Capítulo XXXI

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Já faziam duas semanas.

Me virei bem. Talvez eu devesse me estabelecer aqui.

Depois do dia da minha fuga, quando decidi ir para o Leste, andei mais. Mas não o suficiente para chegar até lá. Achei uma caverna, um lago. Um bom lugar. Não tinha cabeça para continuar, não queria mais tanto assim descobrir o que havia no Leste. Eu não queria mais nada. Perdi todas as minhas vontades. Achei que superaria o que aconteceu bem, mas...

A comida que Bill mandara durou seis dias. Bem racionada. E depois disso cacei, pesquei, sobrevivi. E não fiz mais nada.

Mas encontrei alguma paz em brincar em um balanço improvisado que havia montado com a rede de corda, quando não a usava para armadilhas.

E contei cada dia na parede de pedra da caverna, riscando com alguma outra pedra.

Me levantei e fiz minha rotina de sempre. Guardei a manta na mochila, comi frutas que achei pela floresta, saí e tomei um banho no lago. Poucos foram os dias que nevou, mas por sorte não congeara as águas.

Depois de vestir a roupa peguei a espada colocando no suporte atrás das costas e a adaga entre o tornozelo e a bota. Joguei os cabelos molhados para trás e comecei a seguir o caminho de dez minutos de volta.

Estava perto da entrada quando ouvi.

Passos. Passos calculados, humanos.

Meu corpo enrijeceu imediatamente, e prendi a respiração enquanto subia em uma árvore próxima, tão silenciosa, tensa e em alerta quanto um felino. Do alto consegui ver a entrada da caverna, e entre as árvores, um homem observava atentamente o lugar. Meu sangue gelou enquanto me abaixei, com cuidado, entre os galhos, para ficar completamente camuflada daquele ângulo. Eu nunca o vira antes. Tinha os cabelos castanhos lisos repartidos ao meio. Bigode e barba do mesmo tom das mechas. Suas roupas eram marrons. Roupas neutras, nenhum território denunciado.

Ele ficou mais alguns segundos parado enquanto eu não ousava, sequer, respirar profundamente. O homem então saiu de detrás das árvores, uma das mãos apoiadas no cabo da espada empunhada. Fiquei completamente imóvel enquanto o observava caminhar lenta e cautelosamente, para a entrada da caverna. Esperei no completo silêncio, a adrenalina correndo nas veias enquanto ele se aproximava, mais e mais.

E então, um barulho alto soou quando os galhos das árvores se agitaram, derrubando o tronco e fazendo a rede que o homem pisara subir, levando ele junto. Pulei depressa dos galhos da árvore em que estava, esfolando o braço no caminho. O homem grunhiu e sacou a espada para cortar as cordas, mas quando entrei em seu campo de visão ele hesitou, me dando tempo de apontar a espada rente ao seu peito. Ele olhou para mim por entre o bolsão de corda em que agora estava enjaulado.

E ali, eu cumpri a mim mesma o que eu me prometera: Eu não seria fraca novamente.

— Quem é você? — Faziam duas semanas que eu não dizia uma palavra em voz alta, e por um momento tive de experimentar a sensação de ouvi-la, me ouvir, por um momento. O homem me ainda me encarava, quase estupefato. — Quem é você? — Repeti com o tom mais carregado.

— Kion. — Respondeu ele com a voz fraca. Eu conhecia aquele nome, e levei menos de dez segundos para me lembrar que o garoto do Norte me confidenciara aquela informação, no dia em que estava na colina com Rhys.

— Mensageiro dos Legionários do Norte... — Sibilei e Kion grunhiu.

— Parece que aqueles idiotas se esqueceram de usar "Manson" quando fossem abrir a boca por aí. — Sorri sarcástica não revelando minha real fonte.

— Jogue a espada no chão. — Ordenei. Kion hesitou apenas até o momento em que subi minha lâmina ao seu pescoço, então sibilou e deixou que a arma caísse por entre as cordas. — Faça o mesmo com a adaga em sua cintura e na perna.

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