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[Esse final pode conter gatilhos para ansiedade, depressão e suicídio. Se você é sensível a esse tipo de assunto, não leia. Você importa.]

Sempre procure ajuda profissional.
Número do CVV, caso esteja passando por um momento difícil e precise de aconselhamento ou só para desabafar: 188

🏳️

  — Filho, pode entregar esse vestido para a dona Yara?

  — Tenho mesmo que ir? A dona Yara mora tão longe daqui.

  — Por isso que estou te pedindo. Tu é jovem e andar vai te fazer bem. Fora que teu pai saiu com o carro.

  Não disse mais nada, já que não se deve contrariar mãe. Dona Yara era uma senhora simpática que já era cliente costumeira de minha mãe. Eu costumava a visitar e ser servido de bolo. Também lembro do neto dela que deveria ter mais ou menos minha idade... Mas é melhor não falar sobre isso.

  Fui escutando música o caminho inteiro, trocando meus pensamentos intrusos pela letra de You Don't Know da Katelyn Tarver.

  Toco a campanhia e Yara me atende com um sorriso. Ela me entrega o dinheiro e eu deixo a sacola com o vestido em cima da mesa. Antes que eu saia ela me oferece bolo e pede que eu espere. Não posso negar, dona Yara é uma confeiteira de mão cheia. Sento no sofá e brinco com Floquinho, um de seus gatos.

  Dona Yara está no meio de um monólogo sobre seus gatos quando a campainha toca.

  — Deve ser o José Carlos. Ah, ele está enorme agora! Que saudade quando vocês dois corriam pela sala...

  Um arrepio percorre minha espinha. Dentre todos os dias e horários, Zeca tinha que vir visitar a avó justamente quando eu estava aqui. Quais eram as chances?

  Eu não venho visitar Dona Yara com tanta frequência, mas pelo que sabia seu neto estava na cidade natal, Belo Horizonte.

  Ele entra e assim que me vê sua expressão mudar para a parecida com alguém que acabou de ver uma assombração.

  Dona Yara vai para a cozinha, me deixando sozinho com seu neto.

  Zeca (ou José Carlos, nunca apenas José e nunca apenas Carlos) era mais baixo que eu, porém muito mais largo e mais forte. Acho que ele estava malhando inclusive.

  — O que 'cê está fazendo aqui? — Ele sussura com uma expressão nada gentil. Eu não respondo e ele aponta para a porta. — Vamos conversar lá fora.

  Eu não tinha muita escolha, apenas o segui até a frente da casa.

  — O-olha, eu não sabia que você estaria aqui! E antes que diga algo, eu nunca contei para ninguém.

  José Carlos e eu tínhamos ficado algumas vezes. Eu sempre visitava sua vó e ele estava sempre lá. Acabou acontecendo, era inevitável. Mas Zeca tinha ficado agressivo. Talvez esse tenha sido o modo dele de se autoproteger dos novos sentimentos.

  — Até porque 'cê não tinha o que contar, né? — Ele me segura pelos ombros e fica frente a frente comigo. O sotaque mais carregado do que eu me lembrava, talvez porque ele estivesse nervoso.

  — Claro, Zeca. — Eu murmuro querendo sair dali o quanto antes.

  — Não me chame de Zeca, não desse jeito! — Ele aperta meus ombros com mais força. — Deus, você não mudou mesmo.

  Por um estranho momento, apenas por poucos segundos, achei que ele iria me beijar. Eu vi naqueles olhos verdes o mesmo olhar que ele me direcionava antes de nos beijarmos. Ou talvez eu estivesse imaginando coisas.

Tem Um Garoto No Meu ArmárioOnde histórias criam vida. Descubra agora