O Passado que Todos Temem

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     Jason saiu de Kurosawa a meia noite. Ele estava levando consigo duas katanas, a que Calebe fez pra ele e mais uma que já tinha; um cantil de água que pretendia abastecer no riacho que tinha pelo caminho; alguns sanduiches e frutas; e uma adaga de prata para controlar sua transformação, caso precise. Ele foi andando para que seu cavalo estivesse à disposição do exército samurai.

Às vésperas de seu aniversário, Jason caminha para uma missão que pode mudar o rumo de uma possível guerra. Ele só pensava em Kanna e Calebe. O quanto ele queria honrar a memória de seu amigo e fazer sua garota feliz. Ele repetia sem parar: Eu não posso morrer agora. Jason conhecia os riscos da missão, principalmente tendo em vista que os ninjas sabiam quem ele era. Depois de mais de uma hora caminhando, ele nota algo estranho ao longe.

Jason começa a fazer um leve desvio para contornar o que estava vendo de cima de uma colina ali perto. Ele viu que tinha uma fogueira no meio de um acampamento e quando olhou mais atentamente, viu que eram os ninjas que atacaram a vila. Sua raiva começou a dar as caras. Jason perdera aquele semblante calmo que tinha desde que saiu de Kurosawa. Ao perceber que sua transformação tinha se iniciado, Jason correu para uma caverna pra não estragar tudo. O ódio somado com a influência da lua podiam botar tudo a perder naquele momento.

O samurai começa a se contorcer no interior da caverna. As memórias da perda de seu amigo começaram a passar de forma enlouquecedora na sua cabeça. Quando viu que o lado lobo venceria, Jason se encosta na parede e puxa a adaga de prata. Para impedir sua transformação, ele fincou a lamina em sua perna. Aos poucos ele voltou ao normal, mas tinha uma desvantagem. Prata em contato direto com seu corpo drenava sua energia, ou seja, Jason ficou cansado e sonolento em poucos minutos. Pra que sua regeneração de lobisomem funcionasse ele precisaria tirar a adaga de sua perna antes que a lua sumisse. Infelizmente, Jason já não tinha mais forças para tirar a adaga e acabou adormecendo.

O tempo não está a favor do jovem samurai. Quando adormeceu já passava das duas da manhã. Jason tinha pouco menos de quatro horas pra acordar, mas a adaga o drenava seu vigor. Ele não conseguiria acordar sozinho e se ficasse em contato tão direto com a prata por mais de quatro horas, ele estaria correndo risco de vida.

***

Depois da partida de Jason, Kanna vai até a porta quarto do seu mestre. Devido a hora, ela preferiu deixar a conversa pra manhã seguinte. Kanna então se dirigiu ao próprio quarto e se preparou pra dormir, mas antes de se deitar ela vê a pequena flor que matinha em sua estante. Por motivos desconhecidos, a flor não murchava e nem perdia seu perfume. Não era falsa, nem tinha isolamento e era similar a uma flor de cerejeira. A flor tinha sido dada por seu pai no dia em que ele partiu. Kanna começou a lembrar de sua infância e pensava em como as coisas mudaram depois da morte de seu pai.

***

9 ANOS ATRÁS

-Pra onde você vai, pai? – Perguntou a pequena Kanna

-Eu vou atrás de um amigo meu. – Respondeu Kevin, pai de Kanna – Deixarei você com o Tio Mifune por alguns dias.

-Por que eu não posso ir com você?

-Porque é muito perigoso. Sei que você é valente, mas ainda tem que treinar muito pra ir numa missão assim. Eu vou de avião até a América e volto com meu amigo. Jason e Calebe irão cuidar de você.

-Pode deixar, tio Kevin. Nenhum malfeitor irá se aproximar de Kanna no nosso turno. – Disse Calebe enquanto Jason batia continência.

-Tenho certeza que irão cumprir com a palavra. Aqui, tome isso! – Kevin estendeu uma pequena flor pra sua filha. – Guarde essa flor até eu voltar. Não se afaste dela nem por um minuto.

-Entendido pai. – Kanna abraça seu pai com força – Volta logo.

Antes de sair, Kevin tem uma conversa com Mifune.

-Por que disse que ia viajar de avião? – Perguntou Mifune

-Pra caso eu não volte. Assim facilita pra você simplesmente dizer que o avião caiu.

-Você tem certeza que vai atrás dele?

-Ouvi muito sobre caçada aos lobisomens nos últimos dois meses. Tem três meses que ele não manda nenhuma carta. Que tipo de amigo seria eu se não fosse lá pra salva-lo?

-Do tipo que ama a filha.

-Sabe, Mestre Mifune? Esses dias durante uma brincadeira com os garotos, Kanna disse que seu pai jamais abandonaria um amigo. Ela disse isso com tanto orgulho de mim. Se eu não for atrás do Ben, não serei mais o homem honrado que minha filha vê em mim.

-E aquela flor?

-É exatamente o que você está pensando. Eu não sei ainda se realmente funciona, mas se funcionar eu prefiro que minha filha esteja com ela.

-Como espera achar o Benjamim?

-Não sei, mas eu tenho que tentar. – Kevin tira um pergaminho do bolso – Entregue para Kanna, caso eu não volte. Não diga pra ela nada sobre o Ben ou Jason. Ela ainda é muito nova.

-Entendo. Quando encontrar seu amigo, diga que ele tem que passar a escrever pro filho dele. Traga-o vivo.

-Pode deixar, Mestre.

Kevin sabia que provavelmente seria uma viagem só de ida, mas ele estava disposto a salvar seu amigo até se isso custasse a própria vida.

Duas semanas depois, um homem ferido aparece na porta do templo sendo carregado por soldados samurais. Esse homem trazia a triste noticia da morte de Ben e Kevin. Infelizmente, Mifune não pôde fazer um funeral pra eles, pois a causa da morte tinha que ser mantida em segredo. Kanna recebeu a noticia da queda do avião e Jason não chegou a receber uma explicação pra morte de seu pai.

Jason superou com o tempo, embora tenha tido sua fase rebelde na adolescência devido ao pai ausente. Já Kanna não foi bem assim. Ela se fechou com todos e mudou radicalmente sua personalidade. Passou a ser grosseira e fria. Na adolescência já não acreditava mais na história do avião que caiu, mas Mifune não podia contar que seu pai morrera pelas garras de um lobisomem.

***

Kanna começa a olhar para o pergaminho que Mifune a entregou depois da morte de seu pai. Ela nunca teve a coragem de abrir e ver o que tinha escrito, pois tinha medo do que pudesse estar lá. Naquele momento, nada mais importava. Kanna abre o pergaminho com a mensagem de seu pai:

"Kanna, se está lendo isso é porque eu não voltei. Desculpe te deixar dessa forma. Quero que saiba que você sempre me inspirou a ser uma pessoa melhor. Não poderia ser o herói da minha filha se não consigo salvar meu melhor amigo. Eu fui atrás do pai do Jason para impedir que homens maus chegassem até ele. Você pode ficar com aquela katana vermelha que tanto gostou, é só pedir pro tio Mifune pegar pra você. Esse é meu presente pra minha amada filha. E já que estamos falando de presentes... aquela flor não foi um presente meu, foi da sua mãe. Ela andava sempre com essa flor e pediu para que eu aguardasse pra você. Me perdoe por não estar presente na sua festa de 15 anos. Tenho certeza que me daria muito orgulho. Você é forte, minha querida. Vai conseguir se virar sem mim. Não se esqueça de respeitar o mestre Mifune e de sempre manter seus amigos por perto pra eles não se meterem em encrencas. Eu te amo, minha pequena flor de cerejeira."

Kanna chorava ao ler a mensagem de seu falecido pai. Todo orgulho e revolta foi embora em um minuto. Ela foi até Mifune assim que o sol nasceu para conversar

-Mestre. – Chamou Kanna

-Fale rápido, jovem Kanna. Temos um exército pra organizar.

-Eu gostaria que você pegasse aquela katana vermelha, que era do meu pai, pra mim.

-Então você finalmente leu a carta – Mifune ficou feliz, mas sabia que essa felicidade duraria pouco.

***

       Já se passaram duas horas e Jason nem sequer dá sinal de que vai acordar. O tempo não passava em seu favor. Jason poderia morrer naquela caverna e ninguém poderia o ajudar alí.  

Os Guerreiros da LuaOnde histórias criam vida. Descubra agora