Você não é um gatinho?

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Eu sei que você se foi, mas às vezes eu juro que eu ouço
A sua voz quando o vento sopra
Então eu converso com as sombras
Esperando que você possa estar ouvindo...Words

Skylar Grey


Ele acompanhava seus poucos movimentos com atenção, mas em silêncio e imobilidade. Afinal tinha entrado naquela casa como um animal ferido e ainda precisava fingir que sentia dor.

Tinha diminuído de tamanho para não assustar a fêmea e agora, depois dela limpar seu corte e fazer uma tala simples, ela indicou para ele o tapete de canto e voltou para o sofá olhando para o vazio. Ela estava de luto e parecia não quere sair dele.

Sehun tinha razão, ela estava doente.

Namjoon nunca cuidou de uma fêmea antes, ele era uma pantera solitária, excluída por ser um alfa feroz cujas fêmeas evitavam. Também não tinha muita paciência com humanas assim ele vivia mais longe da civilização do que perto, de ambas, humana e sombria. Era um macho errante e em uma de suas andanças foi parar ali, duzentos anos atrás e conheceu Sehun e sua capela.

Aquela gárgula era um raro amigo que o salvou de um inverno terrível. Ele devia ao macho, ele precisava fazer aquela fêmea voltar da escuridão de onde ela se enterrou, a questão era como.

Suspirou colocando a cabeça entre as patas, o que fazia uma humana feliz?

— Está com fome gatinho?

Ele sorriu em pensamentos. Gatinho? A fêmea achava que ele era um gato do mato? Ahhhh, fêmeas humanas eram muito estranhas mesmo.

Ergueu os olhos para ela que o olhava pensativa. Ele fez um barulho que esperava soar como chateado e voltou a cabeça para as patas. O que será que passava na mente dela?

— Quer brincar?

Dessa vez ele ofegou. Brincar? Era um maldito cão doméstico? Ela achava... E então teve uma ideia, provavelmente a mais vergonhosa e idiota da sua vida, mas quem iria saber? Humanos gostavam de fazer carinhos em seus animais domésticos, verdade? E se funcionasse nela? Custava tentar?

"Sehun... Você vai me dever a sua vida depois disso!"

Resmungou em pensamentos quando fez um muxoxo e virou seu corpo de barriga para cima. Ele, um alfa agindo como um doce ômega, era o fim do mundo mesmo!

Mas funcionou, ela fez um som de contentamento e depois veio para ele se ajoelhando ao seu lado e tocando em sua barriga com cuidado e depois com mais coragem.

— Gatinho bonito, fofinho... Precisamos te dar um nome não é?

Ele queria abrir a boca e dar uma reposta grossa, mas não o fez, primeiro por que aquilo era mesmo bom... Nossa, era bom e ele queria ronronar, o que era muito vergonhoso e segundo por que se falasse, ela ia ter um ataque cardíaco, humanos nunca estavam preparados para uma interação com sombrios, animais que falavam e podiam tomar a forma humana? Os assustavam de morte.

Então fez o que julgou ser a melhor ação para a situação, não para ele, claro, e fechou os olhos deixando ela acariciar seu ventre daquela forma rítmica e afável. Talvez... Sehun tivesse razão, a fêmea era muito valiosa para se perder, quem mais faria um carinho gostoso daquele em uma pantera mortal?

Decidiu cuidar dela por si mesmo também. Sim, ele queria mais daquilo, era bom, era prazeroso.

— Acho que não tenho comida aqui para você, vive na floresta certo? Então deve comer carne... Eu não tenho carne em casa.

Ele abriu os olhos, e ela comia o quê?

Como o macho dela pode morrer e deixar a fêmea sem alimento? Mesmo humano ele tinha que prover sua fêmea... Esses humanos estúpidos que morriam e deixavam o trabalho para trás, imbecis!

Ele rosnou baixinho e ela riu. Ela riu!?

— Sinto muito, gatinho! Você está bravo né, homens com fome ficam ranzinzas.

E ela deu mais um risinho suave e ele ofegou...

Pelos deuses, ela era mesmo linda... A Gárgula tinha razão, muita razão, ela era especial.

Pensou em como perguntar sem falar e a encarou esperando ela olhá-lo também, quando fez ele apontou para seu estômago com os olhos e fez o mesmo movimento consecutivamente até ela raciocinar seus gestos. Por fim ela deitou a cabeça de lado e piscou:

— Você quer saber se eu estou com fome?

Ele assentiu. Ela arregalou os olhos, mas foi ele quem sorriu. Fêmea esperta.

— Puxa... Se eu não tivesse certeza que você é um animal mesmo, eu podia jurar que você era um deles, nem parece um gato normal.

Um deles?

Todos os sentidos de alerta soaram em sua cabeça e ele se retesou, do que ele estava falando? De repente era como se ela estivesse dentro de sua própria cabeça, seu olhar se perdeu em um ponto na parede e ele esperou, mesmo impaciente que ela explicasse o que aquilo significava e quase teve um surto quando ela falou:

— Sabe... Dae era muito estranho quando no conhecemos e ele sempre desaparecia em noites de lua cheia, até que um dia eu fiquei curiosa e o segui. Fiquei muito confusa naquele dia por que meu namorado se transformava em lobo. Foi estranho... - Ela suspirou pensativa e Namjoon se retesou ainda mais, ela conhecia um noturno... - Então eu chamei por ele e ele quase saiu correndo, mas eu pedi que ele explicasse e ele me explicou, ele tinha fugido de sua alcateia por que ele foi considerado fraco pelo seu alfa. Ele vivia sozinho desde então e se apaixonou por mim quando me conheceu. Me contou sobre seu mundo e todos que haviam nele, ele gostava de contar histórias e eu gostava de ouvi-las, eu o amava e ele jurou que nunca me abandonaria. Eu acreditei... Mas um tiroteio o levou de mim, tiros consecutivos... Ele não pode se curar.

Ele me abandonou mesmo não tendo a intenção. Eu não quero ficar sozinha sabe gatinho... Tudo é vazio sem ele aqui.

Seu olhar buscou alguma marca nela ou mordida de posse em seu pescoço, não havia nada, nem cheiro de um macho, ela viveu com o lycan, mas não era companheira dele. Quem era esse macho que fugiu de seu alfa? Seria um beta? Um ômega... Não, se fosse um ômega seria caçado e levado de volta, eles eram muitos raros para se perder.

Era surpreendente, aquela fêmea conhecia seu mundo... Sehun era um sortudo mesmo!

Ele se afastou um pouco dela e mudou de forma, seria tudo mais fácil se pudesse conversar com ela de forma humana, se ela já tinha visto a transformação de um lobo a de uma pantera era menos traumática.

Quando se ergueu como homem, ele a encarou e viu a fêmea assombrada abrir e fechar a boca, contudo, de tudo o que esperava ouvir, definitivamente não era aquelas palavras:

— Você não é um gatinho?

Sussurre meu nomeOnde histórias criam vida. Descubra agora