WILLIAM

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I just called to tell you that I miss you my old friend
Burning the midnight oil again

Eu estava no carro do meu pai, no banco de trás.
O country preferido dele tocando ao fundo. Se Joice estivesse junto, teria pedido para abaixar o som.
- Pai, aumenta o som!
Minha voz parecia com a de quando eu tinha quatorze anos. Estava arrumando meu cabelo quando percebi que estava loira de novo. Olhei para minhas roupas: a mesma que eu estava usando no meu aniversário, quando papai morreu, mas a tatuagem estava no meu braço.
Olhando ao redor, vi a foto de família que costumava ficar pendurada na sala de casa. A foto original mostrava eu, meu pai e minha mãe, mas essa estava... Eu, minha mãe e o... Davi???
- Isso tá muito fodido. - Falei baixo o suficiente para não ser ouvida.
Jogada no banco, ao meu lado, estava a garrafa que Raquel quebrou. Minha caneta de pichação estava no lugar da tampa. Peguei, olhei por longos segundos para o banco à minha frente e escrevi:
ACORDAR
Assim que tampei a caneta e a guardei no bolso, passamos em frente a uma árvore histórica de Arcádia. Em baixo da árvore estava Rack, olhando para cima, de braços cruzados e fumando um cigarro, com uma clara expressão de confusão e tristeza.
Demos mais uma volta.
- Sabe, Cléo... Às vezes, as pessoas mais rudes são as que mais precisam de ajuda. Talvez a sua amiga...
- Ela não é minha amiga.
- Cléo, eu não acabei. - Típico de papai. - Talvez a sua amiga precise de você. Mesmo que ela não admita.
Ao terminar de falar, papai parou o carro em frente à árvore e Raquel veio em nossa direção, vagarosamente, com uma expressão séria e quase assustadora. Sua blusa xadrez azul estava jogada na grama e ela usava uma blusa igual, porém vermelha, e seu AllStar, agora, era laranja.
- Rack... - Sussurrei, tentando abrir o vidro para falar com ela, sem sucesso. Notando minha dificuldade, a maravilhosa garota colocou uma das mãos no vidro.
Quando coloquei minha mão na dela, somente o vidro do carro separando nossas peles, vi uma lágrima solitária escorrer do rosto da garota e parar perto do queixo.
- O quê... - A lágrima, depois de alguns segundos, tornou-se fogo, e então Raquel Amber estava em chamas, ainda imóvel. - RACK! - Gritei o mais alto possível, tentando desesperadamente abrir a porta da maldita caminhonete, quando ouvi uma buzina.
- Filha, querida, o caminhão chegou. - Papai disse, calmo e feliz, logo antes de sermos destroçados.

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