Capítulo 3 - Fausto

49 5 15
                                    


Staufen, Alemanha, 1528

Já se havia perdido três milhões de europeus. A grande praga inglesa, a doença do suor, já se alastrava há anos por todo o continente e em meio aos festejos de Páscoa, milhares de alemães morriam, definhando em seus leitos suados. Muitas vezes, o fim de suas vidas se dava em questão de horas.

Altruísta, o velho médico, doutor Johann Fausto perdia sua crespa cabeleira branca preocupado com a saúde de seus pacientes. Observando a jovem ensopada de suor, num leito isolado por um véu quase transparente, ele conversa com seu jovem assistente.

— Dê-me a máscara, Wagner. — pediu o velho e assim o mais moço o fez. — Não posso correr o risco de me tornar mais um moribundo.

Usando uma túnica negra, bem como suas luvas e sapatos, vestiu a máscara branca de bico de pássaro cobrindo até mesmo sua volumosa barba alva. A sua respiração, era abafada pela máscara e o último detalhe foi acrescentado pelo próprio: uma cartola na cabeça, para vedar por completo, o corpo de qualquer que fosse aquele vetor, já considerado como a nova Peste Negra.

— Doutor, acha que a nova fórmula vai curar a esta paciente? — indagou o jovem, coçando sua barba bem feita no rosto liso. — Talvez esta seja a sétima morte em seu albergue só esta semana.

O mascarado pegou o frasco com um líquido avermelhado em cima da mesa de operações e, ignorando a pressão do rapaz, disse:

— A Igreja sempre dando um jeito de maquiar os maus tempos. — Balançou a cabeça negando, ao ver uma procissão passar pela janela aberta, destoando do ambiente pouco arejado. — Uma lástima.

Logo, um furor subiu aos olhos do jovem.

— Doutor! — esbravejou, segurando os ombros do médico. — Esta mulher veio arrastada pela filha de oito anos!

As mãos enluvadas do velho foram de encontro com o peito de seu assistente, o afastando de modo agressivo.

— É! — concordou, enfurecido e tendo seu grito abafado pelo bico de pássaro. — E ela está ardendo! A fase do frio já passou e agora o leito está alagado de suor! Se não reidratarmos, a garota será órfã dentro de algumas horas!

Os berros do velho nervoso continuaram, porém quase inaudíveis.

— Eu parei de escutar em "algumas horas", doutor! — alertou o rapaz. — Parece que o bico lhe está fazendo falar na língua dos pássaros.

Impaciente, o médico suspirou e, de cabeça baixa, esfregou a testa. Sem esperar, viu os braços que quase o agrediram, envolvê-lo num terno abraço.

— Não precisa se martirizar mais, doutor. — consolou, o assistente. — Sei que o senhor está a um passo da cura.

Fascinado pelo fenômeno da vida, Johann via todos aqueles que faziam uso de seu soro, morrerem alguns minutos depois do normal dos que aquela doença acometia. Já estava desesperado tentando achar uma solução para aquela interminável incógnita.

— É o que veremos agora — rebateu, indo em direção ao leito isolado.

Wagner observou seu mentor tirando o véu de cima da cama e parar, olhando aquela mulher envolta em panos molhados, que confundiam a água com o suor que saía dos poros quase formando correntes de tão continuamente.

— Doutor Fausto — cumprimentou a mulher com a voz fraca —, onde está Lisa? — tossiu, levando o punho a cobrir a boca. — Estou tão cansada.

Os olhos castanhos batiam as pestanas devagar, quando o seu queixo fino foi segurado pela mão do homem, que chacoalhou seu rosto. Já trajado adequadamente, o assistente adentrou.

WSU's Aradia - Sangue de VilãoOnde histórias criam vida. Descubra agora