Certo como o sol surgindo no leste

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"And how you told me after it all. We'd remember tonight, for the rest of our lives" - Birdy, Wings.

Os meses se passaram, mais rápido do que eu conseguia acompanhar. O impacto causado pelos acontecimentos daquela noite na boate foi se abrandando, naturalmente.

Noite sobre a qual nós quatro nunca conversamos o suficiente. Simplesmente ignoramos sutilmente o fato de que o Bernardo espancou uma pessoa por causa do ciúmes. E se ninguém fosse apartá-lo, eu tenho certeza que poderia ter dado em morte. Aí o buraco seria mais em baixo e não haveria papai ou mamãe que pudesse salvá-lo de mofar na cadeia.

Eu acho.

Para compensar todo o ocorrido, decidimos começar a andar na linha. Nos tornamos filhos e alunos exemplares. Bem, eu já era uma filha exemplar e Bernardo sempre tirou ótimas notas, mas elevamos isso a outro nível.

Paramos de sair à noite, bebíamos pouco, e nos reuníamos semanalmente para estudar pro Enem.

Eu decidi que iria cursar psicologia porque não conseguia me enxergar em outro curso e, de todas as opções na área de humanas, era o que mais se parecia com uma profissão.

Cecília optou por veterinária. Nunca conheci uma pessoa que gostasse tanto de animais. Os pais dela não a deixavam ter um cachorro, mas ela passeava pelo calçadão das praias de Vitória só pra fazer carinho nos que brotassem pelo caminho.

Já Bernardo e Caique resolveram cursar direito. Eles nunca admitiram isso abertamente, mas eu sei que escolheram pelo status. Cada célula do corpo deles era preenchida com uma superficialidade e egocentrismo latentes.

O emaranhado de sentimentos que eu nutria por eles me cegava, e eu não me atentava aos "pequenos" sinais. Então, permiti que aquela amizade prosseguisse, mais firme e forte do que nunca. Éramos a gangue perfeita, tanto na farra, quanto nos estudos. E ninguém poderia invadir ou estourar a nossa pequena bolha.

Até fazíamos uma amizade aqui, outra ali, mas nada chegava perto de poder ser comparado ao que nós quatro tínhamos juntos.

Eu costumava chamar isso de força, hoje chamo de dependência.

No fim de semana seguinte ao Enem, nosso colégio resolveu oferecer uma festa à fantasia para os alunos. Uma maneira de comemorar que estávamos, enfim, livres.

Essa festa também marcou o fim das aulas. Depois disso, os alunos do terceiro ano seguiriam o seu caminho separadamente.

Eu sentia aquele aperto no peito porque não estaria mais na mesma sala de aula que eles, todos os dias. E não havia nenhuma garantia de que os quatro conseguiriam uma pontuação boa o suficiente para entrar na universidade federal. Eu não sabia mais como funcionar direito sem eles.

Ignorando os medos que martelavam em minha cabeça, deslizei para dentro do meu vestido amarelo, uma imitação barata do vestido da Bela. Eu iria me divertir de verdade pela primeira vez em muito tempo. Minha vida havia se resumido aos estudos naquele ano, sem falhar um dia sequer. E ao Bernardo, é claro; sempre havia o Bernardo.

Olhando para a minha imagem no espelho, eu me senti linda. Verdadeiramente bonita. Eu teria a oportunidade de ser a princesa que sempre quis, mesmo que fosse só por aquela noite.

Por dentro, eu dançava.

Lancei um largo sorriso para a garota no espelho, me controlando pra não dar pulinhos de felicidade.

Um Dia Meu Príncipe ViráOnde histórias criam vida. Descubra agora