Capítulo 12: Não resta tempo

37 7 6
                                    

23 dias depois...

Já fazia um bom tempo que estava naquele lugar. Tudo que continuava a fazer sentido em minha existência era registrar qualquer coisa nas malditas folhas do caderno, por algum motivo. Ao vento que soprava devagar e no silêncio que suspeitamente ecoava em meio à escuridão, pensamentos atormentadores invadiam minha cabeça de dia e de noite. Eu certamente não sabia mais como me expressar através de tantas páginas, mas sabia que quando morresse, uma parte de mim ficaria para quem um dia as lesse...

As dores na cabeça, tremores no corpo, pontadas no peito e decisões precipitadas haviam deixado de acontecer há um tempo. Meus sentimentos não apareceram mais, e com isso, senti uma paz confortante dentro de mim. Todos os dias, ao fechar este caderno, tudo que via era a escuridão e o som amedrontador do vazio, que gritava em meus ouvidos: "Você está só." Aquela cela havia se tornado como minha mente: fria, confusa e desabitada. Não sabia ao certo quantos dias faziam que eu estava ali, mas sabia que era o pior lugar que poderia estar no momento.

— Antony! — gritava um policial, me acordando ao bater nas grades —, levante-se! O doutor quer falar com você na sala de exames.

Levantando devagar de minha cama empoeirada e coçando os olhos com ambas as mãos, enquanto bocejava, me aproximei da grade e logo pude ouvi-la se abrir. De algum modo, eu já havia me acostumado com aquela rotina de preso. Coma, durma, fique paranoico, anote tudo em suas miseráveis páginas, e quando chamarmos, venha.

Respirei fundo e segui em frente.

Aquele homem me levou para um corredor diferente, onde nunca havia ido antes. Ele me olhava atentamente e suas mãos estavam trêmulas em cima do bolso de sua calça; preparadas para sacar a arma a qualquer momento. Cada movimento que eu dava fazia com que ele desconfiasse cada vez mais, e quando tentava virar minha cabeça para os lados, com arrogância me ordenava olhar para frente.

— Você chegou! — exclamou Mikhail de longe, parado em frente à uma sala.

— Protocolo 0165 cumprido, senhor — disse o policial que me transportou, dando meio volta e indo embora.

Mikhail respondeu com um olhar frio.

O Doutor me acompanhou estranhamente para dentro daquela sala — Que era iluminada somente por uma única lâmpada amarelada —, com um olhar confiante e um leve sorriso no rosto. Ele estava feliz, e após fechar a porta, parou em minha frente, dizendo:

— Eu estive estudando muito, rapaz... estudando você, para ser sincero.

— O que descobriu? Que vou morrer? — rebati sarcasticamente, com um sorriso falso no canto da boca.

— Observando por inteiro, o estado normal de um cérebro humano, comecei a compará-los com o seu, analisado na última vez em que lhe examinei. Surpreendentemente descobri coisas fantásticas e nunca vistas em toda a história da vida na terra! — O enorme bigode se destacava em sua boca, com os constantes sorrisos que dava. — Você é ouro, rapaz!

— Já disse que não serei sua cobaia... — afirmei, sentando-me em uma cadeira.

— Você não tem escolhas por aqui, Antony. Isto será feito ou sua pena aumentará.

Vendo que não haveria alternativas, estirei meu braço e logo senti aquela leve picada de agulha, que sinceramente, já havia até esquecido como era. Ele estava retirando sangue, que jamais olharia, pois, a cor vermelha me trazia memórias atormentadoras.

— O que é o protocolo 0165? — perguntei, lembrando-me do que outrora o policial disse.

— Coisas da delegacia; como não olhar para o lado ao caminhar nos corredores, evitando sempre decorar caminhos — disse ele, concentrado na veia.

Dyspertism: A praga dos sentimentosOnde histórias criam vida. Descubra agora