Garva se levantou, com as algemas que tinha nos pulsos tilintando. - Tudo que você faz é destruir! Você é puro caos e morte!
Ysmatiz colocou a mão na boca, simulando uma expressão triste e decepcionada.
- Me sinto ofendida... - Ela tirou a mão, revelando seu sorriso. - É uma pena eu não ligar. Levem as duas até as celas e...
- Poupe a garota. - Garva indicou a garota ao seu lado com a cabeça. - Por favor. Meg é sua descendente...
- Para! - A garota ao seu lado, Meg, também se levantou. - Não tente me defender. Sei cuidar de mim sozinha!
- Minha descendente? - Ysmatiz se aproximou levemente de Meg, levantando o rosto dela, segurando com força seu queixo. - Bisneta de Yzette. Minha irmã.
Ysmatiz leu isso da alma da garota. Era algo tão fácil e rápido. Uma alma viva era simples de ser lida. Ao contrário de uma alma corroída e podre, como a sua.
- Muito bem. - Ysmatiz se afastou, subindo os degraus e se sentando no trono frio. - Vamos mostrar o respeito pelos parentes. Levem Garva para as celas na ala Oeste. Quanto a garotinha... para a câmara de tortura.
- Não! - Garva gritou, avançando para frente, sendo impedida por um soldado, que a agarrou. Aos gritos, ela saiu, assim como a garota, que parecia apavorada. Ysmatiz ouviu a porta se fechar e se apoiou novamente no encosto do trono. Com um sorriso de lado nos lábios. 

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