Sandra(1) '89

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Dois anos se passaram depois da "temporada". Sandra já havia se adaptado na nova cidade.
Sua vida se tornara rotineira, e por mais que isso acabasse com ela, estaria disposta a se conformar. De fato não estava feliz, algo faltava e tinha medo de saber o que era.
Levantou cedo numa quarta-feira. A manhã estava ensolarada, ela podia sentir a calmaria. Colocou um vestido de malha florido, que ela particularmente adorava por ele ficar justo e confortável em seu corpo. Sandra gostava daquela sensação, do calor, do suor e do silêncio que no fundo era muito barulhento. Mas precisava de algo a mais, algo que a fizesse sentir viva e que a despertasse um tipo de ansiedade, naquele momento qualquer coisa valeria a pena.
Foi até a cozinha e pegou sua carteira de cigarros, acendeu um e encostou as costas na janela. Seus pensamentos começaram a transbordar como que uma enchente. Ela sabia que estava desesperada, mas preferia fingir... essa era sua saída para fugir de si mesma. Fingir que estava bom, que estava confortável e que assim ficaria.

-Bom dia meu bem- disse Rui com uma voz leve. Sandra levou um susto. Não respondeu.

-Ei o que há com você? - perguntou Rui.

-O que comigo seu filho da puta? Olha onde estamos... olha onde você me trouxe. O que tem aqui? O que eu faço nesse lugar? Como você pode ter essa ideia ridícula.
Se aproximou do homem.
-O que você pensa? Que estou feliz? Você é um merda! Olha o que fez comigo e me pergunta se estou bem?
Rui estava com olhos pulando para fora. Espantado e surpreso com a reação da mulher.
Sandra teria pegado uma faca na gaveta de talheres.
-O que você quer de mim? O que você quer?
A mulher levantou as mãos e começou a esfaquear seu tão amado marido. Seu homem que tanto prezava e amava.
A hora que se deu conta teria terminado e nesse momento se ajoelhou no chão. Toda suja de sangue... um sangue maldito, de um homem maldito. Se pôs a chorar desesperada e arrependida.

- Meu bem??? - Sandra estava olhando pro nada com os olhos extremamente abertos sem ao menos piscar. Voltou de seus pensamentos e respondeu:

-Nada meu amor, estou distraída hoje.Me desculpe... - apagou o cigarro e virou para o homem. Ele colocou suas mãos na cintura da mulher e lhe deu um beijo. De repente o beijo dele ficou seco, áspero e sem graça. De repente suas mãos entre a cintura da mulher se tornaram pesadas e desconfortáveis. De repente o cheiro de Rui era cítrico e amargo. O homem deixou de ser atraente. Deixou de ser tudo que Sandra gostava e prezava. Ela queria correr... Ela queria fugir dali. Ela precisava sumir e por fim esquecer Rui.

Mas que merda mulher... sempre tivera coragem para tanta coisa e agora está fugindo como uma covarde.

Aquela voz em sua mente vinha como um sussurro, mas um sussurro alto e pertubardor. Ela tinha medo de enfrentar a si mesma, e isso ngm poderia fazer por ela.

Sandra percebeu que estava aérea naquela manhã, afastou Rui e o deu um beijo na testa.
Decidiu que iria ao centro.
-Irei demorar! - disse enquanto ia em  direção ao quarto para se trocar

(Something Big- Burt Bacharach)

Estava dirigindo em direção a cidade, o Sol refletia pelo vidro do carro. Sandra estava de óculos escuro pois seus olhos verdes sempre foram sensíveis na luz. Se considerava uma mulher da noite, mas num dia como aquele propôs a si mesma um pouco de Sol.
Avistou um salão de beleza com o nome  "Turquesa" e encostou. Ao entrar no estabelecimento percebeu que o lugar era aconchegante, como algo fixo numa cidade pequena. As mulheres que estavam lá aparentavam ser clientes de anos e a dona tinha cara e jeito de puta. Sandra abriu um pequeno sorriso no rosto como que tirando sarro.

-Bom dia moça. Tem hora marcada? - perguntou a mulher.

-Ah.... não. Mas que droga. -disse Sandra num tom baixo como se estivesse falando com ela mesma.

-Hum.. vou abrir uma exceção pra você. Mas só porque ainda está cedo e não tenho muitas clientes hoje. -deu uma risada sarcástica. -Sente aí e me diga... o que quer fazer?

-Obrigada. - Sandra sorriu. - Eu quero um corte curto.

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Saiu do salão realizada. Teria um tido um momento de prazer e mudança. Aquela sensação era essencial na vida dela, Sandra era uma mulher da mudança, mas aquilo não bastava. Ela precisava de algo mais forte, mais intenso e verdadeiro. Ela fixou essa ideia na cabeça... e aquilo não sairia de sua mente tão cedo.

Estava novamente na estrada... e dessa vez parou em uma praça. Sentou num banco e começou a observar.
Algumas crianças saiam dos colégios, tinha uns cães na rua e muita gente correndo para todo lado.
Algo chamou sua atenção... e era algo novo para ela mesma.
Havia uma menina sentada na fonte da praça. Seus cabelos eram longos e divididos ao meio, ela usava uma camisa branca justa, um jeans de cós alto e um all star azul.
Sandra pensou que no auge dos seus 24 anos, talvez sentisse saudades da sua adolescência. Talvez sentisse saudades da sua inocência...
Uma mulher se aproximou da garota, ela aparentava ter entre 25 e 30 anos. Veio carregando um livro mas mãos, e seus cabelos cacheados e armados balançavam acompanhando seu andar. Uma cintura fina e pernas longas. A mulher era realmente linda.
Quando a menina percebeu a chegada da mulher, abriu um sorriso e a cumprimentou com um beijo. Algo não bateu na cabeça de Sandra. A garota levantou e pegou sua bolsa. Deu as mãos para a mulher e a levou até um fusca que estava estacionado no outro lado da rua. Sandra observava com muita descrição o que estava acontecendo.

A menina entrou no carro e a mulher foi como passageira.

Estava completamente obcecada naquele momento. Ela percebeu o que queria e isso a deixou ansiosa.

Abriu um belo sorriso no rosto e voltou para o seu carro.

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Chegou em casa, tirou do carro as compras que teria feito no mercado. Fora em direção a porta e antes de entrar reparou que esta estava apenas encostada.
Sandra não fez muito barulho... poderia ser qualquer um dentro da casa. Entrou na cozinha e pegou a primeira coisa que viu na sua frente, uma faca de serra que estava na mesa no caso. Deu uma olhada pela casa com todo cuidado... ouviu um barulho vindo do seu quarto. Se aproximou com muito cuidado. Olhou pela fresta da porta e viu...
Havia uma mulher nua em sua cama. Rui se aproximou  dela e ele estava completamente nu. Passou a mão pelo corpo da mulher e a deu um tapa.
Era a vizinha do lado..... Sandra reconheceria aquele rosto em qualquer lugar.
-Sua mulher está onde... - perguntou a loira.
-No centro da cidade. Disse que demoraria mas é melhor que vá embora já. - Disse Rui devolvendo as roupas da moça.

Fúria.

O gosto amargo do teu ser (EM PROCESSO)Onde histórias criam vida. Descubra agora