As lembranças da mongólia.

93 0 0
                                    

Capítulo 9.

Lembranças da magnólia

Elizabeth Aniston

O pequeno prédio chegava a ser engraçado. Dois andares, janelas enormes, tinta já gasta, paredes descascando. 

Através das janelas do carro, minha visão se enchia de empolgação e meu peito palpitava de expectativa. Olhei para Clóvis, impassível e arrogante no banco da frente, e jurei que minha animação seria capaz de me fazer abraçá-lo. Cogitei, por alguns momentos, beijar-lhe a cabeça, até que o homem, de sua típica forma vaidosa e pouco amigável, virou seus olhinhos escuros para mim. 

- Estou atrasado para levar seu tio ao médico, senhorita Aniston . Quanto tempo a mais a senhorita pretende ficar olhando para a minha careca?

Torci o nariz, falsamente ofendida com a insolência do mordomo. Toda e qualquer demonstração de gratidão, que eu imaginava enquanto estava vidrada em seu crânio, foi instantaneamente apagada e substituída por imagens violentas nas quais eu lhe esbofeteava os olhos zombeteiros. Contudo, eu fui capaz de me conter.

Abri a porta do carro, ainda ultrajada com a pergunta de Clóvis, disse-lhe um breve e baixo: “obrigada” e esperei até que o carro preto já estivesse longe para voltar a olhar, com o rosto banhado em curiosidade, para a placa pendida acima do portão de entrada do prédio. 

Caminhei até a porta do Bilontra da maneira mais segura e estável que consegui.

As portas automáticas se abriram, revelando uma recepção branca, simples e sem muitos ornamentos decorativos. Existia uma enorme mesa no centro, na qual um senhor idoso, com um crachá indicando que era o recepcionista, me sorriu de orelha à orelha. 

- Pois não, senhorita? – Ele perguntou. 

Aproximei-me, abraçada com a pasta de couro que continha todos os documentos que eu precisava, e retribuí o sorriso, tentando esconder meu nervosismo aparente. 

- O senhor Boris Beltrão se encontra?

- A senhorita tem hora marcada? 

Eu não tinha marcado um horário com Boris Beltrão. Primeiro porque parte do meu plano envolvia pegá-lo de surpresa, despreparado para recusar a minha oferta. E segundo porque eu pensei que não fosse precisar. A Gazeta Bilontra recebia tão poucas visitas – descobri após acessar alguns computadores da empresa – que julguei completamente desnecessário telefonar para avisar sobre a minha vinda. 

Dei um breve sorriso.

- Desculpe, eu não marquei horário. – Meu tom sorrateiro e contemplativo fez com que o recepcionista levantasse as sobrancelhas. – Mas tenho a impressão que o senhor Beltrão não se incomodaria com a minha visita. 

O homem de terno cinza, sentado em um dos sofás brancos a minha esquerda, soltou o livro que lia e começou a me analisar com cautela, como se eu fosse uma fera perigosa que pudesse atacar o idoso a qualquer momento. 

Desviei meu olhar do sujeito e voltei a encarar o recepcionista. 

- Madame, sinto muito, mas tenho ordens explícitas para só permitir a entrada de quem tem horário marcado. 

- Talvez se o senhor ligar para ele, ele mude de ideia. – Sorri confiante, mas o atendente permanecia impassível.

- Eu não tenho autorização. 

- Eu posso esperá-lo. 

O velhinho de olhos cândidos soltou um gemido de pesar. O tronco do sujeito de terno cinza se projetou ainda mais para frente, como se, a qualquer momento, ele fosse se levantar para me convidar a sair do local. 

Alvura Púrpura, por lan.Onde histórias criam vida. Descubra agora