Destino ou Coincidência?

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Ten só se deu conta de que era noite ao sair pelos corredores e observar estrelas piscando pelas janelas. Ele se sentia entorpecido, exatamente o oposto do que sentiu ao caminhar rapidamente por aqueles mesmos corredores em direção a uma sala que, ele sabia, o aguardava com uma tela sobre um cavalete. A agitação que acelerou o fluxo de seu sangue, no fim das contas, não gerou resultados tão satisfatórios.

Quando ele olhou para o que havia criado, sentiu que havia algo faltando. Uma figura sobre um palco, iluminada e cercada de pássaros de papel. Eles estavam ali porque era como se as palavras que Taeyong dizia fossem pássaros voando ao seu redor e eram, no entanto, apenas o fruto do que ele havia posto em um papel.

Ten teve medo de que alguém reparasse na semelhança da personagem de sua pintura com uma pessoa real, mas era um medo distante. Em sua cabeça ele tentava desvendar em que momento havia esquecido de acrescentar o toque que enfim daria um caráter único à sua obra.

Ele escutou alguém chamar seu nome, e enfim desistiu de pensar na sua pintura, caminhando até a pessoa. Era seu amigo de Fotografia.

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Taeyong olhava para aquele último verso que havia escrito com uma expressão mal humorada. Ele não sabia o que fazer a seguir, estava empacado naquela estrofe já há algum tempo, então decidiu fechar seu caderno e guardar suas coisas. Ele não tinha o costume de ficar até o anoitecer no campus, exceto quando as provas e seminários começavam. Estranhou os postes iluminados em que nunca reparava de dia e caminhou contra o vento já um pouco frio pelo pátio.

Havia várias pessoas ali ainda, conversando, estudando, fumando...

Por reflexo, Taeyong buscou em sua mochila os cigarros que não estavam mais lá. Tinha prometido para Johnny parar de fumar e ganhado um pacote de balas de menta para se distrair quando sentisse que precisava de um cigarro. Às vezes era difícil.

Deprimido, ele jogou duas balas em sua boca e seguiu seu caminho até ouvir a voz de Johnny.

Seu amigo estava entre outras três pessoas, duas delas também americanas. Johnny tinha um instinto protetor em relação a outras pessoas que não se sentiam de todo pertencentes ao país em que viviam mas, quando se mudavam para a nação de suas famílias, permaneciam com aquele sentimento. Completavam o círculo ao redor dele: Wendy, sua caloura, Mark, um garoto inquieto que fazia Biologia e...

- Taeyong! - Johnny se aproximou ao reparar nele - Agora você não vai fugir. Vamos andar por aí.

- Andar por aí? - ele se viu perguntando, inconscientemente usando um tom de voz indiferente.

- É, deixar a noite nos levar! - disse Wendy, animada.

Aquelas pessoas realmente não tinham muito o que fazer da vida, mas por que ele se viu seguindo-os? Reparou em quem caminhava ao seu lado. Ten. Ele sorriu para Taeyong, que desviou os olhos para os seus pés e cruzou os braços.

- Está com frio? Posso te emprestar minha jaqueta.

- Estou bem - ele olhou para a jaqueta de Ten, com algumas manchas de tinta nas mangas. Também havia tinta debaixo de suas unhas. Taeyong se perguntou o que Ten andou pintando.

De repente, ele sentiu algo roçar suas costas, e ele usava a jaqueta por sobre os ombros. Tinha um cheiro bom. Algo como canela e baunilha.

- Você obviamente está com frio. - Ten disse.

- Mas você... - Taeyong então reparou que ele usava uma camisa preta de manga comprida.

- Posso parecer exagerado. No meu país não faz frio como aqui. Mas pode ficar com a jaqueta, você está usando uma camiseta sem manga.

Johnny olhava para eles com um sorriso, provavelmente pensando que Taeyong estava se abrindo para uma nova amizade.

Ele estava?

As ruas eram muito movimentadas àquela hora. Os estudantes de Fotografia decidiram parar ali mesmo, na calçada, para tirar fotos daquele cenário.

- Não podemos tirar fotos com alta profundidade de campo, está escuro e o diafragma tem que estar bem aberto. Se você aumentar seu ISO um pouco mais , a foto vai ficar com ruído - Johnny explicava para Wendy, que era sua caloura e mal tinha aprendido a segurar a câmera apropriadamente, então estava um pouco confusa sobre as configurações.

- Eu realmente não entendo o que ele está falando - Ten soprou para Taeyong.

- Ele me ensinou há um tempo atrás. Não é tão complicado.

Ele se virou para Ten, que agora prestava atenção às instruções do fotógrafo. Sua pele cor de mel fazia um ótimo contraste contra as luzes dos faróis dos carros, e seus lábios sorriam de leve. Taeyong quis ele mesmo tirar uma foto naquele momento.

Seus olhos se encontraram e todas as outras coisas pareceram perder o foco, até que Johnny quebrou aquele momento.

- Gente, eu vou chamar um táxi para a Wendy, ela precisa estar em casa cedo.

Quando o táxi chegou, Mark se afastou do grupo para atender uma ligação e Wendy se despediu de todos. Enquanto o carro virava a esquina, Mark encerrou a ligação com uma cara não muito boa.

- Eu preciso resolver o problema de um amigo meu.

- Quem é? Podemos ajudar? - Johnny perguntou.

- Vocês não o conhecem, ele é mais novo. Na verdade... Você podia me ajudar, sim, hyung. Se não for um incômodo.

- Não é.

Então eles se despediram e se afastaram. Tae e Ten ainda olhavam em sua direção quando eles desapareceram entre o fluxo de pessoas. Coincidentemente, os dois haviam ficado sozinhos.

- É, - Taeyong comentou mais para si - acho que também vou nessa.

- Vamos juntos então - Ten surpreendeu-o - Onde você mora?

- No dormitório do campus.

- Hm, eu também.

Taeyong se viu em uma situação surreal enquanto caminhava de volta para o dormitório com sua paixão platônica, usando sua jaqueta e conversando com ele. Ele nunca esteve interessado nisso, preferia só observar Ten à distância. Aliás, só havia se lembrado de seu nome após o sarau, quando ouviu alguém o chamando, pois já havia se esquecido de boa parte do que foi dito quando Johnny apresentou os dois.

Chegando no dormitório, ele ainda descobriu que eles moravam no mesmo andar, mas nunca se encontraram ali antes, já que seus horários não batiam. Por fim perceberam que um vivia no quarto 69 e o outro no 96. Mais coincidências.

Devolvida a jaqueta, cada um foi para o seu quarto e ambos voltaram a pensar nos projetos que faziam inspirados um no outro.

Termos específicos mencionados:

Alta profundidade de campo: técnica que privilegia amplo cenário, obtida através da abertura mínima do diafragma. (Não é recomendável de noite, pois quanto menos luz entra pela abertura, maior deve ser o ISO).

Diafragma: controla a abertura da lente de uma câmera, regulando a quantidade de luz que entra por ela.

ISO: define a quantidade de luz necessária que entrará na câmera afim de conseguir uma boa exposição da imagem fotografada. (Se estiver muito alto, a foto sai com "ruído", ou seja, granulações na imagem).

Did You Know? - TaeTen -Onde histórias criam vida. Descubra agora