pt.2

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   Talvez na ponta dos pés consegui-se chegar-lhe. Empoleira-se nos dedos e peito dos pés e estica um pouco mais o braço; a ponta do dedo do meio toca a fria maçaneta presa na porta, tentando puxá-la, mas a maldita não se movia. Estava trancada.
    Mais uma olhadela por cima do ombro, para a imensidão escura no fundo do corredor, onde a unica luz existente era a do televisor e o unico barulho que se ouvia era aquela massadora estática juntamente com os gritos e choros insistentes da mãe. Felizmente as esferas brilhantes não estavam mais lá; no entanto, uma grande sombra formava-se debaixo da cama e quase cobria a única luz presente naquela estupida velha casa.
    Titto via-se aflito e batia com toda a sua força na porta de madeira de carvalho à sua frente, sem desviar o olhar da sombra negra que estava cada vez mais perto, e mais perto, e mais perto. A sua fonte de luz estava quase toda coberta pela névoa que o perseguia.
    A sua pequena mão de punho fechado batia incessantemente na porta.
    - Papá! - A porta abre repentinamente fazendo-o saltar e deixar cair Cornie. A silhueta do homem gordo a quem ele chamava pai aparecia, com a mesma roupa de todos os dias - uma blusa interior que supostamente já fora branca, suja de nódoas de comida e suor, e umas cuecas de à três dias com as mesmas nódoas que a blusa.
    O homem de cabelo grisalho - os que lhe restavam - e a barba áspera por fazer, olhava a criança diretamente nos olhos como se lhe fosse devorar a alma em menos de três segundos. Titto já com lágrimas nos olhos, apanha o companheiro do chão e aperta-o contra o peito.
    A boca roxa do pai abre como se fosse dizer algo interessante - mas isso nunca acontecia -, os dentes amarelos e alguns já podres, e o hálito...oh! Aquele horrivel bafo a álcool e...um aroma diferente.
    Seria...tabaco?
    As palavras que sairam daquela boca nojenta e que já começava a dar vómitos, não eram, nem de perto, tranquilizantes.
    - Pelo amor de Deus, Theodoro, são duas da manhã! O que é que tu queres?!
    Titto odeiava quando o pai errava o seu nome, mas não estava com disposição para discutir sobre esse assunto no momento. Os seus olhos desviaram-se da figura masculina e o seu braço, esticado, apontava agora para o quarto de onde ele viera. As esferas, a sombra, tudo tinha desaparecido, mas Titto não mostrava desistência e manteve a coragem de proteger a sua propria segurança.
    - Há um monstro de baixo da minha...
    - Não vejo nada. - As respostas do pai para ele eram sempre rudes, rápidas e secas e só o tom da sua voz fazia o menino estremecer de dentro pra fora.

O Monstro debaixo da minha camaOnde histórias criam vida. Descubra agora