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Posso parecer uma covarde mentirosa por dizer que Rush Hughes não me assusta com seu olhar fulminante e punhos fechados, mas foi só perceber as gotas de ketchup e algumas migalhas de batata frita tomando conta dos seus jeans, que eu corri o mais rápido possível para longe da diretoria, antes que o tinhoso percebesse que a lixeira lançada sobre suas pernas não sujara apenas o chão.

Estava quase sem fôlego quando alcancei o pátio principal, onde o grupo do grêmio estudantil se encontrava reunido na mesa redonda para estudar os novos projetos do ano. Quando eles perceberam a minha aproximação, as reações antigas de tédio ao me receber, haviam sido trocadas por decepção. Exceto por Jessica Storm que parecia prestes a despejar um jato de veneno ácido na minha cara.

— Oh, — bufou Jessica curvando os lábios entopidos de gloss. — a maluca feminista ainda faz parte do grêmio.

— Alguém precisa saber usar o cérebro nessa coisa — joguei minha mochila no banco vazio ao lado de Toby Jones e retirei um caderno de anotações onde havia escrito parte das minhas ideias para reivindicações e melhorias.

— Estávamos esperançosos com o seu atraso — ajeitou o cabelo vermelho de corte perfeitamente simétrico acima do queixo.

— Tive um pequeno problema — dei de ombros. — Isso não vai acontecer de novo.

— Problemas com o demônio? — Casey Affleck arregalou os olhos verdes e curvou-se para ficar mais próxima de mim. — Fiquei sabendo que ele sabe o gosto de carne humana.

— Os pais dele são traficantes de órgãos, seria estranho se ele não soubesse — comentou uma garota novata do segundo ano.

— Vai me dizer que desconfiam que Rush Hughes seja um vampiro também? — soltei o ar debochada.

— Você também acha? — perguntaram em uníssono.

Curvei as sobrancelhas incrédula, as vezes é realmente difícil de acreditar na vastidão da estupidez humana.

— Com licença, — Jéssica estalou os dedos no ar chamando a atenção para si mesma. — Podemos voltar para o tema central dessa reunião?

— Ótimo — respondi animada. — Vamos começar pela mudança no cardápio da cantina?

— Por que mudariamos o cardápio da cantina? — Toby fez uma careta, que acentuava seu nariz cumprido.

— Porque não queremos ter adolescentes diabéticos e hipertensos no futuro — tento parecer convincente, mas todos me observam aborrecidos como se estivessem fartos de ter alguém tentando salvar suas vidas.

— Bobagem — Jéssica ignora. — Vamos falar sobre o baile de boas vindas.

— Ah, claro — bato uma mão na outra. — Evitar mortes pode ficar para depois, beber ponche e dançar tecno enquanto beija umas bocas de procedência duvidosa é mais importante.

— Exatamente! — Cassidy Lee pareceu despertar do transe provocado por algo insignificante em seu celular.

Eu não tinha muitas esperanças quando decidi me candidatar ao grêmio estudantil no primeiro ano. Afinal, algo composto por populares acéfalos e liderado por alguém como Jéssica Storm cuja principal preocupação é combater o frizz capilar, não é exatamente o ideal de grupo preparado para reivindicar mudanças significativas no ambiente escolar. Porém, algo dentro de mim soava esperançoso, ser membro era um passo para conseguir alcançar meus objetivos. Eu só não imaginava que poderia beirar o impossível mudar a cabeça deles e convencê-los a discutir sobre algo que não fossem entretenimentos supérfluos como bailes.

Eles ficaram horas tentando arquitetar um plano eficiente para levar bebida alcoólica sem que a direção pudesse notar. Eu bem que tentei mudar o foco das discussões idiotas, mas, aparentemente, minha voz era um sussurro inexistente. No fim da reunião, eu tinha uma cabeça explodindo e mais uma frustração para completar o primeiro dia fatídico de aula.

10 FORMAS DE NÃO AMAR O DIABOOnde histórias criam vida. Descubra agora