Capítulo 12

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               Ela sentia que todos a evitavam. Não via Miguel há mais de três semanas e passava todo o tempo disponível com Gabriel. Ariel havia ido embora morar com Cassiel e os outros. Não podia passar mais tempo sob o mesmo tempo que Rebeca, dissera na ocasião.

        Até mesmo Nina a evitava quando se encontravam casualmente no corredor. Ela mesma não descia para fazer as refeições desde o acontecido e passava a maior parte do tempo no quarto ou no jardim, fazendo longas e improdutivas caminhadas pela propriedade quando Gabriel não estava vasculhando sua mente. Até as vozes pareciam tê-la abandonado.

         O lago brilhava imponente ao crepúsculo. Devia ter morrido naquele dia, pensou consigo mesma tacando uma pedrinha que resultou em uma única onda que se propagou até desaparecer.

        Sentia falta de Diego e até mesmo de Caio, assim como de seu antigo emprego na biblioteca, entretanto não tinha energia para ir até ele, para recomeçar. Sentia-se no limite de toda a sua capacidade para qualquer coisa. Ela havia conjurado um portal para o inferno e todas aquelas almas quase haviam levado Ariel com elas. O pior é que até aquele momento não sabia o que a fizera parar, como o portal fora fechado. Eles a teriam levado se Miguel e Gabriel não houvessem aparecido.

      Queria que Rafael estivesse ali para dar alguma orientação. Queria ouvir suas palavras que acalentavam mesmo que em seu próprio leito de morte. Queria ter mais tempo para conhece-lo, para ouvir suas mensagens.

- Se alguém estiver me ouvindo – disse contemplando o céu arroxeado – Se existir alguém nesse mundo de anjos que possa me ouvir. Se houver alguém na morada da luz que possa me orientar. Se meu coração e minha alma ainda puderem ser salvos. Por favor. Eu imploro. Não me deixem aqui sozinha.

       Rebeca chorou sem resposta, então o lago pareceu borbulhar e a imagem de um homem se formou entre o vapor que subia. Sim, certamente era um homem, pensou, embora não conseguisse identificar o rosto dele.

- Vá até a casa de máquinas – disse em uma voz próxima demais para ser dele – Tudo vai se resolver, apenas vá... – Sua voz era baixa e hipnótica. A casa de máquinas era um pequeno galpão onde estavam guardados equipamentos para a manutenção da propriedade. 

             Rebeca sentia que suas pernas não eram capazes de obedecê-la. Simplesmente caminhou até lá, passo após passo vacilante e incerto. Abriu a porta insegura e entrou. A porta bateu atrás de si e então havia o fogo, e logo depois a fumaça. Ela estava de volta a si, mas por mais que gritasse e esmurrasse a porta, ela simplesmente não cedia.

              Começou a ficar difícil respirar e não havia nenhuma janela por onde pudesse sair. Estava quente e o fogo consumia rápido toda a madeira, combustível e tudo o que havia no local. Rebeca rasgou um pedaço da roupa e colocou no rosto, tentando respirar um pouco de ar puro pela fresta da porta, sem grande resultado. O fogo logo a alcançaria. Estava exausta, sentia que os sentidos queriam abandona-la.

            Queria ter a oportunidade de se despedir de Miguel, mas não conseguiria mais esperar. Não conseguia manter os olhos abertos por causa da fumaça, seus pulmões ardiam. Estava encolhida em um canto perto da porta ainda lutando para abri-la, mas era inútil. Sabia que iria morrer, ninguém a resgataria.

– Perdão – Disse antes de fechar os olhos.

- Perdão – uma voz falou bem próxima a ela, fazendo com que virasse a cabeça em sua direção – São poucos os que entendem a complexidade dessas palavras.

- Rafael – disse com um sorriso cansado. – Você está mesmo aqui? Como é possível? – Ele cintilava sob a luz da lua e suas asas douradas estavam abertas à suas costas.

A Última Lágrima do AnjoOnde histórias criam vida. Descubra agora