Capítulo 2

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O avião finalmente pousou na cidade do Cairo depois de cinco horas de viagem. Mas meu trajeto  não terminava ali, eu ainda teria que pegar condução pra Gizé que ficava a vinte quilômetros do Cairo. Busquei por informações no aeroporto e um carro do exercito já me esperava para me levar para as instalações médicas no alojamento militar. Não levou mais que trinta minutos até que chegássemos lá e eu pudesse me instalar, descobri que seria a chefe da equipe e contaria com a ajuda de mais 7 médicos e 6 enfermeiros. A sensação de nostalgia era enorme, 19 anos depois e eu estava ali novamente, no lugar onde toda minha carreira havia começado. Olhei ao redor por uns minutos, contemplando minhas lembranças, mas eu já tinha trabalho a fazer, alguns leitos estavam ocupados com feridos e eu precisava revisar prontuários e checar como estavam. Tomei um banho rápido, me troquei e coloquei meu jaleco, o trabalho me esperava e eu estava ansiosa para salvar vidas. 

Gizé era um lugar lindo e no meu período de folga a noite fui até as pirâmides, o alojamento era perto e dava para ir a pé mesmo. Encontrei um grupo de pessoas do exercito egípcio, estavam comemorando algo e parabenizavam alguém que já estava de saída, era o capitão da equipe, pelo menos era o que dizia o seu casaco, mas não pude vê-lo, ele estava de capuz e indo embora. 

Me sentei paralela ao grupo e fiquei observando o céu, sem a iluminação da cidade ele ficava forrado de estrelas. Enquanto admirava me lembrei de Genji e do quanto a gente ficava horas no terraço olhando as estrelas, levei instintivamente a mão no bolso pra pegar o celular e ligar pra ele, mas eu tinha deixado o celular no alojamento, que cabeça de vento. De qualquer forma eu ligaria pra ele quando voltasse, então aproveitei mais um pouco da vista e fui embora, no caminho parei pra comer e chegando nos meus aposentos fui direto pro banho. Corri pra cama e peguei o celular, fiz uma chamada de vídeo de uma hora com Genji e depois precisei ir dormir, na noite seguinte eu estaria de plantão, então precisava descansar bem.

Minha primeira semana lá foi tranquila, se é que pode se dizer assim, tivemos poucos feridos e os que apareciam era coisas mais leves, tirando um que perdeu uma perna e quase morreu na cirurgia, mas no geral estava tudo calmo. Eu estava tendo uma quantidade razoável de horas vagas e passava uma boa parte delas conversando com Genji, eu já estava morrendo de saudades dele e queria muito ter ele por perto. Estávamos em uma chamada de vídeo quando escutei um estrondo muito alto, provavelmente não muito longe de onde eu estava, eu sabia que era um ataque próximo e que por mais que não fosse minha noite de plantão eles precisariam de mim lá. Desliguei com Genji, mudei minha roupa e fui o mais rápido que pude para o centro médico, chegando lá pedi informações e fui informada que um grupo do exercito  egípcio  tinha sido atacado quando voltava de uma missão, alguns ficaram feridos e tivemos uma perda, a situação não foi mais grave pois estavam todos com roupas de combate. Os feridos estavam sendo encaminhados para nós naquele momento. 

Eu estava de prontidão na porta quando o primeiro ferido chegou, notei um certo desespero em que aquele ferido fosse atendido com emergência, então me apressei para atendê-lo e entendi o porque, era o capitão, ele estava desacordado e com várias escoriações pelo corpo.

- Coloquem aqui - eu disse apontando pra um leito específico - deixem comigo agora, vai ficar tudo bem.

Pra começar os procedimentos precisava tirar seu capacete e quando o fiz fiquei vislumbrada quando vi os cabelos negros caindo sobre o lençol, na verdade o capitão não era um capitão, era uma capitã. Procurei pela roupa seu identificador e pude ver o bordado na altura do bolso "Capitã Amari" e isso me fez voltar 19 anos no tempo, na minha primeira missão,  onde conheci Ana Amari, a Capitã mais lendária do exercito egípcio. Mas isso não interessava agora, afastei todas as minhas lembranças e comecei o atendimento. Durante o processo ela acordou confusa e sem se lembrar de muita coisa.

- Ei, o que aconteceu? Por que estou aqui? - ela se sentou rápido, querendo explicações, mas a dor de cabeça forte impediu que ela continuasse - Ai, minha cabeça! O que diabos está acontecendo? - e ela se deitou de novo sem condições de se manter sentada.

- Oi, eu sou a Dr. Ângela, você sofreu um ataque, está no alojamento médico sob meus cuidados - disse tentando acalma-la e deixa-la menos confusa - você se ralou um pouco, vamos dar um jeito nisso.

- Você poderia dar um jeito nessa dor de cabeça, antes que eu fique louca aqui? - o tom de irritação na sua voz era muito perceptível, mas eu entendia, se sentir vulnerável na posição que ela se encontrava não era a melhor das sensações.

- Acabei de te medicar, o remédio já vai fazer efeito e a dor não vai mais ser um problema - informei.

- Então eu já posso ir? - ela disse tentando se levantar.

- Infelizmente não - disse enquanto apoiava ela no leito novamente - preciso terminar meus exames em você e descartar uma concussão cerebral, mas pra isso preciso que me ajude.

Meio relutante ela cedeu e deixou com que eu fizesse todos os exames enquanto ela me encarava, eu fiquei um pouco sem jeito, mas nada que eu nunca tivesse passado na minha carreira de médica.

- Sinto em lhe dizer que você teve uma concussão leve e vai precisar passar a noite aqui - eu disse já esperando a chuva de irritação que viria.

- Sério isso? Meu pelotão precisa de mim! - ela jogou a cabeça pra trás com cara de desaprovação.

- E eu preciso te monitorar pra saber se você não terá uma hemorragia e morrer, morta você não é útil para o seu pelotão! Mas não se preocupe, amanhã cedo você já vai estar liberada - dei um sorriso pra ela.

Ela virou para o canto e resmungou algo, o remédio devia estar fazendo efeito e logo logo ela ia ficar sonolenta e cair no sono. E foi exatamente assim, em pouco menos de dez minutos ela estava dormindo, aproveitei e fui ajudar com os outros pacientes. Mesmo não sendo minha noite de plantão eu fiquei pra ajudar a monitorar, todos precisavam de vigilância, e então comecei a ir de leito em leito observar o estado de cada paciente. Cheguei ao leito da capitã e ela parecia dormir calmamente, conferi o pulso e estava tudo certo, me virei pra sair e senti alguém pegando minha mão.

- Ei, desculpa ter sido rude com você mais cedo, eu estava muito confusa e com dor, não tinha muito controle do que dizia - ela disse enquanto puxava minha mão pra que eu me aproximasse - eu só queria dizer obrigada! - ela parecia completamente diferente da capitã de mais cedo.

- Tudo bem, pacientes com concussões, mesmo as mais leves, tendem a agir de forma não usual. Não se preocupe - dei duas batidinhas em cima de sua mão e dei um sorriso enquanto me soltava, ela me retribuiu o sorriso e voltou a dormir enquanto eu me afastava.

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