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Obsessão talvez fosse a maldição jogada sobre mim quando nasci. Eu não consigo simplesmente espairecer e ignorar coisas complicadas que me envolvam diretamente, mesmo que por ventura, isso não seja mais um problema. Deslizei minhas pernas gordas sobre a bancada e apertei o play pela vigésima vez no maior desgosto da minha vida, aquele vídeo estúpido. Mandy me enviara a cópia que circulava pelos celulares de toda West High, e mesmo que ela tenha feito isso mediante a chantagens perigosas, não foi amigável. Eu estava surtando novamente e todo meu sangue parecia está borbulhando com o fervor do ódio.

Quando os gemidos cessaram, eu usei todo ar presente nos meus pulmões para berrar um belíssimo Aaaaaaarg.

— Vendo notícias sobre o gordo da Coréia de novo? — perguntou Drew, enquanto explorava a geladeira atrás de comida.

— O nome do ditador da Coréia é Kim Jong-un — revirei os olhos.— E quem me dera que o motivo do meu desespero fosse ele.

Drew deu a volta e apoiou-se no lado contrário do balcão onde eu estava estirada. Ele ainda usava roupas de ginástica que exalavam um fedor gritante de suor terrível. Como aquelas garotas conseguiam agarrar o palerma naquele estado, era um mistério.

— Queria mesmo falar contigo. — Sua voz tornou-se um misto suave de delicadeza e afeto, que me fez endireitar a coluna na cadeira sentindo-me bastante desconfiada.

Estreito os olhos em sua direção.

— Por que tenho a sensação que você está prestes a me pedir algo, Drewson?

— Acalme-se — ele engole um mirtilo como um legítimo ogro e continua a falar. — Só queria que você me desse uma mãozinha com meu projeto de ciências. Aquela merda é difícil como o inferno e preciso de notas razoáveis para agradar o treinador.

— Por mãozinha você quis dizer fazer o trabalho todo no seu lugar?

— Essa é uma proposta interessante.

— Não foi uma proposta, imbecil.

O palerma movimentou os lábios em um de seus sorrisos que encantam boa parte da humanidade, o público feminino principalmente, sem distinção de idade, opção sexual, grau de parentesco. Era quase como um truque de hipnose, embora, para a infelicidade do meu irmão, estivesse longe de funcionar comigo. Eu apenas bufei e retornei a saga de tortura repassando cada bendita cena do vídeo em câmera lenta.

— Vamos lá, irmãzinha — deslizou as mãos pelo cabelo, que conseguia ser ridiculamente diferente do meu. Era quase como se Drewson tivesse roubado de mim todos os genes bons quando estávamos na barriga da mamãe. Até a textura sedosa dos fios conseguia destoar do emaranhado negro ressecado sobre minha cabeça. — Não seja uma cadela comigo.

— Quem está sendo uma cadela com meu bebê? — Vovó entrou na cozinha pela porta dos fundos, usando um vestido florido de alcinha que a deixava alguns anos mais jovem.

— Minha própria irmã não quer ter a bondade de me ajudar a fazer um projeto de ciências. — Ele choramingou afundando a cabeça no ombro da vovó e passando os braços em torno de sua cintura. Aquilo era um golpe baixo, até mesmo para a cobra peçonhenta do meu irmão.

— Ajude essa pobre criança, Gogo — minha avó fez um beicinho patético.

— Dá última vez que fiz caridade com esse neanderthal, fiquei quase oito horas digitando uma redação, enquanto ele dormia feito um anjo no sofá. Além disso, tenho muita coisa da escola para fazer, não posso desperdiçar um minuto sequer. Estou a um passo da libertação.

— Eu não me esforçaria tanto para entrar na UCK — murmurou Drew.

— UCK é para acéfalos como você. Eu conquistarei minha bolsa de estudos em Harvard e fugirei para bem longe desse inferno.

10 FORMAS DE NÃO AMAR O DIABOOnde histórias criam vida. Descubra agora