1. O treino secreto

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Flippo abriu os olhos, ainda deitado em sua cama. O calor remanescente da lareira, quase apagando, mantinha a cabana aquecida, tirou a pele de urso que o cobria e sentou-se, espreguiçando.
Olhou para a chaleira em cima do fogareiro e constatou que seu pai já havia saído. O cheiro no bule denunciava o preparo da bebida quente que ele sempre fazia, antes de ir para as minas.
Ele então levantou e serviu-se de um gole da bebida.
Abriu a janela para ver como estava o dia e os primeiros raios do sol começavam a tingir de vermelho o céu. Não haviam nuvens espessas, nenhum sinal de chuva, apenas a neblina matinal, tudo normal. Terminou de beber seu chá, lavou o rosto na bacia e colocou suas vestes de caça.
Mesmo para um menino franzino, alguma função ele precisava exercer na ortodoxa vila anã dos Bedaürinde, ao extremo norte do planeta.
"Nenhuma gema é minerada sem o martelo de um anão" - dizia o avô de Flippo, era o que o menino costumava lembrar antes de sair para a caça.
Já vestido com o casaco, as aljavas cheias de flechas, a mochila com os restos de comida e o cantil com água apostos, pegou suas duas armas: o arco curto e a flauta de marfim. Guardou-as em suas costas e bolso, respectivamente e deixou a pequena cabana.

O frio matinal o saudou, fazendo-o estremecer. O clima na colina era bem severo.

A direita estava a estrada para a vila anã na montanha branca. Mas, seu destino era o outro caminho. Flippo desceu pela escada natural que havia formado na encosta do morro, adentrando na floresta que descia até o litoral da grande ilha. Árvores altas, com as pontas finas, em forma de pinhos, ainda mantinham as folhagens verdes, sobrevivendo a estação que antecede o rigoroso inverno.
Depois de alguns passos, os barulhos das aves e dos pequenos mamíferos procurando por alimento se transformavam em alvos para o pequeno caçador.
Flippo olhou ao redor e sacou uma de suas armas, a flauta que havia escondido em suas vestes. Ele a levou à boca, fechou seus olhos buscando se concentrar e suavemente começou a entoar notas que se mesclavam aos sons da floresta.
Algumas aves levantaram vôo, mas alguns animais menores como esquilos e coelhos brancos se aproximavam ao som melodioso da canção. Flippo abriu os olhos, sem terminar a última nota, ansioso para avaliar o tipo de caça que havia conseguido atrair, quando viu os animais ali presentes ficou constrangido por serem todos de pequeno porte, mas aproveitou a cilada e antes que eles fugissem capturou um de cada espécie para garantir o jantar de seu pai.
Jogou as caças no alçapão e seguiu para a trilha no encosto da montanha, adentrando ainda mais a floresta, com rapidez e destreza em seus passos.
Era um caminho conhecido, que Flippo tinha pressa em trilhar.
Depois de longos passos ligeiros, saltos e travessias em riachos, ele chegou na abertura oculta ao pé da montanha, encoberta pelas árvores e ramagens.
Havia inscrições na caverna na cor azul néon, que eram refletidas durante a noite. Flippo se aproximou com cuidado e assobiou como quase a imitar um pássaro da região. O assovio alto foi respondido por outro do mesmo som, porém com tonalidade mais grave.
Esse era o sinal combinado, o local estava seguro ele entrou na caverna onde seu mestre estava escondido.
Uma criatura negra, de estatura alta e corpo esguio, cabelos azuis escuros como uma noite enluarada, presos em pequenas tranças e olhos prateados reluzentes. Era um elfo das profundezas, ou drow como era conhecida sua raça.
- Como vai Mestre? Precisa de algum alimento? Tenho comida , água e carne fresca aqui comigo. - perguntou o menino
- Você subestima minhas habilidades, pequeno aprendiz. Eu já me recuperei do ataque que sofri, já consigo caçar. - após uma pausa ele continuou – Aliás, com mais aptidão do que somente roedores e mamíferos pequenos.
Flippo abaixou a cara para o chão, suspirando de decepção. Seu rosto era iluminado pelas chamas azuladas que crepitavam das tochas presas nas paredes da caverna.
- Não se preocupe tanto assim, você tem evoluído bastante, antes nem isso conseguia. - tentou consolar o tutor.
- Verdade mestre, mas quando vou conseguir enfeitiçar um cervo ou um urso polar?

As Aventuras de Flippo e o Trinustempus Onde histórias criam vida. Descubra agora