⛪ Capítulo 1 ⛪

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  " She wore Blue Velvet "

  " But in my heart there'll always be "

  " Precious and warm a memory through the years "

  " And I still can see Blue Velvet through my tears "

Lana del Rey - Blue Velvet
 
 
      * Harry *

  Hoje acordei com um sorriso enorme na minha cara. Hoje irá ser o grande dia, o dia em que finalmente serei Padre.

  Sei que se os meus pais estivessem vivos eles iriam preferir que eu constituísse uma família, tivesse uma casa, dois filhos e um cão e claro uma esposa para o resto dos meus dias, mas isso nunca irá acontecer. Desde aquele dia que eu tomei esta decisão.

  - Tira-me uma foto, amor. - Zoey pede, dando-me a máquina fotográfica e fazendo uma pequena corrida até à ponta do paredão.

  - Tem cuidado! Não andes mais para trás. - aviso, ciente de que ela não sabe nadar e que no Inverno o mar é mais violento.

  Levanto a câmara e aponto para ela. Estava tão concentrado a tentar tirar uma boa foto à primeira tentativa que apenas me lembro de a ouvir gritar, desesperada: - Harry! Ajuda-me! -

  Largo a câmara e procuro-a com o olhar, não a encontrando.

  - Zoey! - grito, enquanto corro até à ponta do paredão.

  Olho para baixo, encarando as águas agitadas, mas infelizmente não há qualquer sinal dela.

   Tiro o meu telemóvel do bolso das calças, pousando-o no chão e sem pensar duas vezes, atiro-me para a água e mergulho, procurando-a até ficar sem ar.

  - Zoey! - berro, sentindo lágrimas quentes contra a minha face gelada.

  Não obtenho qualquer resposta. É como se ela tivesse simplesmente desaparecido.

  Já era de noite. Quanto tempo fiquei à procura dela? A verdade é que não faço a mínima ideia.

  Decido sair da água e telefonar aos meus pais, talvez eles saibam o que fazer.

  Com as mãos a tremer, pego no telemóvel e espero.

  - Filho? - oiço a voz da minha mãe.

  - Mãe! - suspiro de alívio por ela ter atendido. - Ajuda-me! Eu, a-a-a Zoey á-água! - grito pelo telemóvel, não dizendo coisa com coisa.

  - Tem calma Harry. - ela pede. - Conta-me o que se passou.

  Respiro fundo e tento de novo.

  - A Zoey caiu ao mar. E-e ela não s-sabe nadar! - fungo. - E-eu procurei-a mas não a encontrei!

  - Oh Harry! Diz-me que telefonaste à polícia e aos bombeiros. -

  Merda!

- N-n-não. Eu fiquei um bocado desorientado e apenas tentei encontrá-la. - digo, levando as mãos ao cabelo.

  Sinto o vento frio a embater com força contra as minhas roupas molhadas, o que me faz espirrar.

  - Telefona à polícia e aos bombeiros. Eu vou telefonar ao orfanato onde ela vivia e depois vou logo aí ter. Até lá mantém a calma. Tudo irá ficar bem. Os bombeiros irão conseguir encontrá-la. - a voz suave da minha mãe tenta acalmar-me.

  Mas nada ficou bem. A Zoey nunca foi encontrada; quer viva ou morta.

  Sinto tanto a falta dela. Ela era muito simples, talvez por viver num orfanato desde pequena, e apesar de todos os problemas que ela pudesse ter, sempre me apoiou em tudo.
  Ela era tudo para mim e eu deixei-a escapar pelos meus dedos. Eu no fundo, sou o responsável pela sua morte e nunca me perdoei por isso. Eu podia tê-la impedido de ir para a ponta do paredão, sabendo que ela não sabia nadar, mas fui estúpido e não consegui salvá-la.

   Agarro numa toalha branca, assim como tudo o que necessito para tomar banho e faço o meu caminho até à casa de banho.
  Deixo a água quente lavar as memórias daquele dia e também relaxar os músculos tensos das costas.

  Após lavar todo o meu corpo volto para o meu quarto, que partilho com o Louis, e visto a mesma roupa que todos os seminaristas usam; uma camisa branca fechada até ao último botão por baixo de um casaco cinzento claro assim como umas calças de corte direito da mesma cor.

  - Então, Harry. Entusiasmado com o dia de hoje? - pergunta Louis, assim que entra no nosso quarto.

  - Bastante, para ser sincero. E tu? - pergunto.

  Ambos temos esperado por este dia durante anos.

  - Também, mal posso esperar para esta tarde.

  Fazemos as nossas camas e as nossas outras tarefas diárias, enquanto conversamos sobre coisas aleatórias.

  - Hum, Harry... - Louis chama.

  - Sim? - digo, virando-me para o encarar.

  - Para onde vais viver quando acabar a cerimónia? Vais continuar a viver aqui? - ele pergunta e eu sei que ele não me quer lembrar que não posso ir viver para casa dos meus pais por razões óbvias, mas a verdade é que eu já tenho um plano.

  - Bem, na verdade, eu estava a pensar ir viver para o Sant Mary Arizon. - conto.

  - Oh. É um convento misto, não é?

  - Sim. - confirmo.

  Após o almoço e as nossas habituais orações, era finalmente altura de ir para a igreja.

  Confesso que comecei a sentir-me nervoso. E tudo piorou quando o padre começou a dizer o nossos nomes numa missa de celebração.

  Este é o único caminho em que não voltarei a perder ninguém que amo.

  Mãe, pai, Zoey... estarão sempre comigo no meu peito. É este o último pensamento que tenho antes de ir assinar a minha parte do documento e tomar a óstia.

  Louis sorri-me discretamente e eu retribuo-lhe um breve sorriso.

  Volto a sentar-me no banco da igreja e sei que apartir daqui tudo vai mudar.
 

POSSUÍDA || h.sOnde histórias criam vida. Descubra agora