Graziela
O dia amanheceu como um reflexo de minha alma.
Hoje irei me despedir da minha avó.
Mesmo sem energia nenhuma, eu estava há alguns minutos em frente à janela do meu apartamento. E nem um filete de sol se via bater no asfalto. O dia estava escuro e cinzento.
Pela primeira vez não me importava com maquiagem e nem com a roupa que eu iria vestir no dia.
Coloquei uma calça jeans escura, e um caso preto.
E segui para o cemitério.
Quando cheguei somente a minha mãe estava dentro da capela ao lado do corpo da Dona Eleonora.
Respirei fundo e me aproximei.
― Olá Dona Pilar.
― Oi filha... ― minha mãe estendeu a mão ― Olhe a vovó nos deixou. Porque eu não estava lá?
― Foi um infarto mãe. Fulminante. Não foi sua culpa.
Minha mãe era a fiel escudeira da vovó. Todos os dias religiosamente ela passava na casa da Dona Eleonora.
― Me perdoa mãe.
Minha mãe abaixou e beijou a testa da vovó.
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Acredito que um velório não seria um bom lugar para um reencontro.
Mais quando minha irmã entrou na capela onde nossa avó estava sendo velada ― tentando desviar-se do assédio da imprensa ― meus olhos não focaram nela e sim na equipe que a acompanhava.
Ao lado de Barbara estava sua assessora, um segurança e Rafael.
Sim! Aquele Rafael que dançou salsa uma noite inteira comigo estava ao lado de minha irmã. E eu só penso: Como assim?
Atrás de meus óculos escuros, tinham um par de olhos vermelhos e exaustos de chorar que piscavam insistentemente para crer no que eles viam.
Levantei-me da cadeira ao lado de minha mãe e caminhei em direção a Bárbara.
Ela tentava chegar até o caixão onde o corpo de nossa avó repousava, mas ela estava presa aos abraços de nossos familiares que lhe prestavam longas condolências.
― Minha irmã!
Nossas mãos se encontram e eu puxei seu corpo para próximo do meu.
Abraçamos-nos e a levei para a última despedida de nossa avó.
Seu dedo indicador tocou levemente pelas sardas das bochechas de vovó Eleonora.― Um pedaço de nós se foi... ― Barbara sussurrou em meio as suas lágrimas.
― Um grande pedaço. ― respondi.
― Nossa base. ― completou nossa prima Nádia.
Enquanto Barbara e Nádia se abraçaram, uma voz tocou minha nuca.
― Meus sentimentos.
Virei-me e lá estava ele segurando minha mão. Rafael estava sem o seu chapéu de aba curta na cabeça, mas eu tenho certeza que é ele.
― Este é Rafael, meu novo produtor e amigo. Rafael essa é minha irmã caçula. ― Barbara suspirou ― Queria ter apresentado vocês em outra ocasião...
Logo Barbara avistou nossas tias e Roberta ― que estava inerte na cadeira ― e foi ao encontro delas me deixando ali sendo amparada pelo aperto de mão de Rafael.
― Você está bem? Está precisando de alguma coisa?
― Obrigada...
Soltei suas mãos e me afastei do caixão de minha avó.
Caminhei pelo longo corredor de capelas e encontrei uma janela que me dava à vista ― não muito agradável ― para ampla das inúmeras lápides do cemitério.
― Você esta bem?
Rafael me seguiu.
― Você realmente não esta me reconhecendo...
Tirei o enorme óculos escuros que encobria meu rosto abatido e o encarei.
Rafael franziu a testa e buscou em minha face algum traço guardado em sua memória.
― Não...
Passei a mão na nuca lembrando qual foi a ultima vez que não fui reconhecida por alguém.
― Los Tacos... Grazi.
Seu olhar acendeu-se e Rafael me abraçou como se eu fosse uma velha conhecida.
― Claro! Grazi! Dançamos a noite toda! Que besta sou eu... Como não lembrar?
― É que naquela noite eu estava bem maquiada e...
― Imagine, eu que sou um péssimo fisionomista. Desculpe-me.
Balanço a cabeça em sinal que ele esqueça isso essas formalidades.
― Eu sinto muito por sua avó e por tudo isso...
― Eu também sinto. ― um bolo volta a se formar na minha garganta e antes que as lágrimas retornem eu respiro fundo e retorno com o óculos escuros para o rosto.
― Como Bárbara falou repito, é uma pena ter reencontrado você nesta ocasião.
― Que coincidência vocês trabalhando juntos.
― É eu fui indicado pela gravadora para dar uma repaginada no estilo da sua irmã. Espero que dê certo.
― Bem, pelo que conversamos ela está muito empolgada com o novo álbum.
― Que bom. ― Rafael retorna a segurar minha mão ― Então está pronta para retornar? Pelo horário já será o sepultamento.
― Tenho que está.
― Estarei ao seu lado.
Suas palavras me causam estranheza, porém são firmes e acolhedoras.
― Obrigada.
Caminhamos lado a lado em silêncio e quando entro na capela todos estão de pé e fazem uma oração ao redor do caixão de minha avó.
Sigo pedindo licença aos presentes e me posiciono ao lado de minha mãe e minha irmã.
Tudo parecia estar meio em câmera lenta. Eu não sentia meu corpo, nem ouvia nada ao meu redor. Meu foco estava no rosto sereno de minha doce avó.
― Alguém quer falar algumas palavras?
O padre olhou para todos os familiares que estavam em volta do caixão e só uma pessoa teve forças para responder.
― Acho que todos aqui me conhecem. Eu me chamo Margot e sou a filha primogênita da Dona Eleonora. Mamãe sempre foi essa mulher que todos conheceram aquela mulher elegante, que era o sinônimo de alegria e doçura. E aquela fortaleza sempre foi um exemplo de fortaleza para essa família de mulheres. Então mamãe descanse em paz.
Após Tia Margot finalizar suas palavras com uma seriedade que eu por um segundo invejei, ela sinalizou positivamente com a cabeça, e foi então que os funcionários aproximaram-se e fecharam o caixão da minha avó.
Meu corpo bambeou e uma mão me amparou pela cintura.
Novamente Rafael.
Ele era o desconhecido mais solicito deste ambiente.
Como caixão fechado, seguimos em um cortejo, caminhando até o local do sepultamento.
Minhas lágrimas não pararam de rolar, os gritos de Roberta me angustiavam, assim como o desmaio de minha mãe, eu não suportava tamanha dor, eu não conseguia consolar ninguém, eu mal conseguia me sustentar em pé e foi por isso que eu lancei uma rosa na cova onde o caixão de minha avó foi depositado e virei às costas.
Não tinha mais nada que eu pudesse fazer por Dona Eleonora ali.
Era o fim.
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Entre Risos e Lágrimas(EM PAUSA)
Romance(Série - Encontros) Graziela Mascarenhas tinha tudo que qualquer mulher na idade dela poderia sonhar uma carreira bem sucedida e estabilizada. Para tudo ser realmente perfeito só faltava o cara certo. Os trinta anos chegaram e ela não conseguia se...