Capítulo 11: De volta ao início

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Dia seguinte: cela da prisão.

— Sei que isso foi muito forte para você, mas sabe quem escolheu este caminho, não é? — dizia Mikhail, surgindo por trás das grades, sempre com um olhar preocupado.

— Me deixe em paz... — respondi. — Não quero mais olhar pra sua cara...

— Antony, você cometeu crimes! Precisa pagar por eles, e ao invés disso, acaba matando mais pessoas! O que acha que está fazendo?!

— Não fui eu quem matei minha mãe! Você não entende um terço do que se passa na minha cabeça! — gritei agarrando as grades com força.

— Olhe, rapaz... eu sei o quão difícil está sendo para você, mas não pode achar que vai fugir daqui. Estou com você, garoto! Quero apenas lhe ajudar! Estudando seu cérebro, posso obter algo jamais visto antes em toda a medicina...

— Você não vai me usar como cobaia, Doutor...

— Entendo... — olhou para o chão, desconfiado. — De qualquer maneira... a viatura está nos esperando lá fora, para o enterro de sua mãe. Lembre-se! Não tente nenhuma gracinha.

Havia chegado o dia mais inesperado de minha vida. Enquanto estava em casa, era tanta a falta de atenção em minha mãe, que nunca imaginei o dia de sua morte. O pior de tudo não é saber que ela já não está mais entre nós, mas sim, que eu mesmo a matei. Já havia chorado demais... soluçado, vomitado, desmaiado... tudo de ruim que se pode sentir, pude experimentar naquela cela; quando o peso de matar a própria mãe despencou em minhas costas. Nos corredores, a caminho da viatura, me sentia horrível por ser transportado ao lado de tantos policias armados. Já havia esquecido de quem era, e tudo que fui um dia, se foi. Eu já não era o mesmo Antony; o mesmo filho, o mesmo amigo. Fiquei frio. Desisti de viver e percebi que havia conquistado o que mais queria, há anos atrás: morrer.

Quando menos esperei, a luz do sol irradiou completamente em meus olhos, fazendo-me baixar a cabeça depressa. Eu estava no mesmo lugar por onde entrei. Estar preso dentro de um muro com arames farpados era aterrorizante, mas ver a luz do dia me confortava. No portão principal, onde outrora descia da viatura, estavam mais policias, fortemente armados, garantindo que não haviam chances de fulga. Naquele momento lembrei de Carlo. Imaginei que não pôde ver o sol, como eu. Agoniava-me por não saber onde ela estaria.

— Vamos, entre no carro! — gritou um policial, trazendo-me de volta à realidade.

Me vi sentado sobre bancos de couro, que estavam tão quentes quanto água fervente. As janelas continuavam cobertas por fitas pretas, que não me permitiam enxergar o lado de fora. Estar dentro de uma viatura me dava calafrios. O tempo foi passando, e ao movimento daquele veículo, agoniava-me completamente, ao pensar em tudo o que tinha acabado de acontecer. Minha mãe se foi... isso não descia em minha garganta.

­A viatura começou a desacelerar aos poucos e logo ouvi o barulho do freio de mão sendo puxado, confirmando que havíamos chegado ao local. Com um movimento suave, a porta se abre, e quem estava ao lado de fora, era Mikhail.

— Vai demorar alguns segundos até você se acostumar novamente com a luz — disse ele ao segurar em meu braço.

A luz me cegava. Estávamos fora. O sol estava irradiante, mas logo iria embora, pois era possível ver as nuvens cinzas, carregadas de chuva, se aproximarem.

Após descer do carro com os olhos entreabertos, aos poucos fui me acostumando e logo estava a observar o local. Estávamos em um cemitério. Tudo era cinza e algumas nuvens cobriam o sol, de vez em quando. Tomei um susto daqueles quando olhei para frente e vi o vô Severo, escorado em um túmulo e fumando seu velho cigarro. Ele olhava para mim com um olhar de desgosto e não esbanjava nenhuma emoção. Tudo que fazia era admirar a cova ao lado e dar repetidas tragadas.

Dyspertism: A praga dos sentimentosOnde histórias criam vida. Descubra agora