CAPÍTULO 25-VÍTOR AJUDA PEDRO

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_Ah, graças a Deus alguém vivo dentro desse apartamento, porque mais um minuto perto desse monte de baixo astral e eu ficaria cheio de urticária no rabo,  podem apostar!_desabafou Casimiro jogando os braços pra cima assim que abriu a porta pra Vítor entrar.

Vítor  não soube o que dizer. Não esperava aquela recepção tão espontânea. Ficou imaginando se a maioria dos  gays não tinha filtro pra falar.

Se, ao ingressar no mundo gay, ele conseguisse soltar a voz, seria muito bom, pois estava cansado de viver medindo as palavras, o que o deixava mudo, na maioria das vezes, em situações como aquela.

 "Em caso de dúvida, não fale nada", era o seu lema. Como aquela era uma situação totalmente nova em sua vida, preferia não se arriscar a dar algum fora.

_Palavras são como pedras, filho: uma vez arremessadas, não tem mais como recuperá-las e aí, de repente, elas acertam em alvos errados._ensinara sua mãe, quando ele ainda era uma criança.

Casimiro pegou uma mochila vermelha e colocou nas costas.

Vítor começara a observar alguns detalhes nos gays, especialmente nos afeminados, como Casimiro: sempre com uma mochila nas costas, naquele estilo colegial...

"Forever Young"...a Síndrome de Peter Pan, lera num artigo, acometia a maioria dos gays afeminados como Casimiro.

_Vou sair e espairecer um pouco. Me substitua, pelo amor de Deus, Vítor!

Ele assentiu.

Casimiro saiu e levou com ele a vida do apartamento, que se tornou silencioso demais.

Pedro não estava à vista e ele ficou inicialmente desconsertado.

Talvez tivesse ouvido ele chegar e se escondera, não estivesse a fim de vê-lo, estava pensando como o dispensaria...mas ficou pensando que se ele o expulsasse, seria melhor do que ir embora sem nem se anunciar.

Examinou o quarto, a cozinha, o banheiro e só foi encontrá-lo numa cadeira na área de serviço.

Camiseta branca, short jeans surrado e confortável, descalço e ele não precisou observar uma segunda vez para adivinhar que a foto que ele segurava era de Beth.

_Oi._arriscou.

Silêncio. Ele não se mexeu e Vítor pensou que talvez ele não tivesse ouvido.

_Eu não sei se você ouviu, Pedro...é que o Casimiro...

_Ouvi sim._ele respondeu ainda sem se mover._Graças a Deus, ele foi embora. Estava intragável se lamentando num monólogo irritante.

Novo silêncio.

_Se você quiser ficar sozinho...quiser que eu vá embora..._arriscou com a voz insegura.

"Droga!", pensou Vítor, "Será que ele está notando que eu estou gaguejando e quase implorando pra ele me aceitar aqui?"

Pedro estendeu a mão direita para trás, ainda sem se virar e ele a segurou, percebendo que era isso o que ele queria.

_Não. Fique, por favor.

Vítor puxou uma cadeira e se sentou ao lado de Pedro.

A vista não era bonita: os fundos de um prédio antigo e com a pintura descascada tomava todo o campo de visão. Deprimente.

_Você sofreu quando o seu cachorro morreu?

_É claro. Ele estava comigo há 8 anos. Eu o adotei num abrigo quando ele ainda estava na mamadeira.

_Achei que o tinha comprado. Era lindo.

_Eu e minha família temos a política de nunca comprar animais, para não incentivar o comércio ilegal. A gente sempre adota em abrigos, ONGs, pegamos na rua ou mesmo adotamos de amigos.

Novo silêncio.

_Não pensa em adotar outra cachorrinha, Pedro? Seria bom! Pra você e pra ela: você tem tanto amor pra dar e esses animais abandonados são tão carentes!

_Não...nunca mais quero sentir essa dor, Vítor. Estou sofrendo mais do que quando soube que minha esposa levaria o meu filho com o atual marido dela para os Estados Unidos. E antes que me julgue um pai ausente e insensível,  confesso que ele é mais apegado a ela do que a mim. Aliás, até hoje não descobri um traço dele que não tenha puxado a minha esposa. O mesmo gênio, as mesmas características...e agora que eu estou na miséria, tive que assinar dando permissão pra ele sair do país, ou ela jurou que pediria pensão. O cara é rico,  eles se amam e o meu filho já demonstrou diversas vezes que prefere mais o papai rico e machão do que o papai pobre e veado.

Vítor se assustou:

_O seu filho sabe que você gosta de rapazes?_não conseguiu conter a pergunta.

_Vítor, quando a minha ex-mulher morrer, o Diabo perderá o lugar, pode apostar. Acredita que me vendo na merda do jeito que eu estou, Vítor, ela aproveitou pra fazer tudo pelas minhas costas? Retirou o passaporte do menino, fez a minha caveira, inventava que ele não podia vir me visitar, porque estava com alergia de pelo de cachorro, acredita? Descobri que ela falou com ele  que se ele preferisse morar comigo, teria que tolerar ver dois homens se beijando o tempo todo e, como se não bastasse, compactuou com minha mãe que era melhor o menino ser educado  fora do país do que aqui. Não me assustaria se descobrisse que foi minha mãe quem deu a ideia da chantagem: ser preso por não pagar pensão ou assinar para o meu filho sair do país. Pra falar a verdade...ela nunca vai me perdoar por trocá-la por um homem. Acredita que tem dias que ele foi embora e não me deu nem um telefonema?_desabafou tudo, quase perdendo o fôlego.

_Eu sinto muito.

_Eu também. Não quero, apesar de tudo, perder o contato com ele...ele é o meu filho, porra!_desabafou.

Pedro abraçou o quadro com mais força.

_Isso é o que dá perder minha filha...minha companhia...meu anjo da guarda. Agora estou sem filho...sem filha...

Pedro começou a chorar baixinho com a cabeça encostada no ombro de Vítor, que ficou sem ação...desejando afagar os seus cabelos, mas ao mesmo tempo imaginando como ele encararia aquele gesto. Para todos os efeitos, ele ainda era um homem casado e hétero!

Reprimiu o desejo daquela intimidade.

O telefone tocou várias vezes. Ele não atendeu. Tocou novamente. Ele novamente não atendeu.

_Tem alguma ideia do que eu possa fazer pra mostrar pro Otávio que nosso relacionamento acabou? Já falei com ele que irei pagar tudo que eu devo pra ele,  um dia, apesar dele dizer que não vai aceitar que eu pague. Juro não estar dando esperanças de reatarmos o namoro, mas ele não desgruda, cara, que saco!

Vítor achou que não era o momento adequado para desmascarar o ex-namorado de Pedro e se manteve em silêncio.

_Tá vendo? Isso é o que eu gosto na sua companhia. Você me escuta e não se obriga a ficar comentando, dando palpite, aconselhando o tempo todo...como minha mãe, o Casimiro e o Otávio fazem. Querem mandar na minha vida! Tomar no cu, viu?!

Vítor ficou feliz por Pedro agir tão espontaneamente na frente dele...desabafar tantas coisas...e continuar com a cabeça apoiada em seu ombro esquerdo e ainda segurando a sua mão.

Torceu para Pedro não notar como aqueles gestos tão simples o estavam deixando excitado.

"Seu insensível", se recriminou. "O cara tá na maior depressão, no maior baixo-astral e você pensando em putaria."

Novamente, Pedro ficou em silêncio, apenas soluçando, de vez em quando.

Vítor teve que admitir que estava torcendo para que Casimiro não voltasse tão cedo, para que ele pudesse ser o apoio daquele carinha gostoso por mais tempo.

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VOCÊ VEM?-Armando Scoth Lee (Revisado em 2020)Onde histórias criam vida. Descubra agora