Quinto

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Demorou para os meus olhos focarem, mas quando consegui ver a sala, não havia nada de muito interessante para analisar. Quando tentei levantar os braços percebi que eles estavam presos por uma espécie de algema. A sala era branca do teto ao chão, de frente para mim tinha o que parecia ser um grande espelho, onde eu conseguia ver o meu reflexo. Meu reflexo foi a única coisa que prendeu minha atenção.  Toda a minha "produção masculina" foi desfeita. Comecei a me sentir ridícula, era óbvio que eu não iria enganar ninguém com aquilo. Devem pensar que eu sou uma completa idiota.

Meus cabelos lisos e negros estavam bagunçados e batiam na minha cintura. Minha pele estava brilhosa como se eu estivesse suado muito, o que significa que não faz muito tempo desde a minha patética "tentativa" de fuga.

- Eu já vi muita coisa patética na minha vida. Mas dessa vez vocês se superaram.- a voz vinha por traz de mim.

O som da botina no chão liso me causou um arrepio como se eu já estivesse levando um golpe. Sem a adrenalina o medo já tomava conta de mim. Quando finalmente a vi me deparei com a mesma menina que me jogou no chão. Também havia um outro oficial do seu lado tão alto quanto ela. A menina tinha os cabelos loiros e curtos, e um corpo atlético. Pela sua roupa ela era do alto escalão. Agora que tenho tempo, consigo ler o sobrenome dela no seu uniforme: Martins

- Você realmente achou que iria se vestir de homen, passar pela nossa segurança e entrar sem ninguém notar que você não passa de uma menininha magricela e esfomeada?- ela fala pausadamente como se eu tivesse algum problema cognitivo

- Achei.

O oficial ao seu lado chamado Henrique começou a falar alguma coisa, mas foi interrompido pela voz alta e falsamente compassiva da oficial.

- Você em nenhum momento pensou nas consequências disso? Sabe que terá consequências, certo? É uma pena.

- É uma pena- digo ainda um pouco fora do ar.

Ela me encarou por um segundo e pareceu sentir nojo. Mas depois esboçou um sorriso quase triunfante.

- É uma pena pra você ou é uma pena para os outros?

Outros? Franzi o cenho involuntariamente e ela percebeu meu estranhamento. Nos encaramos por alguns segundos. Eu não podia entregar nada a ela. Com um sinal de cabeça dela o oficial se aproximou de mim. Ele não parecia muito feliz com as ordens que ela dava a ele, mas ele estava muitas hierarquias abaixo dela. Ele se abaixou e fiquei apreensiva, depois colocou a mão no meu ombro.

- Olha você é uma menina jovem, com força para trabalhar de forma honesta para o império. Por que acabar com a sua vida dessa forma? Nós só queremos ajudar.- ele tentava fazer uma cara de compaixão para mim que fez aquilo tudo parecer muito cômico. Não pude evitar cair na gargalhada.

- Você quer me ajudar? Com essa eu ganhei o dia - disse ainda rindo

Encarei os dois que pareciam se segurar para não acabar comigo.

- De verdade tenho pena de você- disse a oficial arrastando uma cadeira para se sentar- Tenho pena também das pessoas que vivem naquelas suas comunidades miseráveis e vão pagar pelos erros de vocês.

Engoli em seco. Mau nos recuperamos do primeiro ataque. A culpa terá sido nossa.

- Sabe o que é uma pena? - digo encarando a oficial- É uma pena você não saber o por que de eu estar aqui.

- Por que você é uma terrorista- ela disse fria

- Ou talvez, eu seja uma bomba

Com essa frase eu virei o jogo. Por um momento vi o medo nos olhos dela. Ela estava em dúvida.

- Você é ?- o oficial diz com uma sobrancelha erguida

- Pode ser que eu seja ou pode ser que esteja aqui por algum outro motivo que vocês nem fazem ideia.

Por um breve momento, houve um silêncio que logo foi interrompido por uma gargalhada quase que de pena.

- Bem já que não sabemos, vamos ter que descobrir.

Aquela pareceu ser a deixa. Do outro lado da sala o homem pegou uma maleta e colocou em cima da mesa. O brilho dos objetos metálicos e afiados fez o meu corpo tremer. Que droga! Que droga! Que droga!

- Tire tudo o que puder dela - disse a oficial - E depois já sabe.

- Foi um prazer falar com a senhorita que pena que nunca mais vamos nos ver

- Será um tremendo prazer no meu caso

Ela olhou pra mim com desdém. Depois se retirou sem mais ordens.

Mordi meus lábios e fechei os olhos de raiva. Queria chorar, mas não agora. Não ali.

Quando olhei pro lado, vi que o oficial estava me encarando. Ele segurava um bisturi numa mão e uma vara de metal na outra.

- Há câmeras aqui. Precisa fingir a partir de agora- disse sussurrando.       - São 22:27 e a senhorita precisa correr.

Fiquei atônita olhando para ele.

- 22:30 a luz vai ser cortado- disse para logo em seguida assumir um tom autoritário.

- Se você quer que seja do pior modo possível. Tudo bem! Vamos fazer desse jeito.

Ele parecia estar preparando alguns instrumento de tortura. Estava ganhando tempo.

Ele deu um soco na minha cara um pouco mais fraco que o normal, mas ainda assim dolorido.

Depois afundou a faca no braço da cadeira onde meu braço estava. Ao mesmo tempo que eu senti a faca de raspão na minha pele tudo escureceu. Por dois segundos só ouvi a nossa respiração ofegante. Mas não durou muito até ouvirmos uma gritaria generalizada acima de nós.









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