12 de Abril de 1912

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Não há muito o que se dizer.

Eles estavam há quase dez horas naquele reservatório, mas desta vez eles ficaram com os carrinhos de mão, levando o carvão para longe do fogo e de qualquer coisa que pudesse queimá-lo.

Naruto e Sasuke pareciam curiosamente mais próximos depois do turno noturno em que puderam descansar. Ao despertarem do cochilo já de manhã, sentiam que havia um vínculo diferente, mas especial entre eles, algo que não saberiam explicar se tentassem. Conversaram sobre muitas coisas, como o futuro: o que fariam quando chegassem à Nova York, se continuariam trabalhando em navios ou se seguiriam outras carreiras.  Sasuke, como sempre, não falava muito, não se expressava muito bem em palavras, mas seus olhos deixavam claro tudo o que sentia quando Naruto lhe falava.

Não tinham noção do que se passara entre eles, do que um havia feito no outro enquanto cochilavam, naqueles breves minutos do despertar que tiveram, mas sentia só de um olhar para o outro que algo mudara em tão pouco tempo.

Era estranho, pensava o foguista, deitado em sua cama contra a parede e com Sasuke bem a sua frente, na mesma cama. Nunca se sentira assim. Sempre fora um cão de rua, sem se prender a ninguém e aprendendo a sobreviver como dava a cada dia, fazendo o possível para ter o mínimo. Conhecia o desprezo mais que ninguém, e o abandono, mas agora se sentia, pela primeira vez, extremamente acolhido por Sasuke, que sempre agia com muita gentileza. Ele lhe enxergava, sabia disso, aqueles olhos negros tinham um poder que Naruto não sabia explicar, mas lhe tragavam como as ondas do mar.

Sabia muito pouco dele, apenas que passara todos os seus anos de vida no mar - provavelmente filho de pescadores ou de pessoas que trabalhavam nos oceanos - e que era solitário tal qual Naruto, mas gostaria de encontrar alguém para não mais se sentir sozinho naquele imenso mundo azul - e quem diria que teria tantas vontades em comuns com ele?

Na noite antes daquela manhã turbulenta de trabalho incessante, os dois dormiram de mãos dadas, sem se importarem de estarem dividindo uma mesma cama, ainda que houvessem outras. Naruto se sentiu tão bem quanto jamais esteve, pois era incrivelmente agradável estar ao lado dele. Mesmo que ninguém tivesse dito qualquer coisa, os dois aparentaram firmar um acordo silencioso de continuarem assim quando sozinhos e não preciso saber por que. Quando o sol raiou e eles foram despertados pelos raios do sol, perceberam-se quase abraçados na cama.

-Bom dia… - Naruto sussurrou, deslizando seu indicador pela mão pouco macia dele. Era um homem singular, sem sombra de dúvidas, pois mesmo depois de todos os cuidados, ele continuava com o mesmo aspecto castigado. Além de que se recuperara incrivelmente bem dos ferimentos.

-Bom dia. - ele disse, observando os dedos se tocarem daquela forma. Entrelaçaram os dedos novamente de maneira instintiva. Saíram da cama logo, para que não viessem saber o que se passava no quarto e fossem repreendidos. Desta vez não precisaram dividir a refeição porque a história de que Sasuke era um foguista funcionara bem.

O momento de paz durou muito pouco, por assim dizer, pois ainda havia muito carvão para transportar e chamas para combatem. Aparentemente o capitão Edward Smith queria que fossem mais rápido, de modo que as últimas caldeiras, as ditas de reserva, foram acendidas. Naruto já não entendia mais nada, pois pela sua experiência de navegação em outros transatlântico, estava tudo bem como antes, mas ele não era o capitão, não tinha como afirmar nada. Obedecia as ordens sem pensar. Sorte de ter Sasuke por perto para conversarem e assim, Naruto desafogar suas angústias antes que fosse tarde demais.

-Não sei se é uma boa ideia. - comentou enquanto alimentava a nova caldeira, com a ajuda de seu bom amigo silencioso. O outro lhe fitou com confusão, provavelmente não entendeu. - Eu já trabalhei em barcos que naufragaram. Geralmente começa quando o homem força a máquina.

-Abusar da sorte? - Sasuke sugeriu uma expressão recém aprendida durante uma conversa com outros foguista no jantar. Naruto assentiu veementemente e os olhos negros se abriram mais em claro sinal de entendimento. - Provoca azar. - acrescentou e viu o seu amigo concordar.

-Falou pouco, meu amigo, mas você falou com muita sabedoria. E quer saber mais? - jogou uma pá cheia do combustível dentro da caldeira, afastando-se um pouco para o fogo não lhe tocar. - Quando este tipo de coisa - apontou para o navio - dá errado, somos os primeiros a ir ao fundo.

-Ter cuidado. - Sasuke comentou e mais uma vez o loiro concordou com aquelas palavras. Tinha que manter todo o cuidado possível para continuar vivo naquele navio. Queria recomeçar com sua vida.

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