A sensação que eu tinha era de que os últimos dias haviam passado como horas.
Após a surpresa de ter sido escolhida em circunstâncias nada comuns o caos tomou conta de nossa pequena casa. Minha mãe e meu pai brigavam a cada duas horas, mas agora esperavam que Oliver saísse de vista. Não era nada comparado à sua última briga. Suas ofensas se limitavam à sentenças subentendidas e olhares que diziam o suficiente. Eu me sentia no meio de uma guerra real. Não importava o quanto eu apartasse, eles sempre voltavam a brigar.
Até Oliver estava mais quieto, o que definitivamente não era normal. O movimento dentro de casa deveria ter aumentado sua hiperatividade habitual, mas ele ficava pelos cantos, sentindo a pressão das brigas constantes de meus pais, mesmo que ele não as presenciasse. Eu tentava acalmá-lo, mas ele me dava as costas antes que eu pudesse dizer qualquer palavra. Era como se ele me culpasse pelo que estava acontecendo.
"Mas a culpa é minha."
Pessoas responsáveis pela Seleção vinham todos os dias para checar se eu não havia mentido sobre o que preenchi no relatório, tirar minhas medidas e se certificar de que eu não tivesse nenhuma terrível doença transmissível. Fizeram entrevistas com meus pais também, para terem certeza de que não haviam antecedentes criminais na família. Tentei não expelir pela boca o quanto eu achava aquilo hipócrita. Os anúncios sobre a Seleção diziam que a família real estava aberta para receber uma ‘filha de Illéa’ para ingressar em sua família, sem se importar com sua casta ou linhagem.
Parecia que o quesito ‘linhagem’ tinha alguns poréns.
- Prontinho – falou o homem de meia idade que me examinava, tirando uma faixa preta que prendia a circulação do sangue em meu braço. – Parece que você está perfeita.
Dei um sorriso amarelo que deve ter parecido falso, pois ele me olhou por cima dos óculos pequenos.
- Algum problema minha querida? – a voz dele estava mais baixa.
- Problema? – perguntei, imaginando se ele se referia à minha saúde.
- Você não parece tão animada – ele disse com um meio sorriso e uma expressão de quem se desculpa. – Não tanto quanto as outras.
- Ah – foi a única coisa que consegui dizer.
Não ia mentir; eu não estava tão ansiosa. Não no sentido que ele me perguntava. Estava ansiosa com a situação que era nova e toda aquela correria e preparativos à minha volta.
Não ansiosa para disputar pelo príncipe.
∙∙∙∙∙
Fiquei encarando a pequena mala sobre a minha cama como se aquilo fosse me lembrar de algo que eu estivesse esquecendo. Dentro dela estavam dois livros – dois suspenses, meus favoritos -, um caderno pequeno de capa dura e vermelha e páginas em branco que serviria para fazer anotações sobre o que eu viria a descobrir no castelo e uma troca de roupas que eu usaria somente no dia que fosse embora – o que deveria acontecer o mais tardar possível. Adicionei algumas roupas íntimas; eram as mais confortáveis que eu tinha e eu não tinha certeza se conseguiria dormir com o que quer que eles tivessem reservado para mim.
O mais importante, porém, não conseguiria guardar na mala. Eu ainda queria levar minha individualidade e personalidade mas temia que o que quer que viesse a acontecer arrancassem isso de mim. Eu não queria mudar; será que eu me deslumbraria com tudo o que viesse acontecer, com todas as facilidades da vida no castelo?
Será que eu corria o risco de realmente me apaixonar pelo príncipe?
Damon Illéa. Nas últimas noites, após a descoberta da minha escolha, foi quando eu realmente parei para pensar sobre ele. Mal reparei nele durante o Jornal Oficial, mais interessada nos nomes das escolhidas. Agora eu era uma delas e nem conseguia lembrar de seu rosto durante o programa.

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Chess Game
Fiksi PenggemarBritânia realmente achou que o maior problema pelo qual passaria era ter que escolher entre sua mãe e seu pai. Mas quando ela é uma das Selecionadas, percebe que o que deveria ser simples é muito mais complicado. Enquanto ela precisa fazer Damon - o...