2. Sussurro

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  — Olá, vocês são os novos vizinhos? — A figura se mostra. Um homem branco alto, quase da altura de meu pai, com cabelo bagunçado, camisa florida por cima de uma branca, bermuda bege e sandália aparece. Nas suas mãos, uma bandeja com biscoitos caseiros com gotas de chocolate.

  — Bem, sim. Somos os novos moradores daqui. — Meu pai estende as mãos para pegar a bandeja, mesmo que esteja encarando o cara com uma seriedade e densidade ameaçadora. — E você é?

— Ted, o vizinho da casa ao lado. O meu filho disse que vocês haviam chegado aqui. Sejam bem-vindos. — Ele coloca a bandeja nas mãos do meu pai e abre um sorriso grande e estranho. Meu pai pega a bandeja e continua o fuzilando com os olhos.

— O que você tava fazendo olhando pela janela? — Digo, me aproximando. Ted solta um "oh..." e fica em silêncio.

— Responde. — Diz meu pai, engrossando a voz e estufando o peito.

— Ah, eu só queria ver se realmente havia alguém ou se meu filho se enganou. Hahaha! — Riu estranhamente.

  Meu pai o encara por alguns segundos de silêncio, então segura a bandeja com apenas uma mão e estende a outra, sorrindo calorosamente. Os dois se cumprimentam e se abraçam como se fossem amigos antigos, apesar de se conhecerem agora. A desculpa dele não me entra na cabeça totalmente, mas na cabeça do meu pai sim.

— Desculpa o momento de tensão, Ted, é que qualquer um que mexer com minha filha pra mim é um homem morto. — Ele diz rindo.

— Tudo bem, também sou assim com a minha. Haha.

— Tem filhas?

— Uma filha mais velha... — Ele pensa por um tempo. — Uma do meio e um filho mais novo. O mais novo é o que viu vocês. — Completa. — Crianças são estranhas mas são tudo para a gente, sabe?

— Sim, esse é o sentimento! — Meu pai ri e assente com a cabeça. — Aparece alguma hora aqui em casa com seus filhos, eles podem acabar se tornando amigos dos nossos. Vocês são bem-vindos a qualquer hora na nossa casa!

  Droga, uma abertura para alguém que a gente não conhece e não sabe a intenção. Abrir as portas pra alguém que estava parado na nossa janela é estranho, mas é a comportamento do típico amigável e receptivo Joel, meu pai. Eles ficam conversando por mais alguns minutos, enquanto eu fico deitada mexendo no celular. Demora um tempo, mas finalmente aquele cara estranho vai embora.

— Pai? Ele ficou me olhando pela janela e você abre a casa pra ele? — Reclamo, me sentando no sofá.

— O que? Ele já disse que apenas estava vendo se seu filho falou a verdade.

— Você acreditou nisso mesmo? Você é bobo, hein.

— Você que é desconfiada demais, Lara. O que um branco de camisa florida e que usa sandálias poderia fazer? Relaxa. — Riu, comendo um dos biscoitos.

— Você é muito bobo... Além de abrir a casa pra ele ainda abriu pra uma família toda que a gente não conhece.

— Ué? O que poderia acontecer? Eles tentarem nos matar com macacões vermelhos e tesouras? Isso não é Nós, e nem tem como, você olha pra mim e me vê igual a ele? — Ele pergunta num tom sarcástico. Admito, é impossível não rir com as palhaçadas que meu pai diz.

— Sim, pô, vocês dois são altos e chatos. — Rio.

— Mas ele é branco e usa sandália. Eu nunca seria branco e nem usaria sandália. — Ele responde dando de ombros e indo para a cozinha. — Se mais um cafona amedrontador aparecer na janela, me chama.

O Medo Mora ao LadoOnde histórias criam vida. Descubra agora