Eu lembro exatamente onde estava e o que fazia quando ele apareceu.
Eu tinha doze anos e jogava videogame com meu melhor amigo, Felipe.
— Arthur, estamos na fase final. Vamos vencer essa partida juntos, tá bom? — Felipe me encara nos olhos esperando uma confirmação.
Assim de perto, posso olhar seus olhos azuis com atenção, são tão brilhantes e o pequeno detalhe da marca de nascença embaixo do olho o deixa ainda mais único. Eles me lembravam a praia, por causa da cor azul esverdeada. Me aproximo ainda mais dele, como se um ímã me atraísse para perto.
— Seus olhos parecem o mar. — Eu digo sem querer e ele me olha estranho. — Hã... Quero dizer... Vou pegar refrigerante para a gente, você quer?
Não ouvi a resposta dele, saí antes que Felipe pudesse falar alguma coisa. Aquilo tinha sido muito constrangedor. O que estava acontecendo? Por que meu amigo me deixava desse jeito?
Volto com dois copos de suco, torcendo para que Felipe goste de suco de uva.
Entrego e assisto ele tomar o primeiro gole. Por um segundo me pego perguntando como seria sentir aqueles lábios nos meus e um arrepio percorre meu corpo. Balanço a cabeça tentando voltar para a realidade.
— Não tinha refrigerante, Arthur? — Ele pergunta e eu apenas encaro por alguns segundos. Do que ele estava falando?
— Ah, é! O refrigerante tinha acabado, desculpa...
— Sem problemas, pelo menos tu lembrou que suco de uva é meu favorito! — Eu não tinha lembrado disso. — Você é adorável.
Adorável. Ele tinha acabado de me chamar de adorável. Eu tropeço no meu próprio pé, deixando cair todo o conteúdo do meu copo em Felipe e no chão do meu quarto. Deus, aquilo não podia ficar pior.
— Merda. — Felipe xinga enquanto eu murmuro milhões de desculpas. — Minha mãe vai me matar.
Corro para o banheiro e volto em menos de um segundo segurando um pano de chão.
— Desculpa de verdade. Eu sou um desastre. — Novamente estou murmurando e evitando o olhar.
— Tudo bem, não foi tua culpa. Eu já 'tô acostumado com você derrubando coisas, faz parte do teu charme.
— Você pode usar uma das minhas blusas. — Eu jogo minha blusa do Homem-Aranha e desvio o olhar. — Vou sair do quarto pra você trocar de roupa.
— Não precisa, somos dois garotos.
Somos dois garotos.
Felipe estava certo. Éramos dois garotos, dois amigos. Deveríamos fazer coisas que amigos fazem. E tenho certeza que amigos não olhavam outros amigos do jeito que eu o olhava. Pelo canto de olho eu admirava o corpo de Felipe. Sinto um friozinho na região do ventre. Ele coloca a blusa vermelha e eu quase sinto vontade de derrubar suco nessa também. Quase.
— Vem cá, vou te ajudar a arrumar o resto das coisas. — Ele me puxa pela mão e eu sinto meu rosto corar. Felipe não se mexe, apenas fica olhando meu rosto por alguns segundos.
— O q-que foi? — Pergunto preocupado com a possibilidade de ter uma sujeira no meu rosto.
— N-nada, eu só... — Ele engole em seco. — Tu tá sabendo da Thaís?
Ah, claro. Thaís Santiago. Eu a amava, de verdade, porém tinha ciúmes da relação dela com Felipe. Eu tinha apresentado os dois. Foi por minha causa que eles se conheceram. Então o fato deles virarem íntimos me incomodava.
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Tem Um Garoto No Meu Armário
Short StoryQuando descobriu que gostava de garotos, aos 12 anos, Arthur encontrou um garoto no seu armário. E esse garoto está ansioso para que ele o liberte sem se importar com que os outros vão pensar, até porque não há nada de errado nisto. Agora, Arthur...