Mark VicentIraque, 5 anos antes.
Seguro o rifle com firmeza enquanto, agachado, aponto-o com precisão para o alvo. Estamos sobre o telhado de um velho prédio caindo aos pedaços, no limite de uma cidade. O vento sopra violentamente, formando uma dança de papéis e poeira da rua, que está em terríveis condições, ladeada por outros prédios em ruínas. Tudo aqui está destruído. As paredes que conseguiram permanecer de pé estão crivadas de balas. O cheiro desse lugar é uma das piores coisas que já senti na vida. O Iraque fede a esgoto, e eu acho que nunca vou me acostumar com isso.
Minha respiração é cadenciada, enquanto meus olhos acompanham um homem suspeito de ter explosivos sob as roupas, por todo o corpo. Esses malditos sabem que estamos aqui e querem nos matar. Meus dedos coçam para apertar o gatilho, mas não faço nada até receber ordens do sargento. Estou concentrado, mas não o perco de vista. O comandante também analisa a situação com a luneta da própria arma. Meus braços ficam rígidos quando o homem se aproxima de pessoas inocentes; pessoas que ainda moram ali. Ele faz menção de puxar algo de dentro de roupa, e eu olho de esguelha para o sargento mais uma vez. Meu pedido silencioso para que eu possa dar um fim àquele homem é desesperado, e meu superior nota isso.
— Merda. Atire! — o sargento ordena e eu faço. Aperto o gatilho e a bala voa em sua direção.
Atiro sem piedade no homem que, aparentemente, tenta detonar os explosivos ao mesmo tempo que leva os tiros. Nada explode e, mesmo que eu saiba que ele já está morto, atiro mais algumas vezes. Quando termino de descarregar minhas balas nele, abaixo a arma e ergo a cabeça. Pessoas correm desesperadas, tentando se esconder de mais um ataque, não fazem ideia de que a ação objetivava protegê-los.
E se ele não tiver explosivos? — penso, mas não me sinto mal por isso. Essas pessoas não se preocupam em matar pessoas inocentes. Elas estão cegas pelo ódio.
Nossos colegas recebem ordens para analisar o corpo desfigurado e, assim que levantam a roupa do sujeito, encontram os explosivos, como havíamos imaginado.
— Bom trabalho — o sargento diz, mas eu ainda estou encarando o homem na rua, a certa distância, deitado sobre a piscina de seu próprio sangue.
Quando relaxo o corpo, decido me erguer por alguns segundos, a fim de alongar o corpo tenso.
— Mark... — ouço e volto a atenção para o sargento. Ele tem os olhos presos em uma criança, que caminha de mãos dadas com a mãe que chora descontroladamente. Com um binóculo, analiso a mulher e reparo que sua burca está volumosa, como se ela também tivesse explosivos debaixo da roupa.
Posiciono-me, apontando a arma para a mulher. Pingos de suor caem da minha testa. Minhas mãos estão suando, mas eu não posso permitir que ela mate essas pessoas.
— O que está fazendo? — o sargento pergunta.
— Ela pode ter bombas...
— Você ainda não está autorizado a atirar — adverte com uma voz firme, e eu compreendo a precaução. Outros inocentes voltam para o local imaginando que o perigo já tenha cessado. É bizarro perceber que eles se acostumaram com a morte, já que veem coisas parecidas todos os dias.
— Ela vai matar os nossos homens que estão próximos. Essa criança também será alvo dessas pessoas doentes.
— Ela está apenas desesperada!
Meus olhos não saem de cima da mulher, que agora se ajoelha próximo ao corpo do homem que matei. Nossos colegas se afastam, e ela, com a criança ainda junto ao corpo, levanta-se na tentativa de erguer as roupas. Com receio de que ela se exploda, mate a criança e meus colegas que ainda estão ali, eu atiro.
— NÃO! — ouço o sargento berrar, mas é tarde demais.
Eu atiro, e um de nossos homens, corre, alcançando a criança, na tentativa de salvá-la. Ele acaba em minha linha de visão e é também alvejado. Seu corpo desaba sobre o menino e eu paro de atirar.
Lentamente, abaixo a arma, observando consternado os corpos caídos ao chão. A criança agora grita desesperada, enquanto se desvencilha do corpo pesado do homem que acabei de matar. O menino agora está diante dos cadáveres dos pais, e eu estou suando frio, olhos vidrados na terrível cena que se desenha diante de mim, sentindo-me dentro de meu pior pesadelo.
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FÚRIA ( DISPONÍVEL NO KINDLE/AMAZON )
ActionNão devemos nos punir por algo ruim que fizemos no passado, mas Mark Vicent parece remoer alguns momentos em que cometeu erros incorrigíveis. Depois de anos vivendo na escuridão, decide que está na hora de voltar à ativa. Um ex-SEAL está pronto para...