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Eu tenho alguns pequenos problemas, desperdício faz meus ossos se contorcerem e sujeira, definitivamente, me deixa agitada como um viciado sofrendo ataque de abstinência.

Ao contrário da maioria dos humanos, há uma consciência dentro de mim, o fim do mundo é uma espécie de neurose, pensar na quantidade de florestas desmatadas por dia para satisfazer o consumismo exacerbado da cambada ignorante que habita o planeta, e os litros de água que cada pessoa desperdiça por minuto, me remete diretamente ao futuro. Futuro esse onde precisaremos matar os vizinhos para alimentar nossa família, futuro esse onde definharemos no calor de graus quase incontáveis, futuro esse que simplesmente sentaremos sem esperança e conformados aguardando a chegada do fim.

Então, de repente Deus aparecerá para dizer que avisou, para jogar em nossas caras sofridas o quanto somos burros. É algo mórbido para se falar, mas lamento informar que tudo não passa da verdade. Infelizmente não tenho um superpoder para salvar o planeta, ou achei uma lâmpada mágica para desejar à um gênio que não exista poluição e todos os materiais necessários para a vida sejam rapidamente renováveis. Então, o máximo que posso fazer é ser a garota chata que inferniza a vida de todos para que façam as coisas de forma correta e consciente, prolongando a normalidade do universo.

— Drew, eu preciso tomar banho, saía desse banheiro agora! — berrei enquanto esmurrava a porta do banheiro onde meu irmão estava enfiado faziam séculos.

Era assim todas as benditas manhãs, acordava com quase de madrugada para chegar primeiro, no entanto o meu probleminha com arrumação me impedia de sair do quarto sem antes arrumar a cama meticulosamente e o palerma sempre conseguia passar na frente.

— Não terminei ainda, sente e espere — respondeu com a voz embaçada pelo som da água do chuveiro a jorrar. Ninguém precisava de mais de cinco minutos para lavar-se, era um absurdo aquela demora.

— Se eu me atrasar para o colégio, nunca mais te dou carona. Vai ter que ir de ônibus com os moleques do fundamental.

A porta abriu, deixando vazar uma camada de vapor junto ao inútil do meu irmão, com sua toalha encardida a cobrir as partes baixas e exibindo seu abdômen musculoso de quem gasta rios de dinheiro com academia e suplementos alimentares.

— Quando tiver que beber da própria urina para não morrer desidratado, vai lamentar por esses banhos eternos.

— Você é nojenta, Geórgia.

Havia uma quilométrica diferença entre mim e meu irmão, apesar de sermos gêmeos, claramente não idênticos. A começar pelo fato de Drew ser o garoto mais cobiçado de todo colégio, exatamente do tipo estereotipado, capitão do time de futebol, namorado da capitã das lideres de torcida, físico invejável e olhos azuis como o céu límpido, destoando totalmente de mim, a baranga do West High. Não que eu me importasse com esse tipo de coisa. Depois que assisti à uma palestra sobre o feminismo, em uma de minhas visitas clandestinas a universidade do nosso estado, deixei de tentar me encaixar em padrões de beleza impostos pela sociedade.

Estava bastante satisfeita com meus quilos à mais, cabelo desgrenhado e acima da orelha, devido a uma boa ação que resolvi fazer ao doar toda aquela mata atlântica para quem realmente precisasse, e óculos fundo de garrafa a combinar com as roupas de brechó que eu comprava uma vez por ano. Ninguém dizia que éramos irmãos e, francamente, não nos importávamos com isso. Ser comparada ao cabeça de vento do Drew era quase um insulto a minha intelectualidade.

Desci as escadas e entrei na cozinha, onde vovó tomava café da manhã na mesa posta, ao lado de Paul que estava a ler o jornal. Drew preparava sua vitamina de proteína atrás do balcão, exatamente igual a todos os dias.

10 FORMAS DE NÃO AMAR O DIABOOnde histórias criam vida. Descubra agora