O último nome na apresentação das candidatas à Seleção foi anunciado.
Vi os olhos de meu pai desviar da TV assim que a última menina foi anunciada – por foto e nome – durante o Jornal Oficial de Illéa. Vi também os ombros de minha mãe relaxarem e suas mãos voltaram à costurar mais uma das calças que Oliver rasgara.
- Sabe por que não te escolheram Brita? – era a voz esperta de Oliver; pelo seu tom de voz eu sabia que vinha alguma piada de mau gosto. – Porque você é feia!
Nunca imaginei que a pré-adolescência de um menino pudesse ser tão infernal. Até seus oito anos, eu brincava com Oliver e o tratava como se fosse meu próprio filho. Aos dez anos ele já começava a fazer inúmeras perguntas – mesmo já sabendo as respostas. Aos doze ele invadia meu quarto e brincava com meus sutiãs.
- Não fale isso Oliver – a voz repreendedora era da minha mãe. – Sua irmã é linda.
Bufei de desgosto e me levantei. De repente a sala era pequena e estava cheia demais.
“Como se você se importasse.”
Saí pela porta da cozinha em direção ao quintal. O toque de recolher era daqui a uma hora. Eu teria tempo suficiente para respirar e pensar.
O que eu tinha de errado? Além de ser uma Quatro e nada graciosa, claro. Eu sabia falar duas línguas, sabia administrar, fazer contas, lidar com gente de castas mais altas... Não era isso que eles queriam?
“Se não tivesse preenchido o formulário como um currículo, talvez eles me escolhessem.”
Vai ver eles queriam uma garota burra. Alguém que não soubesse a diferença entre somar e multiplicar. Uma garota burra o suficiente para ser submissa ao príncipe. E claro, extremamente bonita. Por mais orgulhosa que eu estivesse sobre minhas habilidades de trabalho não contive as borboletas de vergonha em meu estômago.
Eu tinha um brilho dourado em minha pele, como se o sol tivesse me banhado rapidamente quando nasci. O que deve ter sido conta mim, a medir pelas meninas branquelas que foram escolhidas. Meu cabelo tinha um tom de chocolate derretido e não tinha muito brilho por causa dos cachos que viviam eriçados. Não era gorda, mas também não era magricela. Era mediana, mais alta que minha mãe, mas consideravelmente mais baixa que meu pai. Tinha pernas longas e grossas, ombros largos e mais curvas do que seria necessário, eu diria. Por isso eu passava a maior parte do tempo escondida embaixo de jeans folgados e camisetas propositalmente maiores que meu corpo.
Uma vez, quando eu tinha 16 anos, um garoto, filho do dono de uma fazenda pequena próxima à antiga casa que morávamos me chamou pra sair. Tive vergonha de contar para os meus pais então fingi que ficaria a tarde inteira na casa de uma amiga. Maya me ajudou a me arrumar e me emprestou um vestido. Ela tinha um corpo esbelto mas quase infantil, sem curvas, enquanto eu já tinha quase o tamanho que tenho agora. O vestido coube bem na cintura, mas meus seios, grandes demais para minha idade, pareciam querer pular pra fora do decote. Me escondi em um casaco de lã, me sentindo nua daquele jeito. Só que uma hora eu tive que tirá-lo.
O garoto passou o jantar inteiro olhando para "eles". Eu me sentia assediada. Ele podia ao menos tentar ser mais discreto! Outros homens passavam e davam olhadas furtivas pra mim – mais precisamente para meus seios – mesmo acompanhados de outras mulheres. Sentia os olhares afiados dessas mulheres, como se quisessem me tirar de lá pelos cabelos.
Como se não pudesse ficar mais desconfortável, ele me beijou. Foi numa árvore próxima à casa de Maya e mais nos escondíamos do que nos apoiávamos. Num primeiro momento eu quis empurrá-lo e sair dali. Mas depois pensei que o ocorrido no restaurante pudesse ter sido culpa da escolha de vestido. Eu poderia tê-lo trocado, mas não o fiz. Pensei que talvez as meninas com a mesma quantidade de curvas quanto eu deveriam passar por aquilo todos os dias.
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Chess Game
FanficBritânia realmente achou que o maior problema pelo qual passaria era ter que escolher entre sua mãe e seu pai. Mas quando ela é uma das Selecionadas, percebe que o que deveria ser simples é muito mais complicado. Enquanto ela precisa fazer Damon - o...