O Gato

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Esta situação de fuga arrastou-se por alguns dias. Usando incessantemente a técnica teletransporta-cavalga-teletransporta-cavalga, o trio conseguiu despistar os Cartas com sucesso.

Foi quando decidiram seguir na direção do bule, definitivamente.

"Oh, e vocês não vão acreditar!" Exclamou Giullian. Lana não conseguiu identificar se sua voz era de sarcasmo ou de felicidade genuína. Ele era muito confuso... "Estavam na Floresta, o tempo todo!"

A Lagarta suspirou, amarrando o cabelo. "Considerando que cerca de 90% do território do País das Maravilhas é ocupado pela Floresta, Giullian, não poderia estar mais surpresa."

O rapaz cruzou os braços, zangado. "Pensei que estariam no Litoral, ora! É lá que os criminosos se reúnem e fazem o que têm que fazer..."

Lana sorriu, com pena. Giullian claramente sentia muita falta do mar.

"Nada tema, Giullian. Quando tudo isso acabar, vamos tirar férias! Carl, seus irmãos e eu vamos alugar uma cabana na praia e não vamos te deixar em paz!" O pensamento acabou arrancando uma risada dos dois. "Não é mesmo, Carl?"

"Alan não vai gostar nada disso..." Comentou o Chapeleiro. "E é por isso que temos de ir!"

O trio riu. Alan era sonolento e preguiçoso... Dificilmente gostava de alguma coisa além de dormir. Lewis estava certo, ele tinha de fato o comportamento semelhante a de um Arganaz...

Os três cantavam músicas de desaniversário enquanto trilhavam a Floresta, na direção do bule indicava.

Porém, em certa parte da melodia, Carl se empolgou demais.

"Um bom desaniversário!" Exclamaram Giullian e Lana.

"Pra mim?" Perguntou Carl, entusiasmado.

"Sim, sim!" Responderam.

E para encenar completa surpresa, o Chapeleiro ergueu os braços. Nisso, o bule de porcelana voou para longe, entrou em choque contra uma árvore e se quebrou.

Lana analisou a situação por alguns segundos, imóvel e incrédula. Não conseguia digerir que perdera a sua única chance de sucesso de maneira tão estúpida.

Engoliu o ódio assim que encontrou o olhar desesperado de Carl. Nunca conseguiria descontar sua raiva nele.

"Você consegue consertar, não consegue?" Mendigou, com os olhos brilhando.

A Lagarta soltou o ar, tentando se conter. "Consertar, eu até poderia. Mas isso não restauraria o feitiço de localização. Porquê, para isso, precisaríamos da presença do seu irmão."

Giullian deitou sua cabeça no ombro de Lana, derrotado. "Fulminou-se."

Antes que entrassem em depressão coletiva, uma risada alta e histérica preencheu o vazio. Os dois entraram em alerta uma vez que repararam que o riso não viera de Carl - este se encontrava absorto demais em seus delírios autodestrutivos.

"Oh, Lagarta! Você fica tão bonita assim, vermelha de raiva!" Exclamou a voz, distante e presunçosa. O dono da voz parecia estar se aproximando.

Reconheceram-no ao mesmo tempo.

"Ah, não..." Exasperou Lana. "O Ghunter não..."

"Por quê não, Lagarta? Vermelho é uma cor vibrante, bonita, sensual..." Teve a impressão de tê-lo sussurrando em seu ouvido. "Como você."

Lana recuou, trombando no cavalo de Giullian. Passando mão pela nuca, percebeu que havia ganhado uma rosa vermelha de presente. Esmagou-a, frustrada.

"Awn, não faça assim com os meus sentimentos." Disse, risonho. "Não sou o Lewis."

Lana apertou as rédeas com mais força. Sempre odiara aquele Ghunter. Desde pequena. Teve de suportá-lo sua infância e sua adolescência inteira, pois eram aprendizes do mesmo feiticeiro. Ele era sempre assim: inconveniente, provocativo, sádico.

Quanto maior a distância que tivesse dele, melhor.

Ghunter se materializou de uma fumaça roxa. Seus olhos violetas brilhavam de intensidade. Tingira seus cabelos espetados de azul escuro. Usava diversos adereços dourados ao longo de seu corpo.

Ao vê-los pessoalmente, abriu a boca em um enorme sorriso. Parecia deleitar-se com o encontro.

"Ora, Lagarta, não me olhe assim..." Ronronou, se aproximando a passos silenciosos. "Você não vai maltratar o seu gatinho, vai?"

Ignorou-o e voltou seu olhar para Carl - o encontrou prestes a cortar a própria garganta. Com um movimento de mão, desacordou-o e o fez deitar em seu respectivo cavalo.

Giullian, por algum motivo, nada fazia além de encarar as próprias mãos.

Lana revirou os olhos. Antes que pudesse falar, Ghunter sentou-se atrás dela.

"Vim para ajudar! Não pude deixar de perceber que acabaram... Perdendo a única bússola que tinham." Ele deu uma olhadela de desprezo aos cacos no chão. "Pois bem... Eu vou ser a outra!"

A Lagarta lhe deu uma cotovelada. Detestava seu jeito travesso. "Você é um trapaceiro, Ghunter. Saia daqui."

Ghunter era famoso por apontar os caminhos. Algo muito errôneo, a final, não existem caminhos que dão para um só lugar no País das Maravilhas. A lógica não é a mesma do mundo superior. É tecnicamente impossível decorar uma trilha, uma vez que ela sempre muda.

Para se andar ali, era preciso querer chegar em algum lugar. Mas ao mesmo tempo que poderia dar certo, poderia não dar... Enfim. Placas eram inúteis.

E o "trabalho" do Gato, portanto, balelas para ganhar dinheiro de viajantes desavisados.

"Não minta para si mesma, Lagarta... Você sabe que eu sempre chego onde quero chegar." Ele sumiu com o vento.

A moça ia começar a comemorar sua partida, mas ele reapareceu - flutuando em sua frente.

"Uma bela confusão, foi a que vocês conseguiram causar... A guarda tentou aniquilar uma aldeia vazia, e inexplicavelmente, a biblioteca dali também havia sumido... O Rei foi decapitado, a Rainha ficou noiva..."

Giullian saiu de seu transe e ergueu a sobrancelha. "Viktor vai ser mesmo o Rei?"

"Como se isso não fosse óbvio, Tweedle-sei-lá-o-quê." Respondeu o Gato, cruzando os braços. Logo retomou sua proposta. "Eu sei onde a Lebre e o Arganaz foram aprisionados. Posso levar vocês até lá rapidinho..."

Carl roncou mais alto.

"E o quê me garante que você não está ajudando Alice?" Interrogou a feiticeira, impaciente.

"Oh, minha querida, você terá de confiar em mim."

Lana o puxou para perto pela gola. Olhou profundamente em seus olhos e respondeu com a voz mais seca e venenosa que tinha:

"Eu nunca vou confiar em você."

Ghunter recuou, ofendido.

"Oh, Lana..." Ele colocou a mão no peito. "Assim você me magoa."

Lana ergueu a sobrancelha. Aprendera a não se importar fazia muito tempo. Ironicamente, graças a ele.

A LagartaOnde histórias criam vida. Descubra agora