Capítulo Sete: Não se Quebram Promessas

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EMERA CORREU PARA os meus braços em busca de proteção. Um borrão de vestido lilás de musselina e cachos escuros abundantes. Eu a peguei no colo por reflexo, já sabia que havia se metido em problemas pelos berros de Dessah, que provinham da cozinha. Olhei a menina com desconfiança.

— O que você fez dessa vez? Ela parece realmente zangada.

Emera escondeu o rosto mimoso no meu pescoço e apertou os braços ao redor de mim. Com três anos, já era razão suficiente para que minha senhora adquirisse cabelos grisalhos prematuramente.

Meu senhor tinha o péssimo hábito de ser o mais tolerante com a menina, mas confesso que era difícil resistir ao apelo de inocência nos seus grandes olhos castanhos e no bico manhoso dos seus lábios delicados. Bem, quase todos resistiam. Dessah não era uma que se deixava enganar tão facilmente. A prova disso foi sair da cozinha com uma expressão vermelha de raiva e as mãos apoiadas nos quadris roliços.

— Ah, mas é claro que ela buscou proteção contigo, Nysa! Depois de arruinar meu ensopado seria melhor que ela convocasse todo o exército astheriano para se proteger! — bradou ao praticamente marchar para cima de nós duas.

Entre risos perguntei o que estava havendo ali e Dessah bateu o pé. Ela estava realmente irada.

— Emera jogou terra no meu ensopado! Depois de todas as minhas advertências para se manter longe do meu fogão, das minhas panelas e da minha cozinha!

— Era um ensopado de peixe? Sabe que Emera os detesta — murmurei e acabei piorando a situação, pois Dessah grunhiu antes de marchar de volta para a cozinha.

A menina desenterrou o rosto do meu pescoço e olhou ao redor com desconfiança, avaliando se o pior já havia passado para só então se afastar do meu corpo.

— Ela já foi — sussurrei, arrancando um riso gostoso dela. Balancei-a para cima e para baixo, numa brincadeira só nossa. — Mas o que fez foi errado, mocinha. Por mais que os ensopados de peixe da Dessah mereçam um punhado de terra.

Emera tapou os lábios com as mãozinhas para não gargalhar alto, abafando o próprio riso. Cutuquei a ponta adorável do seu narizinho, fazendo-a rir de novo.

— Falo sério. Não chegue perto daquele fogão ou daquelas panelas de novo ou não te protegerei da próxima vez. Temos um acordo? O que me diz?

Emera assentiu repetida e enfaticamente com a cabeça, porém o brilho nos seus olhos indicava o oposto. Ela definitivamente daria muitos cabelos grisalhos à minha senhora antes de atingir a maturidade.

Meu senhor e senhora surgiram a seguir. Ela tomou a menina de meus braços depois que lhe contei o que havia aprontado e seu tom de censura fez Emera ressuscitar aquela expressão ardilosamente inocente outra vez. Ah, ela sabia bem o que fazer para desarmar qualquer um.

Gorah se aproximou nesse momento, abordando-me:

— Nysa, venha comigo até o mercado. Fethis está ocupado — solicitou ao passar por mim, vestido com um gibão verde-escuro, uma capa cinza luxuosa pendurada sobre um ombro e com a barba bem feita.

Olhei para a túnica curta, branca e sem mangas de linho com detalhes em renda que usava em conjunto com as calças justas e as botas de couro confortáveis, e julguei-me apropriadamente vestida para uma incursão pela cidade.

— Sim, senhor — aquiesci enquanto o seguia porta afora, acenando para Emera, que agitava a mãozinha, incentivada pela mãe.

Não era sempre que eu saía da mansão e quando o fazia ia acompanhada por Gorah ou Fethis. As visitas ao Grande Mercado de Théocras eram frequentes, entretanto. Embora eu admitisse para mim mesma que sentia falta de minhas escapadas, da época em que era escrava de Kalak, evitava a todo custo aborrecer meu outro senhor cuja bondade e generosidade excediam qualquer expectativa que eu tivera.

Nysa - A Campeã de AstherOnde histórias criam vida. Descubra agora