Complicações

94 15 2
                                    

Os pássaros cantavam mais que o normal. Pareciam felizes por ver dois naturais andando entre eles. Kria segurava com força um grande cobertor por cima de si, enquanto Kris parecia suportar o frio. A chegada do inverno era iminente e com ele, complicações viriam. A falta de comida da resistência pareceu mexer com a cabeça de Kris. Seus pensamentos eram divididos entre Aubrey e a resistência. Tantas coisas que o deixava sem sono.
- Você não acredita em mim. - Kria disse, se apoiando em uma árvore e olhando pra seu irmão. - Acha que estou louca.
- Não é isso, Kria... - Ele agradeceu mentalmente por ela ter parado. Se sentou no chão, em frente a ela, para descansar as pernas. - É que... com tantas coisas acontecendo, não sei se...
- Não precisa continuar. - Kria esticou a mão para o alto. Um galho pareceu se curvar até ela e em questão de segundos, uma maçã nasceu em meio às folhas. Pegando-a, ela deu uma mordida. - Você acha que fazendo essa jornada, poderá não ser útil na resistência.
Kris se levantou, já descansado, e recomeçou a andar, com ela acompanhando de lado.
- Visões e sonhos são diferentes. - Ele disse, observando o caminho na floresta. - Visões são coisas que vão acontecer, de uma maneira ou de outra. Sonhos são o oposto. Coisas que nunca acontecerão.
- Tenho vinte anos. - Ela terminou de comer a maçã e a jogou pro lado. Imediatamente, a terra cobriu o que sobrou da fruta. - Passei minha vida toda treinando, enquanto você limpava as fezes dos cavalos.
Kria agarrou o braço do irmão. Em seu semblante, tinha raiva. Não uma raiva colossal. A raiva de que ele ainda duvidava dela.
- Sei muito bem diferenciar sonhos de visões. - Ela o soltou e começou a caminhar em sua frente, suspirando pelo caminho. Depois disso, Kris seguiu em silêncio.

***

O pôr do sol lembrava Kris dos tempos na fortaleza. O cheiro dos cavalos enquanto o sol descia para dar lugar à lua.
- Se abaixa! - Kria desceu para o chão, assim como ele. Sorte a deles que um tronco enorme os escondia.
Soldados. Grandes homens cobertos por uma armadura negra e elmos rodeados de espinhos. Era lindo de se ver, mas não era nada bom sentir aquelas coisas. Uma outra figura se aproximou daqueles homens, que pareciam montar acampamento.
- Quero isso tudo montado antes do anoitecer. - A dona da voz se revelou quando o elmo foi retirado. Era uma linda jovem, que aparentava ter seus vinte e cinco anos. - Quem não trabalhar vai se ver comigo!
- É a general dessa tropa. - Kris sussurrou, reconhecendo o símbolo vermelho no peitoral da armadura dela. Seu cabelo era preto, assim como os olhos que eram escuros e a pele branca queimada pelo sol. Era bonita, mas parecia abatida. Nem os soldados de Ysmatiz pareciam ter descanso.
- O que uma tropa faz tão perto da resistência? - Kria disse baixo no ouvido do irmão, observando os guerreiros atenta. - Temos que manda-los pra longe!
- Não podemos. - Kris apontou para um tipo de cajado ao lado da fogueira dos soldados. Era negro, de ferro, que irradiava puro ódio. - Bloqueadores. Ysmatiz tem fabricado eles desde que tomou o poder. Nosso poder não funciona com eles perto.
- Precisamos fazer... - Kria ia dizendo, mas se calou ao ver a general se afastar da tropa.
- Vou rondar a área. - Ela gritou aos seus guerreiros. - Quando voltar, quero esse acampamento de pé!
Ela saiu e Kria deu um sorriso largo. Aquele sorriso era a coisa mais perversa que ela poderia fazer.
- Vamos pegar uma refém.

***

Kris andava devagar pelas árvores, se escondendo e tentando não fazer barulho. A general andava, sempre cautelosa, olhando para os lados e atrás de si. Chegando em uma clareira, ela ficou parada, olhando para o chão. Para a surpresa de Kris, a mulher começou a chorar. Parecia o som do próprio desespero. Aquela mulher estava guardando algum luto, pois apertava com força o peito enquanto as lágrimas desciam.
- Nathaniel... - Ela se ajoelhou no chão, apertando a terra com suas mãos cobertas pela luva.
Kria saltou de uma árvore rapidamente, ficando atrás da mulher, com a mão estendida.
- Solte as armas e se vire com as mãos no alto. - Kria ordenou, pronta para atacar. Aquela era a irmã forte de Kris. - Se tentar gritar, sua cabeça voa antes de dizer a primeira letra.
A mulher que chorava arregalou os olhos, apreensiva. Desamarrando o cinto, a mulher jogou a bainha para longe, assim como um punhal que tinha preso na bota. Colocando as mãos pra cima, ela se virou, agora de frente com Kria. Kris vigiava tudo com cautela.
- Quem é você? - A general perguntou, com a testa franzida.
- Meu nome é Kria. - Kria girou as mãos, fazendo com que raízes voassem do chão e prendessem os pulsos da mulher, os puxando para baixo. Isso fez a general rir.
- Tão idiotas... - Ela disse em meio a uma risada baixa. Kris se aproximou, intrigado.
- Do que está rindo? - Ele perguntou, temendo a resposta que viria.
- Não se usa magia perto de um bloqueador. - Ela respondeu.
Ouviram um grito alto e logo depois, passos apressados. Não tiveram tempo de agir, pois um batalhão os cercou, ficando para todo lado na floresta. Um soldado se aproximou e cortou as raízes que prendiam a general.
- É um grande prazer dizer... - A mulher massageou os pulsos, que estavam em vermelho devido a força das raízes. - Que agora, portadores de magia, são prisioneiros do batalhão de Raya Mettz.

A CelestialOnde histórias criam vida. Descubra agora