07. riptide

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harry

a minha esposa estava relativamente mais feliz que eu. não era a favor do casamento arranjado, mas gostava das regalias do palácio, e eu não poderia a julgar por isso.

não é um pensamento umbiguista se mais da metade das pessoas existentes tomassem a mesma decisão.

ela de fato era linda. as criadas a olhavam com afeto, como se olha para para uma futura princesa, e isso ao menos me fazia bem, elas não esperavam nada em troca.

como um pedaço do manjar e observo sua feição. enquanto come, enquanto agradece, enquanto sorri.

não é estranho como uma obra de arte é apreciada como se fosse um dever? você nem mesmo precisa gostar dela. ou a achar interessante. contanto que a aprecie, quem sabe até o pintor venha lhe agradecer.

e rose era uma obra de arte. então eu sentia muito vontade de olhá-la, mas não sei sobre a parte dos sentimentos. algo me impedia disso nesse momento.

- o castelo vai bem, sr styles?

agradeço a ela por querer manter uma conversa normal, e não acerca do nosso casamento.

- sim, sr goldberg. a administração continua perfeita, meus pais sabem bem o que fazem.

- e logo você será responsável por tudo.

o único barulho é de sua taça tocando a mesa e do meu suspiro meio pesado saindo brevemente pela boca e nariz.

- sim, e a resposta ainda será a mesma.

confio, com um sorriso.

rose assente e continua a comer, igual eu faço, agora com as criadas falando sobre o que ela gostaria de ter em seu banquete do casamento.

gostaria que angel aparecesse para deixar isso menos realista do que está sendo, e qualquer átomo da existência faria isso.

•••

angel

a agulha me picou mais uma vez, e mais uma, e mais uma. parei de reclamar lá pela décima vez, que manchasse de sangue o vestido tão liso que escorria, para minha noite de núpcias.

já não aguentava ficar em cima daquele degrau, olhando minha feição triste no espelho, enquanto a costureira e minha mãe puxavam mais o tecido contra minha pele, tentando o deixar mais apertado ainda.

havia algumas pessoas em casa, trocando móveis e essas coisas, mamãe já estava usufruindo do valor dado em recebimento da minha mão. ou do meu corpo.

- vamos, angel, respire mais fundo.

o faço, a costureira puxa mais e costura.

tenho que esperar que ela vá embora antes de conseguir comer, ou correria o risco de rasgar toda a roupa.

- vá com calma, mocinha, precisa estar intacta para o grande dia.

"grande dia" pra quem? penso.

mamãe me faz cuspir o resto do bolo que ainda mastigo, e isso me deixa cheia de raiva, mas não digo nada, apenas saio do jeito que estou, de roupa de baixo, direto para a porta dos fundos.

corro muito para que ela não possa me ver.

só paro quando chego a cachoeira do bosque, que fica nos limites do castelo, e não me importo de estar indo contras as regras. se me levassem para o palácio, a fim de eu pagar minha pena, seria harry quem me receberia, e isso já compensaria.

ainda tenho fome. e calor. correr, mesmo com pouca roupa, não era uma boa ideia logo nos primeiros dias do verão.

olho para todos os lados, e retiro rapidamente a roupa antes de entrar como um peixe na parte baixa da cachoeira.

a água gelada me dá um choque, mas é tão refrescante. por um momento meu coração está tão gelado quanto a água, eu não queria ter que passar por tudo isso, tradições não deveriam te fazer querer morrer.

- guardas?

a voz forte é seguida de uma risada, mas me assusta, e eu quase saio correndo, antes de me lembrar que essa era a pior das escapatórias.

- não faça isso.

era harry. não sei se fico aliviada ou tensa, porque a cara dele é fechada.

- oi. - me limito a dizer.

- sabe que não pode estar aqui, né?

o encaro por um tempo, a água de repente parece congelante.

não pensei que ele se apaixonaria tão rápido por sua esposa que me trataria como qualquer uma. se eu não tivesse ninguém agora, poderia entrar no castelo e fazer alguma besteira a mais, mamãe não poderia intervir numa vontade do rei.

- eu sei. pode pegar minha roupa?

começo a respirar fundo, eu provavelmente choraria se não saísse logo dali. meu ponto fraco era ficar vulnerável em situações que eu não escolhia e lidar com isso era insuportável.

- não posso. se você for embora, eu vou ter que nadar sozinho?

sorrio amarelo.

harry tira sua roupa muito rápido e pula na água.

- como ele é?

- velho. como ela é?

- nova. - harry ri, pela primeira vez no dia eu também.

- pelo menos vocês irão morar no castelo, é sua casa de sempre. e eu vou ter que me mudar.

harry não sabia disso, foi a vez dele de ter uma faceta triste.

- seria legal se tivéssemos nos conhecido mais cedo.

- seria legal se tivéssemos nos conhecido melhor.

- como assim?

minhas terminações nervosas já estavam mais calmas, mas entram em curto circuito quando o cabelo cacheado está entre meus dedos, e a boca dele em contato com a minha.

eu não sabia o que fazer além do que ouvia as meninas mais velhas falarem.

minha mão que ficou em seu ombro passou com tanta calma na pele dele. uma mão estava em meu rosto e a outra circulando minha cintura por trás.

beijei harry como se ele fosse meu marido, o beijei como se soubesse o que estava fazendo.

e por Deus, eu o beijaria mesmo que minha sentença fosse morrer no calabouço do castelo.

•••

nem demorei tanto né?

boa semana para vocês ❤️

angel ۩ hes {concluído}Onde histórias criam vida. Descubra agora