Overdose

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Lucifer's POV

É manhã novamente. Estou com uma dor de cabeça infernal, sem trocadilhos. Não consigo me lembrar nitidamente do que aconteceu noite passada, mas ao ver nove garrafas de whisky vazias em minha frente tenho uma ideia do porquê de tamanha dor de cabeça e falta de memória.

Pelo menos consegui dormir. Acho que se estivesse sóbrio não teria nem cochilado.

Levanto-me da cadeira e, com dificuldade, piso meus pés no chão. Cambaleio, caindo de joelhos. Tento levantar novamente e, infelizmente, sem sucesso. Sinto minha perna formigar por inteira e ao mesmo tempo tenho uma dor nas costas por ter passado a noite de bruços no balcão do bar.

Apoio-me no banco e levanto. Não conseguirei andar sem me segurar em algo. Ando agarrado ao corrimão e aos sofás que estão espalhados.

Com muita dificuldade, consigo chegar ao elevador. Aperto o andar da cobertura. Saio rastejando de dentro dele, não tenho onde me apoiar. De alguma forma, consigo chegar até o sofá e me deitar. Olho as horas no celular. Já passam das dez horas da manhã e já fazem dois dias desde o ocorrido.

Eu ainda não sei o que fazer. Estou muito mal, decido por ficar em casa e tentar me recuperar dessa noite. Meu apartamento ainda está bagunçado por causa da noite de ontem. Vejo garrafas, maços consumidos de cigarro, potes vazios de ecstasy e seringas consumidas por todos os cantos.

Como pode? Como pode uma simples humana e mera mortal me afetar tanto? Como pode, o próprio Senhor do Inferno estar sofrendo? Sofrendo por amor?

Não consigo parar de pensar na Chloe. Direta ou indiretamente. Penso nos casos que resolvemos juntos. Se ainda seremos capazes de fazer coisas como essas depois de tudo que aconteceu.

Digo para mim mesmo que não pensarei mais naquilo. Que focarei em outra coisa, mas não consigo. Não aguento mais cobrir tudo que eu sinto pela Chloe e saber que existe uma grande parcela de chance dela nem me querer mais como parceiro no combate ao crime. Isso dói. Me sinto tão mal por isso. Queria estar abraçado a ela neste momento. Pedindo desculpas por assustá-la. Por não a ter mostrado antes quem realmente sou. Falando o que realmente sinto...

Dou um profundo e longo suspiro. Como não bastasse tudo isso, ainda tem minhas asas. Sangrando. Não parei para cuidar delas. Posso senti-las pulsar mesmo que não estejam para fora. Estou todo quebrado e preciso me consertar logo.

Seria tão mais fácil se eu nunca tivesse a conhecido, mas já não consigo imaginar um mundo sem ela... Sem a pessoa que eu mais amo. Seria uma tortura para mim ter de viver em tais condições. Seria meu verdadeiro inferno. O que está acontecendo comigo?

Só mais uma garrafa... Tento levantar, mas a dor se recusa a me deixar pegar mais um drink. Caio de volta no sofá. Sinto a pulsação de minhas asas mais forte. Preciso arrancá-las fora, não vou aguentar se estiverem assim. Queria poder ter forças, mas não consigo nem levantar a cabeça. Muito menos cortar minhas asas.

Tento não me mexer. Talvez assim ajudo meus ferimentos cicatrizar mais rápido. Se a Detetive estivesse aqui, ela me mandaria para o hospital. Um suspiro me escapa. Ai ai... Por quê? Sempre soube que isso não daria certo. Sempre soube que no final... Eu sempre serei um monstro. Eu sou o Diabo, nada mudará esse fato. Lágrimas e lástimas escorrem de meus olhos como uma grande tempestade. Uma tempestade de confusões. E-eu acho que quero morrer... Então é assim? Esse é o sentimento de estar vazio? Sem ninguém? Pela primeira vez, permito-me sentir a dor sem pudor. Pareço uma criança que perdeu seu brinquedo favorito. Estou a prantos desesperados.

Sinto meu corpo latejar. Preciso da ajuda de alguém. Mas quem? Ninguém pode me ajudar agora. Estou sozinho. E deveria ter continuado assim, mas a Detetive apareceu em minha vida. Ela me mudou. Eu quero gritar. Mas não consigo. Estou fraco. E quem ouvirá? Estou sozinho.

Adormeço em um sono turbulento.

Acordo agitado, com movimentos bruscos. Me contorço. Os machucados ainda não cicatrizaram e a dor continua constante. O sol arde em meu olhos. Inchados e sensíveis, pra combinar com meu psicológico. Não consigo pensar em outra coisa. Pelo menos estou conseguindo me mexer.

Me levanto. Mancando vou para minha prateleira onde guardei a lâmina do inferno. A pego hesitantemente. Tento pôr minhas asas para fora. Não consigo. Não podia ser possível. Ainda as sinto palpitar. Deve ser porque estou fraco. Ou elas simplesmente não estão mais aqui para incomodar. Espero que isso seja verdade. Começo a tremer e sentir calafrios. Caio sentado no piso. Sinto tudo girar. Estou com frio. Meus sintomas começam a piorar. Não pode ser possível. Eu estava me recuperando e do nada começo a piorar? Talvez eu esteja vulnerável e mortal novamente... Mas só é possível quando ela está por perto. Sinto meus olhos falharem e minha visão começar a turvar. Vou desmaiar, eu sei disso. Que sensação horrível. Preciso aguentar. Preciso a-ag... As luzes se apagam. Sinto uma forte dor no peito, que logo se espalha para o resto do meu corpo.

Está frio. Muito frio. Tudo está negro. Um vazio tenebroso e infinito. Ao longe, posso ouvir sons graves e agudos sem sentido. Via um cenário tomando forma, um cenário que conheço bem. Estou no inferno. Está tudo exatamente como tinha deixado. Eu morri? Não é possível. A detetive teria que estar por perto para eu morrer...

Ando sem rumo pelo inferno. Pelo visto voltei a ser o Senhor das Trevas. Passo a mão pelas altas e frias colunas enquanto ando. Surpreendentemente me topo em alguma espécie de barreira. Não consigo ultrapassar. O inferno parece estar sendo sugado por um buraco negro. Estou de volta na emboscada do Pierce. Ah, não... De novo, não. Vejo Chloe novamente. Tão assustada quanto da ultima vez. Meu rosto de Diabo voltou. Isso só pode significar uma coisa... Estou preso numa sala de tortura.

Me sinto culpado pelo que houve com a Detetive. Isso me faz estar aqui.

Lembro-me de cada detalhe do seu rosto, alarmado, apavorado. Meu interior desmorona. Começo a chorar. Eu mereço tudo isso. Eu mereço presenciar esse momento por toda a eternidade. Me entrego ao castigo.


Já presenciei o ocorrido incontáveis vezes. De relance, ouço um som agudo e repetitivo. Está me irritando. Não me lembro desse som estar presente nas outras vezes. Parece cada vez mais perto. Minha visão começa a esmaecer. Num flash de luz, tudo fica escuro.

Minha cabeça doí. Abro os olhos. Não estou no inferno, nem na minha cobertura. Parece um... Um... Hospital! Tá de brincadeira comigo? Tento me levantar mas sinto uma forte dor aguda no estômago e retorno a me deitar.

— Argh! — Arfo, dolorido

— Lucifer? — Ouço uma voz conhecida, mas ainda estou desordenado. Não sei de onde vem.

— Quem... Quem é? — Minha voz sai fanha. Com dificuldade

— Lucifer! Aqui! Sou eu, Chloe...

Não pode ser. Sinto meu coração apertar com força juntamente com um abalo. Não pode estar acontecendo...

— Chloe? — Tento virar minha cabeça mas sou interrompido

— Não se esforce! Você está muito mal. O encontrei tendo uma overdose... O que você fez Lucifer? — Pergunta, preocupada

— Como? Quando? Por que? — Murmuro o mais alto que posso mesmo sabendo que ainda parecia um sussurro

— Fiquei preocupada com você. Então não se esforce tanto. Se recupere... Temos muito o que conversar.

Não digo nada. Apenas viro meu olhar para o teto e ali fico.

Nada é impossível. -Deckerstar-Onde histórias criam vida. Descubra agora