Supremacia

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Espanha, 1552.

— Celeste, corre rápido antes que sejamos vistas. — dizia Alicia enquanto erguia a barra do vestido longo e com a outra segurava a mão da amiga com firmeza, tanto que os nós de seus dedos estavam brancos.

As duas crianças de dez anos estavam com a respiração descompensada quando esconderam-se atrás de um arbusto, com as bochechas vermelhas devido ao frio e a correria, já que naquela época de fim de inverno nem o sol foi capaz de esquentar a cidade naquele exato dia. Como se não fosse o suficiente, elas usavam vestidos bufantes, que não ajudavam nada em suas fugas. Ambas observaram um garoto de cabelos castanhos, se aproximando e parando no meio do campo de flores, olhando para todos os lados como se procurasse por alguma coisa. Ele segurava algo na mão, quando avistou de longe um pedaço de tecido rosa acetinado escapando atrás dos galhos que as duas estavam.

Mateo quis rir.

— Meninas, saiam dos arbustos.

Alicia revirou os olhos e levantou-se, cutucando sua amiga que fez a mesma coisa e sorriu envergonhada. Elas se aproximaram e Mateo sentiu um pequeno empurrão amigável em seu ombro, era Celeste, tentando arrumar os cabelos vermelhos embaraçados. O garoto prestou-se a oferecer às duas uma maçã vermelha que tinha apanhado do pomar do castelo mais cedo, como um gesto corriqueiro que tinham de compartilhar tudo um com o outro. Alicia o encarou enquanto mastigava, achando engraçada a expressão do menino. Seu vestido rosa, estava impregnado de folhagens sujas e com as barras pinceladas de terra molhada.

— Bem que você poderia fingir que não nos viu, não é?

— O que eu posso fazer se com esses vestidos grandes vocês não vão muito longe?

— Então me dê calças para vestir e vamos ver quem corre mais. O perdedor subirá sozinho até as masmorras.

Mateo sorriu com aquele desafio.

—  Poderíamos tentar atravessar para o lado de fora do castelo. — instigou ele, fazendo Celeste observar os dois com as sobrancelhas juntas de indignação. Mateo prosseguiu, enquanto Alicia erguia a barra do vestido para caminhar melhor, deixando suas canelas de meia branca e enormes calças expostas. — Ficar uns minutos e voltar.

— Mateo, não proponha desafios em que você irá chorar depois.

— Quem vai chorar é o seu pai quando ver seu vestido destruído. — Celeste colocou a mão nos ombros da melhor amiga a tirando de perto do garoto que estava sorrindo abobalhado, com o rosto um pouco sujo de terra. — Ele disse que temos que voltar para o palácio antes que um lobo gigante nos devore.

Alicia fez pouco caso.

— Na semana passada ele disse que era um cavalo sem cabeça.

— Como um cavalo sem cabeça vai nos devorar se ele não tem cabeça? — Mateo levantou a questão, com o suspense de uma criança inocente. — Então para que ele tem estômago? Diga-me Celeste.

— Deve ser para armazenar o seu cérebro.

Suas gargalhadas eram altas enquanto subiam o morro do campo, assim os três iam colhendo folhas do chão para fazer buquê e ramos no caminho, onde penduravam caules verdes no topo de suas orelhas e imitavam camponesas, dando voltas e suspiros forçados no gramado. O fim de tarde despreocupado daquelas crianças acabou no momento em que avistaram a estranha movimentação nas proximidades do castelo. Carruagens saindo a todos os galopes com homens aos gritos e cavalos correndo desgarrados entre os jardins de lírios, transformando o lugar em um grande caos. Um pequeno exército de protestantes rebeldes tinha invadido a grande igreja que ficava aos arredores do palácio, com a finalidade de destruir as estátuas católicas, as quebrando e deixando rastros de gesso pelo chão. Os guardas espanhóis ergueram suas espadas e avançaram contra os invasores, que estavam com armas em punho e algumas lanças improvisadas.

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