A Espada

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A espada encontrava-se diante de mim, reluzente. Uma luz distinta. Não ofuscava os olhos, mas fulgurava sublime. Ele a segurou firme, usando as duas mãos, mas nem sempre foi assim, robusta. Lembro-me do momento em que foi destruída.

A Guerra do Paraíso havia chegado em seu ápice. Ambos os lados contabilizavam baixas. Estávamos em menor número, mas nosso contingente era pertinaz. Os destacamentos de Miguel foram surpreendidos com o nosso destemor. A Caridade nos foi tolhida, fruto de nossa desobediência em não aceitar a repartição do Amor com seres tão inferiores. O endurecimento de nosso coração fora capitaneado pelo primeiro Querubim, Lúcifer. Indiferente ao gênero humano, recusou-se a curvar-se diante da criatura. Sua insubordinação o fez afastar-se de Elohim e o único meio de prevalecer sua vontade, era destituir o próprio Deus de Sua glória.

Ele comandou o levante; estava à frente de nossas ações. O Portador da Luz nos guiou perante as hostes do Arcanjo Miguel. Em contrapartida, algo singular acontecia; seu brilho outrora reluzente, esvanecia; sua pele, alva, perdia a vivacidade.

O Arcanjo tomou a frente de suas tropas. Estava imponente, conduzindo ele mesmo sua biga, puxado por dois corcéis brancos e radiantes. Seus olhos reluziam fogo e seus cascos brilhavam como latão cintilante. A cada toque de suas unhas, ouvia-se o ribombar de trovões.

Miguel entrajava uma armadura de ouro puro, sua cintura reluzia, fazendo com que tivéssemos dificuldade em manter o olhar sobre ele. Os frutos de nossa rebeldia já se faziam notar, uma vez que a luz feria nossos olhos. O general ostentava a Espada Santa, de resplendor abundante. Ao erguer a lâmina seu exército foi incitado, e brados ecoaram por toda a extensão celeste.

Acreditei realmente que o advento do homem nos condenaria a uma posição subalterna aos olhos de Deus. Minha cegueira não permitiu que a Verdade iluminasse meus sentidos. A língua afiada do Dragão havia ferido meu espírito e conduzido não apenas a mim, mas centenas de milhares de anjos para o mais insondável abismo.

Miguel incorporou seu elmo de combate. O adereço lhe cobria a face, deixando a luminescência de seu olhar a mostra. Sua espada foi consumida pelas chamas, e colocando-a em riste indicou a presença de seu desafeto, Lúcifer. Um grande alarido ecoou, mas o semblante do Querubim não se deixou abalar.

— Não há mais tempo para corrigir o seu erro. Irmãos lutando contra irmãos. Morte e destruição em um lugar santo. Sua ganância pelo arbítrio conhecerá o desenlace agora! — Pronunciou Miguel com autoridade.

Os corcéis bateram os cascos, e os trovões irromperam as nuvens. Lançando-se ao enfrentamento, foi seguido pelas legiões.

Recebemos ordens para investir contra os anjos que seguiam Miguel. Quando as duas frentes se chocaram, os pilares da criação tremeram. Miguel abria caminho, esmagando os incautos com a força de seu carro de guerra. Os metais tilintavam, impelidos pelo sopro do Espírito. A Espada Santa limava os anjos rebeldes rumo ao verdadeiro inimigo, Lúcifer.

Avançávamos em outra frente. Diante de nós achava-se um destacamento celeste. Investimos como uma onda prestes a apoderar-se das areias da praia. Subitamente, arcos foram retesados, disparando sobre nós sua carga. Muitos caíram, mas insuficiente para frear nosso avanço. Moratus estava logo a minha frente, impelido pelo seu ódio, abriu caminho, sulcando as linhas celestes. Não usava uma espada, distinguindo-se dos demais com sua clava. Através de seus aguilhões, conduziu nossa divisão sobre a coluna celeste. Precipitamos sobre os anjos nosso ímpeto, desmantelando sua salvaguarda. Elevando sua clava, o rebelde bradou. Meus olhos contemplaram sua robustez e o alarido contagioso que arrebatou nossas tropas com o sangue de nossos irmãos.

HOLLEN - ANJO CAÍDO (1ª ed -2015 // 2ª ed - 2020) - LIVRO (capítulos iniciais)Onde histórias criam vida. Descubra agora