A figura na escuridão balançou a mão a frente, criando uma névoa branca que aos poucos foi tomando forma e como um espelho passou a refletir nitidamente a imagem de uma criança dormindo tranquilamente. A sombra sorriu.
-Você fez muito bem, Thomas! Acho que já é hora da mamãe voltar.
Ela colocou as mãos segurando a névoa como se fosse uma massa e começou a puxá-la para esticar, enquanto ecoava as palavras do feitiço. No chão as marcas vermelhas desenhadas a sangue brilhavam queimando. A mulher sentia seu corpo queimar ao passo que o feitiço arrancava um pedaço da sua alma para conseguir energia, mordeu o lábio inferior para suportar a dor e continuar entoando o encantamento.
A névoa azulada se esticou como uma passagem, o portal havia sido aberto. Através das ondas tremeluzidas era possível ver claramente o quarto do outro lado. A mulher sorriu vitoriosa enquanto atravessava o portal.
Thomas se virou na cama e abriu os olhos, piscando confuso.
-Mamãe?
-Psiu. -ela se sentou ao lado dele, passando a mão entre os cachos castanhos. -Durma -ela sussurrou com um toque de encantamento.
Ouviu passos apressados vindo pelo corredor. Sr. Warrior apareceu a porta não escondendo a surpresa.
-Oi, papai. Sentiu minha falta?
-Amanda!
Ela riu.
-Bingo! Parece que você ficou um pouquinho mais esperto.
-Você morreu! Eu a vi morrendo cinco anos atrás...
Ela balançou a cabeça.
-Parece que não, não é? -ela bateu o dedo indicador contra a tempora. -Pense um pouco, papai.
-O que você fez ao Thomas?
-Ah... -ela olhou para o garoto que continuava dormindo, indiferente a presença dos outros. Então ergueu a mão direita como se controlasse um boneco de corda, movendo os dedos lentamente. O garoto se levantou, se movendo de acordo com os movimentos preditos, ainda dormindo. -Você nunca desconfiou da precedência do Thomas, não é mesmo? Claro que não! Você e a mamãe tão ocupados com os filhos perfeitos. - a voz demonstrava total desprezo. -O perfeito Andy, a Natália com os dramas dela sempre conseguia sua atenção, como uma criança birrenta. Até mesmo a perdida da Rafaela. -ela deu um sorriso frio. -É uma pena que ela tenha ido tão cedo deste mundo.
-Como você pôde? Sua própria família... -Sr. Warrior parecia realmente horrorizado, enquanto Amanda parecia se divertir. A mulher começou a andar pelo local, o salto não fazia nenhum barulho no piso amadeirado, como se ela estivesse andando na água.
-Você já ouviu falar que a variabilidade de genes cria descendentes mais fortes? É uma coisa interessante a se pensar, ainda mais entre raças tão distintas. -ela fez uma pausa e começou a falar como se recitasse um poema -Uma garotinha abandonada na noite fria de inverno, uma para cada família, a proteção da própria magia da natureza, os segredos obscuros escondidos com destreza (...) A noite clamará pelos sangues de seus filhos, a tempestade chegará a todos! -para ele, ela se virou os olhos vermelhos brilhando. -Você reconhece o poema?
-Do que você está...
- A tempestade chegou, papai. -as presas ficaram a mostra e suas garras cresceram rasgando a ponta dos próprios dedos.
No instante seguinte Sr. Warrior estava ao chão numa poça do próprio sangue, com a expressão congelada em surpresa e a garganta aberta. Amanda se abaixou junto ao corpo e, enquanto cantarova uma versão de My Fair Lady, começou a alterar a cena do crime para que parecesse um ataque de vampiros.
Quando terminou, se voltou para Thomas que continuava sentado imóvel assistindo a tudo.
-Ah, querido. Tudo ficará bem. -o corpo do garotinho caiu para trás na cama, pintando o lençol branco de vermelho.
- Tetsu to hagane ja magaru. Magaru, magaru. -Amanda apagou a luz do abajur olhando uma última vez para os corpos sem vida. As coisas iam ficar interessantes. -Tetsu to hagane ja magaru, My Fair Lady.
**
A anciã estava claramente irritada. Juh se encolheu em sua poltrona quando a mulher passou novamente ao redor dela. Pior do que levar esporros, era ter a mulher em silêncio cercando-a como uma presa. Por fim, ela parou em frente a lareira, encarando as chamas avermelhadas.
-Sabe porque nossa família é tão importante?
-Por que temos dinheiro? -deixou escapar e se arrependeu no segundo seguinte quando a mulher lhe lançou um olhar mortal. -Desculpe!
-Porque somos sangue puro. Somos capazes de nos reproduzirmos entre nós e termos descendentes fortes. Nosso sangue é precioso, cada gota perdida é um enorme desperdício. E o que temos? 3 MALDITAS MORTES! E entre elas o único homem da família. Natiele está tomando sangue por conta dos ferimentos, não se tem noticias da Mikaely e temos sorte de Fernanda estar bem. O que tem a me dizer sobre isso, Juliana?
-As coisas saíram do controle. Apenas dois deles tiveram acesso a cozinha, o Sr. Warrior e o garotinho Thomas. Eles podem ter feito alguma coisa quando pediram pra ir ao banheiro. O que me intriga é o fato de apenas as coxas do frango terem sido envenenadas. Era impossível saber pra quem elas iriam.
- Porque isso não era importante. Independente de quem comesse, uma família iria acusar a outra e o acordo acabaria ali. Ambos os lados tinham razões para isso.
-Nenhum dos meus filhos fez isso!
-Eu já lhe disse que você é muito gentil, Juliana. Não se deve confiar nem em sua própria sombra.
-Tem outra coisa.
- O que?
-A garota. Yami sumiu.
**
Mikaely olhou para a tela do celular novamente. Dezenas de chamadas perdidas, mas nenhuma delas de Yami. Ela bloqueou a tela novamente e encarou de longe a pequena estrada que seguia o rio. O dia estava cinzento, as enormes nuvens negras no céu indicavam que uma tempestade estava próxima, e no rio as águas corriam agitadas. Com um suspiro ela começou sua descida pelo barranco, uma figura vermelha na paisagem acinzentada. seu salto enroscou em uma pedra e quebrou.
-Droga! -ela praguejou. Então retirou o outro pé o os jogou longe, seguindo descalça, os pés delicados contra o chão de pedra. Já estava exausta e irritada, seus braços ardiam devido aos arranhões da luta. Os idiotas tinham lhe envolvido no meio, acabando com seu vestido e penteado. Também estava com fome. Mal tivera tempo de aproveitar a refeição quando tudo aconteceu. -Será que tem como piorar? -um trovão seguido por gotas geladas da chuva, confirmou que sim. E ela se apressou pisando nas poças que se formavam.
Mal chegou na casa e a porta estava aberta, uma figura encapuzada a esperava.
-Você está péssima. -ele disse.
Ela ignorou o comentário, se segurando para não xingá-lo.
-Tudo o que você previu aconteceu. Eu acho que chegou a hora.
Ela sentia os olhos dele sobre ela, analisando-a.
-Sim. Entre!
A porta se fechou, deixando o mundo chuvoso para trás.
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Quando a noite clamar por sangue
Teen Fiction*Sinopse temporária* A paz entre raças rivais não pode durar para sempre. E uma falsa paz não pode ser mantida por apenas um dos lados. Transmorfos e vampiros se odeiam desde os tempos primórdios e não seria diferente 200 anos depois da Grande Guer...