2.- A vida de Jack.

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Como era? Jon, será? Não... Acho que era Joaquim... Droga, não era isso! Hm... Jack. Ah, sim. Esse era meu nome: Jack Napier. Sabe, eu me lembro que eu era comediante, mas por algum castigo da vida, minha carreira não fez sucesso. Não importava o que eu fizesse, ninguém ria das minhas piadas. Mas ela ria. Era a única que ria de minhas piadas sem graça. Jeannie. Ela era uma beleza rara por Gotham, cabelos castanhos e ondulados, olhos azuis como o de um oceano calmo, os olhos que me traziam tranquilidade quando eu estava nervoso.

Eu a amava e não demorou muito para começarmos a namorar e nos casarmos. Bem, se assim posso dizer, ela foi meu primeiro amor. Mesmo eu sendo cercado por pessoas que queriam ouvir minhas piadas, elas não entendiam e vinham a ir embora, me fazendo ficar ali, sozinho. Foi quando em uma dessas tentativas de fazer alguém rir, eu a vi. Eu não estava mais sozinho, até porque ela estava comigo, só eu e ela. Jeannie sabia que minhas piadas não tinham graça, mas ela ria para me agradar e me ver contente ao menos uma vez na vida.

Nossa vida não era como a dos Wayne's, cheia de luxo e dinheiro. Nossa vida era complicada. Eu insisti em continuar sendo o comediante fracassado e Jeannie era dona de casa. Éramos cheios de dívidas e morávamos na zona mais pobre de Gotham City, o apartamento estava praticamente caindo aos pedaços e mal haviam móveis, móveis horríveis e velhos. Tudo era horroroso, mas Jeannie trazia uma alegria para o ambiente. As coisas pioraram quando ela engravidou. Claro, a notícia foi ótima na época, mas não tínhamos condições para criar uma criança. Do mesmo jeito, eu prometi a ela que eu daria um jeito de dar tudo o que meu filho precisasse.

Promessas, isso era uma coisa que eu fazia muito. Promessas que com o tempo eram esquecidas ou não cumpridas, e isso era um dos motivos das dívidas. Eu devia muito dinheiro para todos os lugares de Gotham. Jeannie brigava comigo por isso, mas eu só queria ter uma vida descente, tanto para ela e nosso futuro filho, quanto para mim.

Eu conhecia cada canto, cada esquina, cada rua de Gotham, e em todos os cantos eu devia dinheiro. O meu ganha-pão era em um bar mal frequentado, que vez ou outra havia apresentações de shows, clube de luta, aparições de strippers e o de stand-up, que no caso, era eu quem fazia. Eram show's semanais, mas eu sempre implorava para fazer pelo menos dia sim, dia não. O dono do bar, era conhecido como Barão, apenas isso, uma palavra que significava um nome. Mesmo assim, esse codinome impunha respeito, ele era um homem de bigode, calvo, altura mediana e barrigudo, com uma tatuagem de caveira no antebraço direito.

-Napier, sabe que me deve muito mais do que imagina. -ele sempre dizia entre os dentes com charuto aceso rodando em sua boca.

-Eu sei, eu sei. -e eu sempre respondia a mesma coisa, envergonhado do meu fracasso. -Mas eu juro que, quando eu conseguir uma grana eu vou lhe pagando, Barão.

-Não sei, Napier. Essas suas promessas... -novamente eu caía nas promessas, promessas voavam junto com o vento assim que saíam de minha boca. Fazer promessas sempre foi fácil, difícil é cumpri-las. Sempre foi isso para Jack, um ser esperançoso cuja acreditava que um dia teria uma vida normal, sem dívidas, e iria morar perto da zona nobre de Gotham. Tão tolo, tão iludido... A verdade é que, em Gotham ou você nasce rico, ou você tem de jogar sujo para se tornar rico, mesmo que o dinheiro que você tenha não seja honesto.

-Eu prometo por Deus que irei lhe pagar tudo o que devo. -e o tal Barão ponderava, pensando se valia a pena realmente acreditar em minhas promessas mal prometidas.

-Tudo bem, mas só mais dessa vez. -o homem não era tolo nem nada, mas sempre que tinha a próxima vez, ele deixava eu me apresentar de novo, de novo e de novo. Para ele, eu não era nada mais do que um verme, um pobre homem fracassado, sem dinheiro nem para alimentar a própria família. Mas não era isso que eu era?

-Obrigada, senhor. -apesar de tudo, eu ainda conseguia ser cortês, eu era pobre, daqueles que não tinha uma moeda direito no bolso, mas minha mãe havia me ensinado a ser um bom homem, um homem educado. Mal sabia ela que seu filho seria no futuro um criminoso, assassino vil que mata a sangue frio, sem olhar nos olhos de sua vítima. HA HA HA!

E eu caminhava até o palco, dia sim, dia não. Subia dois degraus de madeira e já estava no palco, mais precisamente, no centro dele, atrás de um microfone barato e provavelmente falsificado, com um holofote iluminando meu ser. As pessoas já me conheciam por lá, raramente algum novato aparecia. Elas me olhavam com desdém, pois já sabiam que de minha boca, boa piada não iria sair.

-Boa noite a todos! -eu dizia fingindo ânimo. As pessoas nem se davam o trabalho de me olhar de volta, apenas me encaravam brevemente e depois voltavam a beber ou a conversar com o outro bêbado. -Bem... Vocês sabem a piada do viajante? -nada. Nem um ruído ou uma mão levantada como quem dissesse "eu sei!". Não, foi definitivamente nada, apenas os ruídos de vozes, as vozes das pessoas conversando. -Quando ele voltar, perguntem para ele! -digo por fim a resposta. Tiro do meu bolso um gravador e aperto o mesmo, nele estava gravado um som de bateria Ba dun tss, já que eu não tinha dinheiro para contratar um baterista. Ninguém ria, apenas me olhavam e escondiam o rosto sobre as mãos, não querendo mostrar que na verdade, estavam rindo do meu fracasso.

-Por que não desiste disso, Jack? -a voz de Jeannie sempre sussurava em minha mente. Ela achava graça em minhas piadas, mas minha carreira não dependia somente da minha esposa. Mesmo antes de meu primogênito estar a caminho, ela me dizia isso. Para ela havia graça, mas nós precisávamos de dinheiro para nós mesmos.

-O que tem quatro patas e um braço?-eu tentava novamente. Do mesmo jeito de antes, ninguém nem se dava o trabalho de virar o rosto para mim. Quando resolvi abrir minha boca para falar a resposta, ruídos parecidos como uivos saíram das bocas das pessoas. Elas estavam zombando de mim, me menosprezando, esfregando na minha cara o meu fracasso que eu sabia que existia, mas recusava a enxergá-lo e tentar minha vida em outra profissão. -É-é um pit-bull feliz... -disse a resposta, mesmo que ninguém ali fosse me ouvir e peguei o gravador, apertando o botão do mesmo. O som da bateria não saiu, dei alguns tapas de leve no mesmo na tentativa de fazê-lo funcionar, sem sucesso. Joguei a tralha do gravador no chão e desci os degraus acompanhado dos uivos humanos e saí pelos fundo daquele lugar.

-Maldição! -eu gritava, chutando as latas de lixo. -Por quê?! -eu sempre perguntava gritando o porquê do meu fracasso à Deus, como se ele fosse me ouvir. Nem Deus tinha mais esperança em mim, porquê eu teria?

Eu me lembro que após Jack ficar se lamentando, eu voltava para casa e Jeannie me recepcionava como a bela esposa que eu tinha. Ela me oferecia uma massagem e antes da gravidez, algumas noites terminavam em prazer, outras palavras, em sexo, era um jeito de eu esquecer meus problemas, minhas fracassas.

No dia seguinte tudo se repetia. Era assim que funcionava minha vida tediosa, eu acordava, ficava em casa a tarde toda planejando piadas e depois saía para tentar minha sorte novamente. Mas teve um dia que Jack mudou, ele não ficou em casa planejando piadas.

-Querido? Tudo bem? -Jeannie perguntou ao me ver saindo de casa já de noite.

-Sim, tudo ótimo! -pela primeira vez, eu dizia aquilo com um sorriso no rosto.

Um dia antes eu havia avistado uma gangue, pequena mas conhecida por Gotham, durante o caminho de volta para casa. Eu passei por perto deles e o assunto era que eles precisavam de mais um cara para fazer um assalto, já que o outro parceiro deles havia sido pego pelo Batman.

-A recompensa irá ser de duzentos mil dólares. -um deles disse, aparentemente o chefe deles. Porra, duzentos mil dólares! Aquilo iria resolver minha vida e ainda iria sobrar. Foi o que Jack pensou. Aquela frase havia chamado tanto a sua atenção que pareceu que ela era uma luz e Jack, uma mariposa necessitada dela.

-Eu me proponho. -Jack disse quando se aproximou dos homens. Eles olharam um para o outro, como se estivessem me avaliando. -Por favor, eu preciso desse dinheiro. -eu havia implorado.

-Tudo bem, mas irá fazer tudo o que mandarmos! -o mais alto e forte havia me avisado. Oh, claro que eu aceitei. Quando estamos no fundo do poço, qualquer coisa que apareça e ajude é bem-vinda. É como se os pensamentos do que é certo e errado desaparecessem. Naquele mesmo dia, eu havia voltado para casa feliz, pela primeira vez na vida.

Gotham sempre será assim, ou você nasce rico, ou você tem de jogar sujo para se tornar rico, mesmo que o dinheiro que você tenha não seja honesto. Eu estava começando a jogar sujo, mesmo que o quê eu ganhasse com isso não fosse honesto comigo.

...

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