O Boss

19 0 0
                                    


Havia algumas coisas esquisitas naquilo tudo. Zoni refletia sobre elas. Primeiro de tudo, os corpos não desapareciam. Nos jogos, tudo sumia, cadáveres sumiam, sangue sumia. Atrapalha o cenário quando as coisas se acumulam, gerando uma poluição visual aproveitada apenas por jogos de zumbi, onde é bacana que os corpos fiquem estirados por ai e se levantem quando convém, geralmente arrancando alguns sustos do infeliz que teve a grande ideia de jogar esse tipo de coisa na madrugada de um dia chuvoso. Outra coisa, e talvez a mais impactante, era sobre o motivo pelo qual a árvore estava tremendo.

...

Os dois aventureiros ainda corriam alucinados, procurando uma saída, mas só se deparavam com mais aventureiros. Alguns deles, em seu desespero, viam neles uma liderança, nem que fosse alguém que soubesse para onde estava fugindo. Já era possível contabilizar 12 pessoas correndo sem direção. Mas os esqueletos, em maior número, estavam em todos os lugares.

Então, eles sumiram.

Não que apenas desaparecessem ou que explodissem, foi mais como uma mão apertando um bloquinho de açúcar.

Todos se foram, exceto a confusão, que ainda atormentava os aventureiros.

— Sumiram. — Disse o careca

— Não baixe a guarda. — Disse a de cabelos compridos.

Uma voz cortou o silêncio preocupado.

— HELP PLEASE! SOMEBODY HELP ME!

Uma garota arrastava um corpo. A cena era dolorosa. Com feridas em toda parte, não parecia que aquele homem aguentaria mais meia hora com vida.

— Please! —  Ela olhava chorando para todos.

— O que a gente faz?   — Disse o aventureiro careca.

Alguém desembainhou uma espada.

— Temos apenas uma forma de ajudar. 

— Cara, NÃO!

— Não temos escolha Pablo. — disse — É isso ou ele vai sofrer até morrer!

— Para! —  Disse uma voz atrás deles.

De trás de várias cabeças curiosas, uma garota surgiu. Ela possuía um cajado de ponta verde. Chegou perto do corpo e segurou a arma com a mão esquerda, enquanto a direita foi posta no peito do ferido.

— CURACIÓN! — Uma luz verde fraca emanou da mão da aventureira, e as feridas lentamente fecharam-se.

O barulho da espada sendo embainhada foi sufocado pelas bater de palmas dos aventureiros, felizes com aquela boa ação.

—  Thank you, thank you, thank you! — As lágrimas corriam no rosto da garota, que teve o amigo salvo.

Ela soltou o cajado, pegou delicadamente no queixo da garota emocionada e encostou seu nariz no dela:

— No hay que llorar. — Então a beijou.

Pode-se dizer, com alguma certeza, que aquilo foi uma surpresa. A única palavra proferida por alguém no meio da multidão, diante de todo aquele "não sei o que dizer" foi: "Bah!".

...

Existe uma lista de coisas que são confiáveis. O céu é confiável, por exemplo. Ele vai estar lá quando você acordar. Entre muitas coisas, Zoni também considerava árvores confiáveis, ao menos até uma delas lentamente se desenraizar...

A temperatura de sua estrutura aumentou, fazendo com que todos pulassem para o chão. Suas raízes, já fora da terra, ganharam tons vermelho alaranjado e suas folhas pegaram fogo, o que foi quimicamente muito curioso, já que ela não queimava. Alguns galhos torceram-se, formando diversos braços grossos. Zoni esperava olhos de fogo, mas não aconteceu. Quem visse de longe acharia que era apenas uma árvore pegando fogo, até perceber que ela estava vindo na sua direção, chicoteando vinhas incandescentes e rangendo como dezenas de portas velhas.

— Nada de olhos então —  pensou Zoni, enquanto corria o mais rápido que podia pelo campo aberto.

PritiumOnde histórias criam vida. Descubra agora