Solar... Pelo nome logo se pensa em uma cidade praiana, com sol e verão constantes, com música alegre e festas. Porém por ironia do destino Solar é uma cidade fria, com bastante neve, árvores altas e espinhosas, uma cidade com poucas pessoas e consequentemente com poucos sonhos. Tenho uma teoria de que quem nasce aqui não sente muita vontade de prosperar, de viver, de sair de todo o frio e solidão que essa cidade traz! As pessoas que aqui moram não costumam ter grandes sonhos, são frustradas, depressivas e comigo não era diferente. Cresci numa casa gelada, não só as paredes, mas minha família sempre fora muito distante e ausente, o que pode ter me afetado na infância, mas que agora não me incomodava mais. De qualquer forma, meus pais me chamavam de pessimista, diziam que eu via a cidade de uma forma escura e decepcionante, mas que tudo isso não passava de invenções da minha cabeça, eu tinha que tentar ver as coisas de outro ângulo e focar em me tornar alguém, mas como poderia ser alguém se estava presa em Solar, e como poderia visar um futuro se não queria estar vivendo o presente? É difícil explicar para as pessoas, como dizia meu escritor favorito "As pessoas grandes precisam sempre de explicações" e eu diagnosticada com depressão desde os 12 estava cansada de explicar por 7 anos e de tentar fazer com que as pessoas pudessem ver o mundo com minhas lentes, com minhas sujas e trincadas lentes.
O dia amanheceu e com ele os raios de sol tímidos por entre as densas nuvens tentavam desesperadamente invadir meu quarto. Acordei-me e silenciei o despertador baixinho que tocava embaixo de meu travesseiro, odiava o barulho do despertador e tinha um sono leve, então ao menor toque eu acordava. Levantei-me e me troquei, hoje não era um bom dia então não iria me arrumar, nem tampouco tomar banho, ou me vestir dignamente. Precisava lidar com minha doença e na maioria das vezes na verdade ela que lidava comigo. Amarrei meu cabelo castanho num coque, vesti um moletom, coloquei um cachecol pelo pescoço e desci as escadas até a cozinha. Minha casa era sempre silenciosa, meus pais comiam a mesa como lady e lorde, usavam talheres desnecessários e vez ou outra trocavam algumas palavras sobre as notícias que liam em seus celulares.
- Céus Aisha!! que roupa é essa? Pensei que estivesse lidando bem esse semestre! Não escovou os cabelos também, você tem cachos tão bonitos...
Ignorei totalmente o comentário de minha mãe e peguei uma torrada na mesa, enquanto a comia peguei meu capacete e me dirigi para a garagem.
- Está muito frio lá fora, você não quer uma carona? Meu pai disse do outro cômodo.
- Estamos em Solar Sr. Torres, aqui sempre faz frio - Repliquei-lhe colocando o capacete e abrindo a porta da garagem com minha bicicleta.
O frio me acolhia, por mais estranho que fosse se morasse em um lugar ensolarado provavelmente me mudaria nas primeiras horas, o sol parecia me cuspir como um alimento que não lhe caiu bem. E o frio era mais acolhedor e parecia entender-me, o frio também tinha lá suas doenças como uma garota de 19 anos sem perspectiva, seriamos grandes amigos um dia.
Cheguei em 20 minutos ao restaurante que trabalhava. Abri a porta, guardei minha bicicleta e me adiantei para começar a arrumar o lugar, o restaurante era pequeno e aconchegante, vivia sempre cheio por vender comidas quentes, as pessoas buscavam sempre alguma forma de se aquecer. Meus pais entendiam que eu precisava trabalhar, não aprovavam, mas entendiam que não poderia passar todo o dia em casa, então trabalhava meio período, no período oposto eu deveria estar cursando a faculdade, mas ainda não tive culhões de fazer minha matrícula, então os dias passavam e eu fingia que não percebia.
Atendia as mesas, me forçava a sorrir, queria fazer as coisas bem-feitas, mas o monstro sobre os meus ombros raramente me permitia. O dono do lugar conhecia meus pais, e logo me conhecia também, via meus dias de esforço e os dias que eu pouco me esforçava, mas me mantinha no emprego, por algum motivo, que no fundo eu sabia ter dedo dos meus pais.
O dia passou lentamente, segundo por segundo, milésimo por milésimo e eu segui como o planejado, até o último cliente sair, e atrás dele eu fechar a porta com a placa de fechado.
- Bem Aisha, terminamos por aqui, precisa de carona?
- Não, vou de bicicleta mesmo, gosto do frio - Digo vestindo meu moletom e me virando para seu Jan, forcei um sorriso.
- Sei que gosta, de qualquer forma, caso precise de algo - Não se preocupe - o interrompi - Ficarei bem!
Pedalavacontra o vento frio, meu nariz gelado apontava que aquele final de tardeparecia mais frio do que os outros, a neve começou a cair pesadamente, minhavisão era limitada, realmente não esperava por uma nevasca tão repentina,minhas mãos firmes no guidão e meus olhos semicerrados tentavam enxergar algono meio de toda a branquidão. Vi um pequeno feixe de luz, ao longe parecia-meum vaga-lume, continuei, estava em uma curva inclinada, logo mais estaria emcasa. A luz que parecia um pequeno inseto agora já não parecia tão pequenaassim, pude vê-la de muito perto, creio que perto demais. Escutei uma buzinaalta, senti uma forte pancada e minha visão transformou-se num breu total.
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The doctor
RomanceNathan, esse era o nome que ele havia me dito, mas depois de tentas mentiras e tantas descobertas era difícil acreditar em mais alguma coisa. Um novo doutor, uma nova consulta, era para ter sido apenas mais uma tentativa de enfrentar sua doença, ma...