O fim da nascente

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O tremular da caminhonete contra o chão irregular da estrada fez com que Lucille recuperasse pouco a pouco os sentidos. Conforme abriu os olhos, imediatamente procurou por Marcus. Ela o viu deitado e seu corpo a sacudir junto à caminhonete. Aproximou-se rapidamente e examinou-o com os olhos nublados pelas lágrimas que pareciam não cessar.

— Marcus, acorde. Por favor, Marcus, você precisa acordar. –Ela sussurrou em seu ouvido, mas ele permaneceu apático.

Lucy colocou sua cabeça sobre as pernas para evitar que ele continuasse chocando-a contra o assoalho metálico do carro. O céu estava escuro como um túnel sem fim. Só então ela teve tempo para entender o que estava acontecendo. Ambos estavam na caçamba de uma picape e a cabine estava fechada, impossibilitando de saber quem a dirigia. Ela observou as árvores passando e subitamente, elas pareceram interromper sua caminhada. O carro havia parado.

— Marcus! Marcus, pelo amor de Deus, Marcus! –Ela sussurrou aflita.

Abraçou-o com força temendo que fizessem algo a ele, mesmo estando desacordado. Seus olhos secaram e ela teve a impressão de que havia desaprendido como respirar, quando a porta da caçamba se abriu e ela reconheceu a figura do gordo.

— Vamos, garota, desça. –O homem disse agarrando as pernas de Marcus e o puxando como um saco de batatas.

Lucy se levantou e sentiu a dor infernal partir-lhe internamente, como uma lança perfurando-a pelas entranhas. Ela se segurou na lataria do carro e manteve-se de pé. Estendeu os braços na tentativa de apanhar Marcus, mas o gordo o lançou ao chão, sem se importar com seu estado. Ajoelhada ao seu lado, ela o chacoalhou gritando, tentando de qualquer maneira acordá-lo. O gordo deu-lhe as costas antes mesmo que ela pudesse erguer o olhar. Subiu em sua caminhonete e acelerou, encobrindo os dois com o rastro da fumaça que fora expelida pelo escapamento.

O peito de Marcus inchou de repente e ele tossiu de maneira brusca, como se houvesse rompido os pulmões. Lucy se curvou sobre seu corpo e o abraçou fortemente. Ela segurou seu rosto e o fitou, recuperando toda a esperança que pensara ter perdido. Assim que o rapaz recuperou os sentidos e enxergou-a a sua frente, agarrou-lhe tomando-a em seus braços e afundando-a em seu peito, quase a sufoca-la.

— Lucille... –Ele começou a dizer, mas o pranto interrompeu sua voz. – Me perdoe, Lucille.

— Está tudo bem agora. – Ela afastou-o para que pudesse fita-lo. – Acabou.

Os olhos do rapaz tornaram-se mais brilhantes de repente, e, logo, lágrimas escaparam e escorreram por suas bochechas. Lucille soluçou e chocou-se contra seu peito, afagando-o na tentativa de que pudesse cessar todo aquele tormento.

Marcus acariciava seus cabelos como se seus dedos houvessem se transformado em plumas. Ele pensou por um momento que talvez preferisse nunca ter acordado, pois preferia não ter que vê-la sofrer. Ele observou-a, odiando a si mesmo por tê-la ignorado quando suplicou que fossem embora daquele lugar. Culpava-se pela tragédia. Os cabelos de Lucille estavam embolados em infinitos nós, seu rosto estava marcado por hematomas arroxeados, suas roupas, sujas e em seus jeans, uma mancha vermelha formava-se entre suas pernas.

Talvez o sonho estivesse a se transformar em um pesadelo e, a única saída para que pudessem acordar era encontrar ajuda. Por mais que procurassem ao horizonte algum sinal de civilização, só viam florestas e a imensidão dos céus. Continuaram a andar, pois era a única coisa a se fazer.

— Marcus... –Lucy disse num tom trêmulo, como se doesse o esforço que fazia para falar.

— Sim? – Ele ergueu a cabeça, pois a mantinha baixa enquanto caminhavam sem rumo.

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