Capítulo IV - Morte Em Trapos

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     Após a dança de gala, o coordenador responsável pelo baile, subiu ao palco segurando um envelope vermelho para fazer um anúncio:

     — É chegado o momento mais aguardado por todos! — Ele falava bastante — E o rei e a rainha dessa noite são... — Fez uma pausa dramática e logo em seguida abriu o envelope — E o rei e rainha dessa noite são... Stella e Joh — Um grito de socorro o fez se calar e uma onda de pavor tomou conta do lugar.

      Os curiosos correram em direção ao banheiro de onde vinham os gritos de desespero. Um aluno saiu em pânico do banheiro, gritando que havia um corpo lá dentro. Alguns alunos incrédulos entraram achando que era algum tipo de piada, mas infelizmente não se tratava de uma brincadeira. O coordenador entrou no banheiro e foi direto à cabine e deu de cara com o corpo de Johnny sentado em uma privada, olhando para o vazio. Imediatamente ele pegou o corpo do jovem e o sacudiu chamando pelo seu nome mas já era tarde demais, Jhonny não tinha resistido. A histeria se espalhou entre os alunos, o coordenador tentava contê-los enquanto chamava polícia. 

     Depois de caminhar por quase trinta minutos, Luciel já conseguia ver sua casa "Provavelmente já encontraram o corpo do Johnny, a polícia foi acionada e vieram atrás de mim para me prender" Esse pensamento o assustava, ele apressou os passou após perceber que havia uma viatura em sua porta. Quando finalmente se aproximou da entrada, notou que a porta estava totalmente aberta. Entrou pela sala chamando por sua mãe mas não teve resposta, deu mais alguns passos leves e o som de dois disparos seguidos por gritos de homens vindo dos quartos no segundo piso o fizeram seu sangue fluir, a adrenalina foi ativada, ele correu até a cozinha e pegou uma faca de cortar carne e foi em direção às escadas gritando por sua mãe, por mais que seus passos fossem rápidos, aqueles degraus pareciam nunca terem fim, chegando finalmente no último degrau, viu uma trilha de sangue que se estendia pelo corredor estreito até a primeira porta, onde era o quarto da sua mãe. Luciel estava com medo, suas pernas tremiam, seu coração parecia que iria saltar pela boca, mas avançou assim mesmo. No momento em que deu um passo para dentro do quarto se deparou com uma cena que poderia ter sido tirada de um filme de terror, a princípio seus olhos estavam se negando a acreditar no que via, mas depois daquela experiência anterior não seria bom duvidar do que via, seus olhos começou a se ajustar com a pouca iluminação do quarto e viu uma criatura de aparência humanoide, um manto encapuzado preto cobria todo seu corpo, por baixo daqueles trapos parecia emanar uma energia sombria. A coisa estava segurando uma adaga com uma espécie de pedra vermelha no pomo da empunhadura, sua outra mão era deformada, com unhas que mais pareciam garras. Sua pele era acinzentada, como se estivesse em processo de decomposição. A criatura sentiu a presença de Luciel e virou-se vagarosamente, havia mais um pedaço de pano cobrindo sua boca, deixando apenas os seus olhos à mostra, com um olhar que o amedrontava, aquela expressão exalava maldade, era quase humano, mas ao mesmo tempo era muito do mal, era uma expressão familiar.

     Quando Luciel atentou para o ambiente a sua volta, viu o corpo de um homem no chão, era um policial, seu corpo jorrava sangue através de um corte profundo em seu peito. Um outro policial estava erguido no ar banhado em sangue por causa das garras da criatura cravadas em seu pescoço. Ela girou a lâmina que estava em sua outra mão, fazendo um movimento circular no ar e acertou o peito do policial. Aquela lâmina parecia ter algum tipo de efeito, porque após a perfuração a pedra vermelha no pomo da adaga acendeu, quando essa luz se apagou o policial foi largado sem vida no chão e a criatura foi em direção a Luciel. Ela não andava, parecia estar flutuando no ar, aquela energia sombria que saía da criatura lembrava a nuvem negra que havia matado Johnny. Luciel recuou alguns passos saindo de dentro do quarto de sua mãe. Suas costas se encontraram com a parede do corredor, ao olhar para os lados a primeira coisa que passou pela sua cabeça foi de se refugiar em seu quarto. Disparou até o final do corredor, enquanto seguia depressa, sentiu um arrepio percorrer por toda sua coluna, instintivamente foi forçado a olhar para trás, o monstro estava seguindo-o, quando enfim alcançou a maçaneta a forçou desesperadamente para a porta abrir e olhando para trás freneticamente, acabou entrando de costas no quarto abruptamente, enquanto suas pernas tentavam se manter em pé sem cambalear suas mãos agiam por conta própria trancando a porta do quarto o mais rápido possível. Foi apenas questão de milissegundos para ouvir algo se chocando contra a porta, seu corpo continuou andando para atrás até ser  interrompido por uma mão tocando em seu ombro, ele girou em 180º graus com a faca preparada para o que viesse até ver com bastante nitidez sua mãe, largou a faca no chão e se dirigiu até sua mãe:

     — Mãe, o que está acontecendo ? — Perguntou enquanto a abraçava 

     — Fuja, não importa — Ela estava nervosa e não parava de repetir a mesma coisa — Meu filho, por favor! Saia daqui!

      Nesse instante a criatura deu mais uma pancada na porta e ela rompeu

     — O que você quer de mim? — Gritou com bastante ódio — Nos deixe em paz!

    O monstro girou a lâmina  e se preparou para uma investida contra ele. Christine empurrou o corpo de Luciel para o lado deixando que a adaga atingisse o seu peito:

     — Mãe! — Luciel deu um grito ainda se recompondo.

     — Vai, agora! — Disse Christine enquanto apunhalava o monstro nos olhos com a faca que Luciel tinha deixado no chão — Corra e sobreviva!

     Luciel viu o que acontecia quando aquela lâmina atravessava o coração da vítima, sabia que não poderia fazer mais nada por sua mãe, não poderia deixar que a morte dela tenha sido em vão, caso não saísse dali, era isso que iria acontecer. Enxugou os olhos, aproveitou que a criatura estava atordoada, se levantou dando um último adeus a sua mãe e correu como nunca tivesse corrido na sua vida.

      Por horas ele vagou sem rumo até seus sentidos se acalmarem. Quando finalmente parou por um minuto começou a sentir calor, então retirou o paletó e o colete, e ao fazer isso percebeu que ambos estavam sujos de sangue, por sorte sua camisa não estava manchada. Se livrou das roupas sujas e andou mais um pouco tentando desocupar a mente, havia muitas informações para serem digeridas de uma só vez. Quando o seu cérebro parou de pensar em problemas foi a vez do seu estômago lembrá-lo de que ele precisa comer. Não tinha problemas, de tanto andar sem destino ele acabou parando próximo do centro da cidade vizinha, passou por algumas lojas até entrar em uma padaria.

     Chegando na padaria, foi atendido por um senhor muito simpático, Luciel olhou para a bancada e pediu um sanduíche de queijo com presunto e um suco natural de uva. Enquanto o senhor falava com uma funcionária, uma viatura da polícia estava parando em frente ao estabelecimento. Tentando disfarçar o nervosismo, perguntou com calma ao idoso se ali havia algum banheiro, o senhor apontou para a porta com a placa escrita "desocupado". Ele foi até lá rapidamente antes que os policiais o vissem. Eles entraram na padaria e se dirigiram até o senhor, perguntaram se estava tudo em ordem por ali, o velho fez um sinal de aprovação com a cabeça, o segundo policial começou a caminhar pelo estabelecimento, Luciel acompanhava tudo por uma fresta da porta do banheiro. O policial que estava falando com o senhor pegou do bolso um papel e mostrou para ele perguntando se tinha visto o tal rapaz da foto, mas o mesmo negou. Como não havia mais o que fazer ali ele agradeceu o senhor e chamou o seu parceiro para irem embora. Luciel deu um suspiro de alívio, e já que estava ali mesmo, foi até o lavatório e jogou um pouco de água no rosto. Quando saiu do banheiro, a funcionária avisou que seu lanche já estava pronto. Ele pediu para o lanche ser embalado para a viagem. Sua vida estava começando a ficar complicada. Enquanto ela colocava o lanche em uma sacola, ele foi até o senhor para lhe pagar, o velho o olhou desconfiado, mas não disse nada. Luciel pegou sua sacola e saiu.

     Depois de virar a esquina ele foi até uma praça que ficava ali perto, se sentou em um banco de madeira e desembrulhou o lanche, mas seus problemas começaram a lhe perturbar, ele ficou pensando no que havia acontecido no baile com Johnny, no que aconteceu depois com sua mãe, pensando em tudo que viu. Coisas que não deveriam existir. Agora estava sendo procurado pela polícia, sendo acusado de um crime que ele não cometeu, mas quem iria acreditar nas explicações dele? A fome possou mas sua mente inquieta não parava de fazer perguntas: "E agora, o que fazer? ", seus pais estavam mortos, seus avós já haviam falecido, não tinha mais nenhum parente que pudesse lhe ajudar. Uma gota do céu caiu em seu rosto, em seguida outra caiu sobre sua perna, e mais gotas começaram a cair anunciando a chuva. Ele ficou ali debaixo da chuva, precisava daquele banho dos céus. O que fazer? Não podia voltar para a casa da sua mãe, não tinha nenhum amigo, para onde ele poderia ir? "É isso, a casa da minha avó! ". Luciel se levantou do banco em um salto e seguiu em direção a antiga casa de sua avó.

Uma Nova Escuridão - As Crônicas dos GuardiõesOnde histórias criam vida. Descubra agora